Artigo de Opinião
VIRGENS OFENDIDAS
A Europa voltou a acordar em sobressalto. Mais um atentado terrorista, desta vez em Bruxelas. Deixemos de lado a hipocrisia da nossa sociedade, que se embriaga de notícias de Bruxelas e reduz a insignificantes os atentados, bem recentes também, na Turquia e na Costa do Marfim, e centremo-nos no que é essencial.
Antes de mais, importa dizer que a Europa que conhecemos morreu. Morreu sem qualquer culpado. Os ofendidos de hoje são os mesmos que lançaram a desordem no Médio Oriente. Começou no Iraque, da forma que todos nós sabemos e “acabou” agora na Síria. Como nasceu o autodenominado Estado Islâmico? Por financiamento de países europeus e dos EUA. Estranho, não é? Feitiço contra feiticeiro?
A guerra na Síria levou à vaga de refugiados que chegam em catadupa à Europa. Ouço por ai tantas vezes as pessoas questionarem-se do porquê de os países à volta não os acolherem, e a maioria nem sabe que o maior campo de refugiados sírio fica mesmo na Jordânia, em Zaatari. E quem olha para aquele campo, para além de profundos arrepios, quando visto ao longe, irá confundi-lo com uma cidade.
Os refugiados não são os culpados dos atentados. Os atentados têm sido todos promovidos por europeus. Pessoas nascidas e criadas na Europa. Os refugiados fogem exatamente desta barbárie que tem dilacerado a Europa. Chega de confundirmos refugiados com terroristas. Nós temos a responsabilidade de mostrar que somos diferentes dos fundamentalistas. Caso contrário, estaremos a alimentar ideologias extremistas, que têm crescido como cogumelos pela Europa fora, e aí, tornar-nos-emos terroristas de nós próprios e da nossa liberdade!
Chega de confundir Islão com terrorismo. Se Deus pudesse falar, com certeza seria o primeiro a insurgir-se contra estes atos de barbárie. Nenhum deles é feito em nome de uma religião. São feitos em nome do terrorismo. O Islão é intolerante? Então alguém consegue-me explicar como é que estátuas milenares, ligadas ao cristianismo, sobreviveram em cidades de maioria muçulmana, até à aparição do Estado Islâmico.
O problema está na Europa. E é aqui que a Europa tem que agir. Devemos repudiar a xenofobia e racismo que grassam entre as populações, mas não pode ser isso impedimento de tomar medidas. Os líderes europeus devem ter a coragem de compreender o problema e tomar medidas em consonância. Se isso significar pôr o Acordo de Schengen por momentos na gaveta, que seja. Se não somos capaz de controlar o fundamentalismo com as portas abertas, devemos fazê-lo com as portas fechadas. O que não pode continuar a acontecer na Europa é ser mais complicado entrar numa discoteca de havaianas do que num aeroporto com bombas.
Também o Médio Oriente e a instabilidade criada pelos europeus e americanos devem constituir-se como uma prioridade. O recurso às armas deve ser o último recurso.
Por último, seria bom que a nossa comunicação social se limitasse a informar convenientemente. Os órgãos não podem servir como catalisadores do ódio racial, religioso e do medo. O massacre televisivo a que temos assistido nos últimos dias desinforma mais do que informa, amedronta mais do que arranja soluções. Esta é a altura de arranjar soluções para um problema concreto que temos dentro de portas e não disseminar o ódio sobre inocentes e crenças que fogem exatamente daquilo que, no fundo, nos amedronta a todos. Que a educação e a verdadeira informação sejam a nossa principal arma de combate.