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Sociedade

ZYGMUNT BAUMAN (1925-2017): O LEGADO DA SOCIEDADE LÍQUIDA

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Zygmunt Bauman, “o pai da sociedade líquida”, foi um sociólogo polonês. Faleceu no passado dia 9 de janeiro, não sendo ainda conhecidas as causas da morte. Para a sociologia deixa, entre muitas, a mais importante das suas teorias: o estudo da sociedade atual como uma “sociedade líquida”.

Biografia

Zygmunt Bauman nasceu a 19 de Novembro de 1925, em Poznán. Pertencente a uma família de judeus, mudou-se para a URSS aquando da invasão e anexação da Polónia pelas formas alemãs e soviéticas, em 1939. Serviu na Segunda Guerra Mundial, em campos de refugiados polacos, onde acabou por conhecer a sua futura mulher. Nos anos 40 e 50 alistou-se no Partido Comunista polaco, de onde acabou por sair devido à falência das forças socialistas no leste europeu.

Licenciou-se em Sociologia na URSS e tornou-se professor universitário em Varsóvia, de onde foi posteriormente afastado por ter vários livros e artigos censurados. Foi perseguido várias vezes por forças antissemitas e acabou por emigrar para o Reino Unido, tendo sido professor universitário em Leeds.

É considerado um dos sociólogos mais importantes do nosso século e do século anterior, devido aos seus enormes contributos para o estudo da sociologia. Em vida, recebeu prémios como o prémio Amalfi (1989) e o prémio Adorno (1998).

Contributos para a Sociologia: O Holocausto

Uma das teorias mais chocantes de Bauman relaciona-se com a II Guerra Mundial.

Quando pensamos no holocausto, associamo-lo, normalmente, a ações levadas a cabo por agentes irracionais e inconscientes. É exatamente o contrário que Bauman defende: o holocausto foi um verdadeiro produto da racionalidade e da modernidade, com a burocracia ao seu serviço. Desta forma, o holocausto é apresentado por Bauman como um príncipio da industrialização, aplicado a seres humanos (a matéria prima) e não a bens, cujo produto final era a morte. As câmaras de gás são um símbolo da industrialização e os “engenheiros” (sociais) eram especializados no objetivo final: o extermínio dos judeus. Assim, os nazis conciliavam procedimentos racionais da indústria com uma burocracia racional, cujo objetivo era destruir pessoas.

Posto isto, o Holocausto, defende Bauman, não foi um ato inconsciente de loucura humana pois isso não seria eficaz para atingir um extermínio total. Dentro da burocracia moderna não há, para o sociólogo, espaço para a moral. Assim, o Holocausto foi uma linha de produção com um produto final previsível e com características que evidenciam a modernidade e a racionalidade: planeado, especializado, cientificamente pensado e gerido eficientemente e coordenadamente.

Contributos para a Sociologia: A Sociedade Líquida

Uma das teorias mais importantes e difundidas de Bauman foi a explicação da sociedade contemporânea e das relações que nesta se estabelecem. Para o sociólogo, houve uma transição de uma modernidade sólida para uma modernidade leve e líquida, consequência da falta de tempo para solidificar relações.

Há um abandono de empenho e de compromissos e a ideia de lealdade tem menos valor do que tinha antes. Deixa de existir ou adquire menos importância, nos dias de hoje, a ideia de arrependimento. Os indivíduos atuam e planeiam ações em termos calculistas e sob condições de incerteza, com menos emoções ou afeto. A vida é orientada para o consumo e, nesta nova organização social, os indivíduos são simultaneamente produtos e mercadorias, pois todos vivem no mesmo espaço social designado de mercado.

Não obstante, os indivíduos têm dificuldade em fixar-se no espaço e no tempo, sendo a vida pautada por uma enorme mobilidade, associada à leveza. Desta forma, não criam raízes, sendo a sociedade caracterizada por uma elite nómada e extra-territorial.

Bauman surge com o conceito de instituições zombies. Instituições, como a família, que são, nos dias de hoje, facilmente desintegradas e não seguem os parâmetros de antigamente.

Os indivíduos têm dificuldades em assumir compromissos, orientando-se não pela necessidade mas pelo desejo, que é sempre volátil e efémero, o que leva a uma sociedade edonista – o mais importante é desejar e querer sempre mais e não satisfazer as necessidades. Assim, a infelicidade dos consumidores deriva do excesso e não da falta de oferta.

Entre as obras mais prestigiadas de Bauman estão “Modernidade e o Holocausto” (1989), “Amor Líquido: Sobre a Fragilidade dos Laços Humanos” (2003), “Tempos Líquidos” (2006), “A ética é possível num mundo de consumidores?” (2011) e a última obra que lançou, “A riqueza de poucos beneficia todos nós?”, em 2015.

Numa entrevista recente ao El País, que data de 9 de Janeiro de 2016, Bauman foi questionada sobre as desigualdades contemporâneas e a crise da democracia moderna. “Para atuar, é necessário poder: ser capaz de fazer coisas; e política: a habilidade de decidir quais as coisas que têm de ser feitas. A questão é que esse casamento entre poder e política nas mãos do Estado-Nação acabou.”, afirmou. “A crise contemporânea de democracia é um crise das instituições democráticas.” Quando questionado sobre as redes sociais, afirmou que estas são uma armadilha pois “fazem com que os indivíduos se sintam um pouco melhor, pois a solidão é a grande ameaça nestes tempos individualistas.” Acrescentou, ainda, que “(as habilidades sociais necessárias) são desenvolvidas na rua, no trabalho ou ao encontrar gente com quem se precisa de ter uma interação razoável. (As redes sociais) não ensinam a dialogar pois é muito fácil evitar a controvérsia. Muita gente usa-as não para se unir nem para ampliar os seus horizontes mas, pelo contrário, para se fechar no que eu chamo de zonas de conforto.”

Falecido a 9 de Janeiro de 2017, Zygmunt Bauman deixa um legado para a sociologia do estudo da sociedade contemporânea e dos desafios modernos com que os indivíduos lidam.