Política
DETROIT: O EPISÓDIO QUE VALE A PENA RELEMBRAR
Detroit não é hoje o que era há 60 anos. A antiga capital mundial do automóvel (a sua imagem de marca é a General Motors) é atualmente um símbolo de declínio, contrariando os anos prósperos em que esta se afigurava como uma das cidades mais ricas dos EUA e que catapultou para a fama artistas como Michael Jackson, Stevie Wonder e Madonna.
Um dos marcos mais importantes na história de Detroit, foi, sem dúvida, o “Riot” de 1967: as tensões raciais que surgiram após o movimento de emancipação dos negros culminaram num dos episódios mais tenebrosos da história da cidade, que opôs civis e polícias. Os números não mentem: 43 mortos (33 africoamericanos e 10 brancos, sendo que mais de metade dos afroamericanos foram assassinados por polícias), 1.189 feridos e 7.231 detidos, entre os quais vários jovens.
Os cinco dias de medo e pânico que Detroit viveu resultaram em consequências profundamente negativas para a cidade, quer a nível político, social e económico. Cerca de 2.509 lojas foram saqueadas ou queimadas, 388 famílias tornaram-se desalojadas e uma quantidade significativa de edifícios não pôde ser reabilitada dadas as condições altamente degradantes em que se encontravam.
Um caso peculiar é o da famosa loja de discos “Joe’s Record Shop”, um dos muitos espaços comerciais impossíveis de reabilitar. Segundo o proprietário, Jon Van Battle, ao retornar à loja dias depois dos tumultos encontrou somente “…detritos húmidos e fétidos do que havia sido uma das primeiras lojas de discos de Detroit.”
Paralelamente, grande parte da comunidade branca deslocou-se para os subúrbios, sendo que os negros permaneceram nas cidades. O fenómeno intitula-se “white flight” e está presente em todas as cidades norte-americanas, contribuindo de uma forma ainda mais expressiva para a separação entre brancos e negros.
Assim sendo, a pergunta que se coloca é a seguinte: será que no século XXI os EUA mantêm o mesmo nível de tensões raciais de há 50 anos atrás? Não parece haver uma resposta totalmente linear a esta questão, uma vez que ainda são visíveis demonstrações de racismo e de tensão entre brancos e negros. A eleição de Barack Obama como primeiro presidente norte-ameriano negro em 2009 ,por exemplo, pode ser considerada um marco na História dos EUA no que concerne ao racismo e à emancipação da comunidade negra, mas as opiniões são díspares.
De acordo com um estudo realizado em 2013 (ainda durante a presidência de Obama) pelo World Values Survey sobre quais os países mais racistas do mundo, os EUA registaram uma percentagem entre 0%- 4,9%, sendo suplantados por países como a Índia, França, Bangladesh e Hong Kong.
No entanto, a recente eleição de Donald Trump como presidente dos EUA veio levantar algumas questões. Trump, ainda que não oficialmente, recebeu o apoio do Ku Klux Klan aquando da sua candidatura, sendo que o seu eleitorado apresenta apoiantes do “white supremacism”. Numa América ainda muito marcada pela segregação racial, Detroit permanece um símbolo desse período e de como as tensões entre brancos e negros nos EUA são um tema transversal a vários épocas da sua História.