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Ciência e Saúde

LEGALIZAÇÃO DA CANÁBIS PARA FINS TERAPÊUTICOS CONTINUA EM DISCUSSÃO

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O assunto não é novidade, mas conquistou mais atenção após a apresentação dos projetos de lei do BE e do PAN, para legalização da prescrição e uso terapêutico da planta Cannabis sativa.

Usada como droga ilícita nas formas de marijuana ou haxixe, a canábis contém uma grande variedade de compostos – os canabinóides –  responsáveis pelos seus efeitos biológicos, entre eles o canabidiol e o tetra-hidrocanabinol, sendo este último o responsável pelas propriedades psicoativas.

É bem conhecido o valor das plantas como fonte de fármacos naturais ou obtidos por modificação química dessas moléculas, ou até a utilização dos seus extratos em medicamentos. No que diz respeito à canábis, ou cânhamo indiano, esta foi amplamente estudada em milhares de artigos científicos publicados, sendo ainda hoje realizados estudos sobre potenciais aplicações terapêuticas.

Noutros países, a utilização da canábis com fins medicinais já foi aprovada, para aplicações no controlo de sintomas em casos de glaucoma, dor crónica, SIDA e espasmos em doentes com esclerose múltipla. Pode referir-se a legalização nos países República Checa e França em 2013, Croácia em 2015 e Alemanha em 2017.

Em Portugal, foi em 2012 que o Infarmed, autoridade nacional reguladora do medicamento, aprovou a introdução no mercado do primeiro medicamento com extrato de Cannabis sativa, indicado para controlo de espasmos em doentes com esclerose múltipla. O PVP do frasco nebulizador contendo o equivalente a 30mL de solução para pulverização bucal, da classe terapêutica analgésicos e antipiréticos, é de cerca de 500 euros e de momento não é comercializado no país.

Este medicamento também já foi alvo de um estudo publicado em maio de 2017 na revista científica European Neuropsychopharmacology, a qual reportou benefícios em casos de hiperatividade e défice de atenção em adultos, no entanto acompanhados de efeitos secundários severos ou moderados.

As opiniões dos especialistas quanto à legalização da canábis para fins terapêuticos são divergentes. Jorge Espirito Santo, médico oncologista, concorda com a aprovação. “Eu gostaria muito de ter acesso a alguns destes compostos para usar como terapêutica no dia-a-dia. Não faz sentido que não haja acesso a estes compostos que estão acessíveis noutros países e quando há evidência científica que pode ser benéfico no tratamento de sintomas como a falta de apetite, controlo da dor, em doenças oncológicas”, contou ao Público.

Outro dos argumentos utilizados a favor da legalização lembra que, já em 2014, foi autorizada pelo Infarmed a primeira plantação de canábis para fins medicinais em Portugal, apesar de a sua utilização no país não ser permitida. As plantações de canábis são da responsabilidade de empresas sediadas noutros países e destinam-se à exportação da planta, com vista a produção de medicamentos no Reino Unido.

Por outro lado, é importante frisar a diferença entre a atividade da planta e respetivos compostos no nosso organismo e a sua aplicação terapêutica, já que a última depende de fatores como as doses tóxicas e a incidência de efeitos adversos, como a dependência. Félix Carvalho, Professor na Faculdade de Farmácia da Universidade do Porto, manifestou-se contra a proposta, declarando ao Expresso que “a canábis não é inofensiva, cria dependência e, se for fumada, pode ser cancerígena”.

Neste sentido, ainda que estejam descritas as atividades anti-emética, antiglaucomatosa, espasmolítica, analgésica, estimulante do apetite, entre outras, cabe às entidades competentes decidir sobre a viabilidade da prescrição da planta.

“Assim, embora, do ponto de vista estritamente científico, não existam evidências que suportem a sua recomendação, existem evidências que suportam a permissão, ainda que controlada, do uso da cannabis para fins terapêuticos. A questão fundamental é, pois, saber se a riqueza farmacológica da planta Cannabis sativa justifica um programa excecional que permita o seu uso para fins terapêuticos.” – opinião de Bruno M. Fonseca, farmacêutico e investigador na Faculdade de Farmácia da Universidade do Porto, no Público.