Artigo de Opinião
GREGOS À MODA DA ALEMANHA
A “ressaca eleitoral” do passado dia 25 de Maio, em Atenas, demonstrou que o partido de esquerda radical grego Syriza, ganhou as eleições europeias no seu país, com os seguintes resultados: 26,7% dos votos, contra 22,8% atribuídos à Nova Democracia, que lidera a coligação no Governo.
Em Berlim a vitória dos partidários da renegociação da dívida grega, deverá ter causado um calafrio no executivo alemão. A situação grega está a tornar-se insustentável com a forte possibilidade de um novo resgate (o terceiro).
A dose de austeridade aplicada ao povo grego apresenta valores que deixam o Estado Helénico à beira de um estado de emergência, isto é: o défice (diferença entre receitas e despesas do Estado central) atingiu os 23,1 mil milhões de euros no ano passado. O montante representa 12,7% do PIB, logo o défice está muito acima dos objetivos definidos com a troika e estipulado no orçamento do ano passado (5,2%). A dívida pública helénica também manteve a trajetória ascendente em 2013 atingindo os 175,1% do produto interno bruto, um aumento em relação aos 157,2% do ano passado.
A “solidariedade europeia” ditada pela Alemanha poderá traduzir-se numa necessidade de um novo resgate financeiro implicando que o governo conservador de Antonis Samaras tenha que aplicar um reforço na dose de austeridade ao povo grego, que tenderá num agravamento da situação socioeconómica da Grécia, que apresenta uma taxa de desemprego superior a 25% da sua população ativa, em que mais 50 % de jovens entre 16 e 24 se encontram sem emprego. Os indicadores económicos, parecem demonstrar uma situação desesperante.
Perante estes factos convém ter em atenção que a corrente situação poderá despoletar um sentimento crescente de anti-europa, com a afirmação de partidos de índole nacionalista, como é o caso da Aurora Dourada (partido de extrema-direita), tendo sido este o terceiro partido mais votado, nas eleições europeias (9,3%), tornando num perigo e uma vulnerabilidade politica que a Europa está a menosprezar, com o resurgimento de um certo neofascimo, suportado pela elevação dos valores nacionais como alternativa, sendo a Europa responsável por todos os males existentes.
Na capital alemã, os alarmes despertaram com medo de contágio da situação grega nas economias da Europa do Sul (Portugal, Chipre, Itália, Espanha), que poderão ficar altamente afetadas.
O discurso assente na premissa da existência de uma linha imaginária que separa os países do Norte da Europa dos do Sul, deverá dar lugar a um compromisso conjunto entre todos os estados-membros da União Europeia.
Urge a necessidade de uma estratégia politica e económica para a Grécia, que exige a solidariedade de todos os povos europeus, à semelhança do que foi feito com a Alemanha no pós-segunda guerra mundial no sentido da sua integração europeia.
David Guimarães
05/06/2014 at 01:05
Caro Tiago,
Artigo com conteúdo e informações detalhadas e preciosas.
A Alemanha não vai ter a mesma postura que os aliados tiveram para com o seu país no final da segunda Guerra Mundial. A herança protestante de Angela Merkel está patente no discurso de culpabilização, rotulando de pecaminosas as acções dos países do Sul que precipitaram a crise. Este discurso maniqueísta,antagonizando os países do Norte (santos), com os Estados do Sul (pecadores), impede essa postura de solidariedade. Mais do que a ascensão do neofascismo, é premente contrariar a falta de soberania nacional dos países do Sul da Europa. Nas últimas eleições legislativas gregas, quando as sondagens davam vantagem ao Syriza, Angela “Mutti” Merkel ameaçou o povo helénico que se os esquerdistas ganhassem não haveria segundo resgate por parte da Troika.
Penso que chamar país à Grécia, nestas circunstâncias, é um eufemismo para camuflar a sua condição “negra” de protectorado. Perante esta arrogância alemã, julgo que seu “volk” não sente qualquer culpabilização colectiva pelas atrocidades que os seus “avós” cometeram. Espero que não seja o único a achar isto alarmante!
Um abraço
Jorge Araújo
05/06/2014 at 02:30
A ideia de União Europeia é uma falácia. As grandes potências mundiais de hoje e do futuro serão países de dimensões enormes. A Europa, com países pequenos/médios (frutos da história), nunca poderia competir com isso, nem ganhar voz entre os gigantes. Por isso nasceu a U.E., que tenderá para o federalismo, em jeito de grande país, constituido por pequenos países.
Agora pergunto: será que pelo mero desenvolvimento económico serei obrigado a deixar de ter um país independente a que chamo Portugal? Somos obrigado a aculturar-nos, como já estamos, apenas para termos expressão?
Sou completamente contra as guerras e contra racismos. Mas desejo o fim da U.E. Se houver paz e respeito no coração dos Homens, é possível vivermos em conjunto, sem que o fim da U.E. traga de novo a guerra à Europa. Apenas porque o desenvolvimento económico não é tudo na vida.
Viva Portugal, Viva o Rei!
António Pais
08/06/2014 at 16:10
Amigo Tiago!
O teu diagnóstico sobre a situação Grega está muito bem feito, e é alarmante que os líderes Europeus não o consigam ver, apostados em apenas ver com uma lupa omissa, os pecadilhos Gregos. O ídolo da Europa serviu sempre como amuleto para exorcizar os demónios da história europeia, Carlos V, Napoleão e Hitler.. Contudo foi sempre um ídolo com pés de Barro, réplica do outrora império Romano e fantoche da Cristandade, um ídolo sem crentes. Se outrora os monarcas não creram, hoje é o cepticismo dos líderes Europeus, reféns dos seus eleitorados, que não o permite. Não existe o estadismo preciso, para recuperar a memória do desastre Europeu no século XX ou XVII, nem o espírito de sacríficio necessário para transcender os egocentrismos naturais dos povos.
O facto é que as nações do canto oeste asiático suicidaram-se, só o ídolo da Europa as pode ressuscitar. E caro Jorge Araújo, não é uma questão económica, é sobretudo uma questão identitária, porque as identidades nascem no seio de uma comunidade, e no caso dos países europeus, foi sempre a Europa, figura não geográfica, mas cultural.
Para finalizar, apenas uma breve observação. O que adianta à “gorda” Alemanha no seu claustro, reclamar contra os furtos da “magrela” Atenas? A justiça de Deus é maior do que a que Lutero viu, da mesma forma que são os Alemães mais do que aquilo que nós rotulámos. São os sacerdotes da deusa Europa que jaz morta e urge por sangue penitente Luterano. Vítima e sacerdocisa ao mesmo tempo, tal como Cristo para fundar o seu reino aqui na terra. Apenas Cristo tinha duas naturezas, a Humana e a Divina, da mesma forma os Alemãs vão necessitar ter o “reist” Europeu junto com o Alemão, para poderem subir até o altar onde as nações europeias se saciarão. E o glorioso reino de 1000 anos de paz venha finalmente.
Cumprimentos!
Jorge Araújo
09/06/2014 at 00:40
Amigo António Pais.
Essa ideia identitária da Europa é mais uma falácia. Todos nós falamos línguas diferentes, por alguma razão. Sou pela diversidade cultural e não pela aculturação numa única cultura europeia. Os tempos do Império Romano deveriam ter terminado há muito, mas parece que hoje queremos voltar a isso.
Leia o livro de Vasco Graça Moura, “A Identidade Cultural Europeia”, onde este refere, precisamente, que a U.E. nasceu a partir de interesses económicos, estando a cultura completamente arredada da questão e das preocupações dos fundadores.
Cumprimentos.
António Pais
10/06/2014 at 02:24
Caro Jorge Araújo,
Muito obrigado pela sua resposta e fico feliz por termos opiniões diferentes, o que só enriquece o tema e a problemática em questão. Começo por repetir sem rodeios o que acima quis afirmar, que a Europa enquanto figura identitária existe historicamente e não geograficamente, isto porque só faz sentido falar da Europa a partir das geografias que são atravessadas por movimentos culturais comuns, colocando-se o império de Carlos Magno como referência inicial neste aspecto. Onde o movimento Gótico alcançou no século XIII, aí também alcançou a Europa, onde os palácios de Versalhes chegaram no século XVIII, aí também chegou a Europa, onde havia estados/nação no século XIX, era a Europa. O irónico é que esta comunidade de estados/nação que partilha referências identitárias comuns, forjou entre muitas realizações o próprio direito internacional, não evitou o descarrilamento e por fim o suicidio na forma de guerras fraticidas no século XX. Não foi inédito na história humana, semelhante caso aconteceu com as cidades/estado gregas no século V A. C.. Ora o que aconteceu no século seguinte (IV A. C.) é que foram engolidas pelos macedónicos e a Grécia só recuperou independencia no século XIX D.C. A rivalidade de Atenas e Esparta tornou incapaz qualquer união política, apesar de algumas tentativas, e os dois luzeiros da cultura helénica passaram à história.
Julgo assim pois prioritário conseguir materializar numa estrutura política, a herança comum europeia, único remédio face à emergência de dois totens da nossa história, outra vez o nacionalismo derivado da crise social dos países do sul europeu e o imperialismo nascente em forças externas à Europa, ambos colocam o risco das nacionalidades europeias passarem à história, tal como as cidade estado gregas no passado.
Mais, é erroneo no meu entender, coagitar a Europa como uma figura imperialista, caricatura do império Romano, quando é historicamente uma figura erigida pelas nações, como vacina se tratasse, contra as tentações imperialistas que nasciam nos seios das monarquias e nações europeias, como explica Lucien Fevre no seu livro «A Europa. Génese de uma Civilização». Hoje em dia é sobretudo o garante da nossa liberdade, ou já nos esquecemos que a Europa de Leste foi dominada pelo império Soviético durante 45 anos no século XX, nem podemos ser obtusos ao pretender assegurar soberanias, quando a Europa foi salva com o plano Marshall e ainda hoje depende das forças de segurança dos EUA no seu território. O que vale mais? A liberdade política no seio Europeu, ou nenhuma liberdade? Com isto, as nações europeias correm o risco de tornarem-se ridiculas e meras figuras arqueológicas, porque como acima já escrevi, a própria consciência de identidade nasce pelo diferença e não pelo isolamento, e é a diferença em comunidade que sempre enriqueceu a Europa. Coloca-se então o problema da germanização ou aculturação da União Europeia por parte de um país, acontecimento causado pelo défice político nas estruturas na União Europeia e não o contrário, o factor económico torna-se então preponderante e claramente favorece esse fenómeno. Urge actores políticos que galvanizem o eleitorado para soluções políticas que legitimem políticas Europeias e não nacionais. É exequível? deixo aqui a pergunta.
Finalmente não discordo que a União Europeia seja uma construção económica. Esse é o pressuposto necessário para uma união política, que garanta a nossa liberdade. Contudo é uma falácia, pensar que a união económica e a livre circulação de bens é o suficiente para evitar que o fantasma da guerra volte, foi essa falácia que apanhou os estados de supresa no despontar da 1º Guerra Mundial.
Cumprimentos!