Artigo de Opinião
LIVREMENTE ARREPENDO-ME
Desde a sua eleição para o parlamento, Joacine Katar Moreira (JKM), a deputada eleita pelo Livre, tem protagonizado momentos infelizes e preocupantes para a democracia portuguesa. Não me irei debruçar sobre a questão da gaguez da deputada – até porque considero que isso é um assunto que diz respeito somente ao partido em si, uma vez que é o partido que fica prejudicado com a reduzida eficácia com que os ideais do Livre são transmitidos – nem sobre a questão do uso da saia por parte do assessor da deputada na Assembleia da República, dado que se trata de um não-assunto.
Embora quisesse falar sobre os comentários infelizes e ridículos da JKM relativamente ao facto de achar que tinha sido eleita sem a ajuda do partido – que causaram, sem grande espanto, um conflito interno -, irei falar sobre os assuntos que têm um conteúdo político ainda mais sério e mais problemático que este último.
Um dos momentos que causou tensão dentro do partido foi a decisão do voto de JKM sobre a iniciativa do PCP de condenação a Israel, por causa da agressão israelita a Gaza. Tanto o Livre como a deputada eram a favor da condenação, mas, de forma inexplicável e absurda, JKM decidiu abster-se, porque proferiu que houve um problema de contacto com o grupo de contacto durante três dias (grupo esse constituído por 15 pessoas, incluindo a deputada). Para além de uma desculpa obviamente implausível, JKM demonstrou, claramente, falta de caracter, uma vez que votou contra as suas convicções.
O outro momento infantil foi sobre a proposta do Livre relativa à mudança de alguns critérios da lei da nacionalidade. Trata-se de uma matéria extremamente importante na definição ideológica do partido. Todavia, puerilmente, a proposta não foi entregue dentro do prazo. O Livre justificou que não teve essa informação do prazo, porque não participa na conferência de líderes. No entanto, a Mesa da AR veio refutar esse argumento, porquanto era possível ter conhecimento.
Porém, quando o nível de bizarria se pensava que não podia ser ultrapassado, eis que o caso da escolta policial à saída da AR apresenta um novo patamar de insensatez bastante perigosa para a democracia. Só porque não quis responder aos jornalistas, a deputada JKM decidiu solicitar proteção da polícia. Isto é um insulto à democracia e à profissão de jornalista que preza pela manutenção desse regime político.
Estes momentos insanos vindos de JKM desencadearam demissões na direção do partido, tendo Rui Tavares dito que o Livre necessitava de voltar a discutir as questões que realmente interessam. E, de facto, necessita urgentemente. Um partido cuja objetivo era criar pontes entre o centro-esquerda e uma esquerda mais radical, tornou-se ainda mais radical que o BE. Um partido cuja ideologia era o europeísmo e a esquerda verde. No dia das eleições, votei com essa consciência. Onde estão esses assuntos a serem debatidos? Esse partido deixou de existir. Tendo em conta os inúmeros momentos lamentáveis, hoje, arrependo-me de ter votado no Livre.
Miguel Barbosa