Política
“O MAS não faz das eleições o seu principal eixo político”
O Movimento Alternativa Socialista (MAS) vai concorrer, pela primeira vez, a todos os círculos eleitorais numas eleições legislativas portuguesas. O partido pretende dar voz aos trabalhadores e aos setores mais oprimidos e vulneráveis da sociedade e apresentar um programa diferente dos apresentados pelos outros partidos. O cabeça de lista pelo círculo eleitoral do Porto teceu algumas críticas aos partidos de esquerda que não têm cumprido o seu papel e à direita, que tem apresentado políticas que não contribuem para o desenvolvimento económico e social da sociedade.
O JUP esteve à conversa com Pedro Castro, cabeça de lista do MAS pelo círculo eleitoral do Porto, para perceber quais as bandeiras defendidas, bem como aos objetivos defendidos pelo partido nestas eleições.
O que é que distingue o MAS dos demais partidos?
Essa é uma pergunta essencial! Em primeiro lugar, dizer que o MAS não só é diferente dos partidos que toda a gente conhece e que estão hoje no Parlamento, mas também diferente dos partidos que não estão no Parlamento. Na verdade, porque somos o único partido que propõe uma solução estratégica. Ou seja, nós, em primeiro lugar, não achamos que sejam as eleições a resolver os problemas estruturais das populações, acreditamos essencialmente na mobilização dos setores oprimidos e explorados da sociedade. Ou seja, não achamos que este sistema de desigualdade, miséria e injustiça seja o fim da história. Nós lutamos pela transformação qualitativa da sociedade. Depois, somos o único partido, também, que diz claramente que um Governo do Partido Socialista não nos serve, nem um Governo da direita. E, também, uma terceira grande diferença que é o MAS não faz das eleições o seu principal eixo político, que também há diferença qualitativa face aos demais partidos que concorrem a eleições, que centram toda a sua atividade na questão das eleições, porque é isso que vai permitir ganhar dinheiro, permitir chegar aos círculos do poder, fazer os grandes negócios, vai possibilitar “tachos”, ou seja, nós temos uma perspetiva completamente diferente, daí as listas do MAS estarem compostas por muitos/as ativistas das mais diversas áreas, desde o Movimento Feminista, ao Movimento Climático , ao Movimento Anti-Fascista, ao Movimento Sindical, temos também vários dirigentes sindicais, como é o caso do Vasco Silva, que encabeça a lista do MAS por Braga, Nuno Geraldes, dirigente do STCP. Ou seja, estamos a falar de gente que intervém na sociedade, não espera pelas eleições para que algo mude. Parece-me que essas são diferenças qualitativas e depois ainda podíamos acrescentar uma outra: o MAS foi o único partido obrigado a recolher duas vezes assinaturas para poder concorrer a eleições. O único. Se pensarmos hoje no que é que foi a legalização do CHEGA em que recorreu a assinaturas ilegais, nem sequer teve a necessidade de chegar ao valor que é supostamente necessário para os partidos constituírem como ferramentas legais. Por um lado, temos uma justiça que é absolutamente amiga da extrema-direita e, por outro, é implacável e faz tudo o que tiver ao seu alcance para impedir vozes indisruptíveis, dissonantes daquilo que é o status quo e daquilo que é a política que tem dominado, seja por governos socialistas, seja por Governos PSD. O fundamental do MAS é essa luta permanente por uma sociedade diferente.
Poderia descrever esse novo sistema que o MAS deseja incutir?
É um sistema com que nós não podemos concordar de forma alguma. depois tivemos o Governo do PS e é importante fazermos uma análise ao que foi este governo. Em primeiro lugar, perceber que não foi um governo igual aos outros, como sabemos. Ou seja, permaneceu de pé, continuou em funções, porque teve o apoios do Bloco de Esquerda e do Partido Comunista Português. Encontrou-se uma solução nova. No caso do PCP, já não apoiava um governo desde os tempos dos governos provisórios, logo a seguir ao 25 de Abril e o BE foi a primeira vez que deu o seu apoio a um governo. depois de se construir durante muitos anos na rua, nas lutas, permanente mente a apresentar uma alternativa à direita e às politicas de direita aplicada pelo PS. O que é que acontece? Isto gerou uma grande expectativa numa parte da classe trabalhadora e dos setores mais oprimidos e explorados da sociedade, que de facto se poderia mudar a página, inverter a situação do país. Relembremos o que é que foram os anos terríveis da direita, do PSD, do CDS, da Troika, de destruição absoluta, de privatizações, de cortes salarias, de uma revisão profunda do código laboral. Ou seja, as pessoas estavam fartas da direita e a verdade é que acreditaram que era possível uma mudança. mas temos de ser críticos a esquerda, temos de olhar, ver como está o país e perceber se resolvemos ou não as questões estruturais do país. e nós continuamos, neste país, sem uma política ativa para resolver a questão de grande transição energética, por exemplo. Essa é uma questão determinante, é fundamental a descarbonização total da economia porque temos muito pouco tempo para evitar a catástrofe climática. Então o que é que o Partido Socialista fez? Investiu na ferrovia? Não investiu na ferrovia suficientemente. Aeroporto do montijo? Como sabemos, uma obra megalómana que daqui a uns anos vai estar submersa, depois temos o lítio que é uma questão que esteve completamente arredada da discussão política que é inacreditável, como é que nos temos um megaprojeto de exploração, de refinação de lítio, este país, que vai abranger cerca de 20 % dos concelhos do país. Não estamos a ter esta discussão e não aproveitamos as eleições para discutir seriamente a situação do lítio. Ou seja, o lítio é aqui vendido como uma alternativa aos combustíveis fosseis, mas verdade ele é absolutamente danoso para o meio ambiente, também ele vai contaminar a agua, os solos, poluir o ar, trazer consequências terríveis para as populações locais, alterar de forma absolutamente radical a vida destas pessoas que vivem nestas zonas é um projeto que não envolve só a extração, mas também a refinação do produto. Quem tem interesse nisto? são as grandes empresas, que estão nos a dar uma falsa alternativa que é um capitalismo-governo, que não vai resolver o problema, principalmente, quando sabemos que há alternativas já hoje às baterias de lítio.
Como é que o MAS classifica a gestão da pandemia pelo governo de António Costa?
Obviamente, parece-me que o Governo acabou por não ter uma posição muito clara, não ter um plano estratégico definido e, depois, no terreno, as dificuldades foram imensas, produto daquilo que tem sido a descapitalização do Serviço Nacional de Saúde. A direita levou a cabo uma política de desinvestimento público, política essa que o governo do PS prometeu alterar. Mas a verdade é que não o fez. Basta ouvir as reclamações dos setores profissionais dessa área: faltam enfermeiros, médicos, auxiliares, ou seja, falta tudo, inclusive, em alguns sítios, faltam as infraestruturas, hospitais para a população. A pandemia deixou a nu todas as fragilidades do nosso SNS. Temos, hoje, de pensar também que o SNS não está assim por acaso, porque se o dinheiro continua a ir para salvar bancos, grandes empresas, depois não há para aquilo que é determinante e essencial, no caso da educação e da saúde. Como é possível, hoje, existirem mais hospitais privados do que públicos? E o perigo que isto representa. Se isto continuar nesta dinâmica, dentro de pouco tempo estaremos privados de ter acesso ao SNS. Os grupos privados da saúde, metade do seu financiamento vem de dinheiros públicos, ou seja, o dinheiro que deveria ser canalizado para termos um SNS eficiente, para podermos responder bem a esta pandemia, tem sido utilizado para dar aos grandes grupos económicos que operam na área de saúde. Isto supostamente, um governo progressista, com o apoio da esquerda, e que uma alteração, não houve de facto um virar de página, daquilo que foram anos duríssimos de austeridade da direita.
E como é que olharam para o chumbo do Orçamento de Estado?
Tenho de falar aqui do que é o oportunismo de alguma da nossa esquerda em Portugal. O LIVRE , que tem a palavra de ordem que é “bota acima, não botes abaixo”, que é palavra de ordem que exige algum tempo e certamente muitas das pessoas não compreenderão o que ela diz. Mas se fizermos um esfoço para compreender o que o partido quis dizer com isso é uma forma do LIVRE criticar aquilo que foi a posição do Bloco de esquerda e do PCP de retirarem o apoio ao Governo do Partido Socialista. Até aqui tudo bem. O LIVRE pode defender isso. O problema é que depois o Rui Tavares já utiliza outra combinação: continua a criticar a esquerda por ser inflexível, mas já diz que a esquerda pode ter alguma razão e que pode ser o PS que não quis ceder. Veja-se onde chega o oportunismo nas eleições, onde tudo vale, onde se diz por um lado, que o BE e o PCP fizeram muito mal em mandar a baixo o Governo e, no outro dia, porque lhes convém tirar eleitorado obviamente ao BE e PCP já dizem “afinal a culpa pode não ser do BE e do PCP, mas do PS”. Ou seja, por oportunismo, por caça ao voto, o que é terrível, porque da esquerda espero sempre mais. Da direita não espero nada. Sou um trabalhador, trabalhei a maior parte das vezes com contratos precários, a ganhar salários de miséria em fábricas. Portanto, da direita só espero mais miséria, exploração, pobreza. Agora, dos que estão a minha esquerda gostava de um debate diferente, onde fosse pautado por discussão do programa e honestidade intelectual e não pela caça ao voto e o vale tudo. Relativamente ao BE e ao BCP também se formos faze uma análise crítica para o que foram os últimos anos, têm muita dificuldade em explicar o porquê de votarem contra este orçamento. É muito difícil depois de terem andado, estes anos, a viabilizar sucessivos orçamentos, a dizer que esta era política de grosso modo estrutural para ser seguida, mesmo com algumas matrizes e algumas nuances e depois dizem “não, não vamos continuar por aqui e isto já não chega”, quando na prática este orçamento era muito semelhante ao Orçamento a anterior, ou seja, havia uma linha de continuidade. O Bloco de Esquerda e o PCP caem na sua própria contradição de terem andado a apoiar um Governo que de facto não serviu o conjunto dos interesses da classe trabalhadora e dos seus setores mais exploradores e oprimidos: mulheres trabalhadoras, negras, trabalhadores imigrantes que têm uma vida duríssima cá, que recebem salários de miséria, muitas das vezes, em situações precárias de habitabilidade.
O MAS propõe acabar com o pagamento de propinas pelos estudantes. O cessar deste pagamento seria já para o ano letivo 2022/2023?
Temos, hoje, também um ensino que tem sido absolutamente descapitalizado. Há uma falta de investimento gigante e uma grande dificuldade de uma grande maioria da juventude em aceder ao ensino superior. Temos de discutir com alguma seriedade e perceber como conseguimos alterar isso. Depois, temos de perceber o porquê deste fenómeno, na maior parte dos casos não e uma opção, é a vida que impõe essa decisão. Significa que muita gente que vem de agregados familiares trabalhadores com dificuldades, dos setores mais marginalizados, que recebem menos salários, faz com esse tipo de jovens tenha dificuldade ou lhe seja impossível ingressar e permanecer no ensino superior. Porquê? Porque temos a questão do arrendamento, dos preços profundamente proibitivos da habitação e, por outro lado, o valor das propinas, e ,depois, temos também um outro problema, que é: hoje, a juventude que consegue ingressar no ensino superior, quando sai não tem garantias de nada. Há que fazer uma análise crítica sobre o porquê de isto acontecer. Ou seja, houve uma transformação muito grande da universidade. A universidade é um negócio também, uma fábrica de precários. O que interessa não é formar bem os alunos e prepará-los bem e colocá-los a pensar perante problemas, é uma avaliação virada para os exames como se fosse a única forma de aferir se as pessoas conseguiram ou não adquirir conhecimentos. Depois, a preocupação é mandá-los como um produto acabado para ser explorado no mercado. Hoje, entrar no ensino superior não é sinónimo de ascensão social, de bons salários de estabilidade laboral, perspetiva, progressão.
Então, o MAS sugeriria a abolição das propinas?
Essa é uma medida que, em primeiro lugar, é exequível, mas é preciso dinheiro e investir no ensino para isso, porque, como sabemos, durante muitas décadas não houve propinas neste país. Foi uma grande conquista da direita com o apoio obviamente convicto do Partido Socialista, porque não é uma inevitabilidade haver propinas. Achamos que as propinas têm de facto de acabar, mas não é suficiente, porque não basta não termos propinas e as pessoas terem grandes dificuldades em habitar fora das suas famílias, no caso de alunos deslocados, é preciso uma intervenção do Estado na questão do arrendamento. Já há programas de arrendamento jovem, a questão é que eles são muito insuficientes , ou seja, há uma intervenção do Estado, só que dá uma solução que é absolutamente parcial face ao problema tão gritante que se passa nos grandes centros urbanos. Daí ser necessária de facto uma intervenção pública na questão do mercado de arrendamento, no tabelamento das rendas, na questão das propinas. Mas como perguntaram, isto não pode ser só prometer, acaba-se com as propinas, dá-se arrendamento para toda a gente e o dinheiro? De onde vem o dinheiro? Pois, temos de ir buscar o dinheiro, mas é aonde ele está, onde está concentrado, que é nas grandes empresas, nos lucros colossais das grandes multinacionais, ir buscar dinheiro às maiores empresas portuguesas que não pagam impostos cá, porque têm as suas empresas na Holanda, que lhes é muito mais vantajoso financeiramente. E, depois, temos a elite preguiçosa deste país que tem o seu dinheiro ao custo da exploração dos trabalhadores em offshore, de branqueamento de capitais, de dinheiro que vem da criminalidade. Como é possível ainda termos offshores? É preciso acabar com as offshores, é preciso taxar as grandes fortunas, é preciso de facto confiscar os bens daqueles que andaram a roubar e a endividar o país e que agora passam a conta para quem não têm responsabilidade nenhuma naquilo que foi a governação e na gestão destas empresas. Ou seja, quando há lucros é para uma minoria, quando há prejuízos chama o Estado a pagar e quem é que é o Estado? São os trabalhadores que têm de descontar dos seus salários magros, miseráveis para financiar o Estado que é absolutamente magnânimo com aquilo que são os ricos, as eleites deste país, é absolutamente duro e inflexível.
Como é que o MAS pretende pôr fim às offshores na legislação portuguesa e europeia?
Na maior parte dos casos, estamos a falar de branqueamento de dinheiro de proveniência ilegal. Depois temos de compreender que isto é um sistema mundial e que a União Europeia é conivente com estas práticas. No caso do MAS, estaria a ser demagógico e se achasse que um deputado do MAS pode acabar com as offshores, pode é dar uma batalha tremenda no Parlamento para que isso aconteça. E percebermos a necessidade que temos que este dinheiro, de facto, fosse taxado. No último ano, estima-se que foi uma verba superior a 800 milhões de euros, é muito dinheiro. Dinheiro que era determinante, por exemplo, para investir na educação pública e não tem sido feito. Não chega o fim dos offshores. Não deveria existir offshores. Isto parece-me tão lógico. Como é que chegamos ainda a uma fase tão embrionária da questão sobre as offshores, ou seja, sobre dinheiro que vem de droga e de armas? Estamos a discutir se isto é legal ou não. É óbvio que as offshores não deveriam de existir. É preciso taxar as grandes fortunas e isso não tem sido feito. Nós temos uma carga fiscal brutal sobre o trabalho, consumo e depois temos os ricos que, pura e simplesmente, não pagam os impostos ou pagam impostos absolutamente irrisórios e depois nem sequer têm uma taxação do seu património, nem mobiliário, nem imobiliário.
Então para colocar fim às offshores, o MAS precisaria não só de tempo, mas de mais representação parlamentar?
Nada disto foi dado por nenhum Governo. Nada! De direita nunca seria como é óbvio, mas também não foi nenhum Governo de esquerda. Foi a mobilização dos trabalhadores, dos setores mais oprimidos e mais explorados da sociedade, que permitem grandes avanços qualitativos. Não nos podemos esquecer que só temos escola pública e serviço nacional público porque houve uma revolução, o 25 de abril. E as conquistas de abril, que a classe trabalhadora fizeram tem demorado décadas a ser destruídas. Estão a ser destruídas mas tem demorado décadas e tal foi a força do 25 de abril e do processo revolucionário. Estamos cá para isso, para um novo 25 de abril, uma transformação qualitativa, radical da sociedade ao contrário do BE e do PCP, que estão acomodados, acorrentados a este sistema, submissos, inertes e não estão a fazer o papel que lhes compete, que é estar nas lutas, nas ruas, na mobilização e na defesa intransigente dos trabalhadores e setores mais oprimidos da sociedade.
No programa, o MAS fala também da transição energética para empregar e não despedir. Como seria feita a conversão do emprego nos setores poluentes?
Essa é uma questão determinante. Como se tem dito nas mobilizações pelas questões das alterações climáticas: não há Planeta B, temos recursos finitos e, mais uma vez, as nossas elites têm expropriado todas as riquezas do nosso planeta em função, única e exclusivamente dos seus interesses e dos seus lucros. Chegamos a esta situação, não porque façamos compras no supermercado, vimos de lá com um saco de plástico ou porque andamos num carro a gasóleo. Chegamos a esta situação por causa daquilo que são as industrias, o transporte em larga escala da mercadoria. Os principais responsáveis para chegarmos a uma situação de emergência climática, mais uma vez, são as elites, os donos disto tudo, uma minoria parasitária, preguiçosa que vive à custa da maioria. Depois, temos, supostamente, governos que estão conscientemente a fazer uma transição. É preciso, então, descarbonizar a economia, abrir mão dos combustíveis fósseis e há que investir em alternativas. E a alternativa que nos têm vendido tem sido a do lítio, que é terrível e que vai trazer mais problemas na emissão de CO2, ou seja, dizem que o lítio é para resolver a descarbonização da economia e os problemas climáticos, mas apresentou uma solução que só vai trazer mais problemas nesse sentido. Nós achamos que é necessário fazer uma reconversão total energética. É possível vivermos com energias 100% limpas, temos de ter isso em mente, é um plano exequível e é preciso começar a fazer, desde já, essa transição. Veja-se o caso da refinaria em Leça qual foi a política do Governo. Com a política supostamente da descarbonização da economia mandaram-se para o desemprego mais de 1.000 trabalhadores. Estamos a falar de uma empresa que, há um par de anos atrás, teve dinheiro público para investir na refinaria de Leça e, agora, dizem-nos “afinal, desculpem lá, isto não é viável. E isto não só não é viável, como vamos despedir 1.500 pessoas”. Achamos que não é possível fazer uma transição que, mais uma vez , vá punir aqueles que são os mais vulneráveis: os trabalhadores. É necessário fornecer e reconverter estes trabalhadores em locais de produção de energia limpa. Estou a falar no caso de Leça, mas temos também a Central do Pego em que a política foi exatamente a mesma: fechar, despedindo. Achamos que a resposta não é essa: é reconverter, empregando, porque há gente no desemprego e há gente que não tem oito horas de trabalho. É possível e determinante que haja uma alteração radical daquilo que tem sido as políticas na transição energética. Isto para dizer que é uma grande hipocrisia fechar a Central do Pego e continuarmos a comprar energia lá fora, que tem a mesma proveniência. É um contrassenso.
O MAS fecha a porta á utilização de energia nuclear ou possibilita a utilização desta energia em conjunto com os iões de sódio?
Energias 100% limpas e sem riscos dentro da sociedade em que vivemos tem de ser não há alternativas. Tem de ser o sol, a água e o vento. Relativamente à energia nuclear, opomo-nos. Já tivemos ao longo da história acidentes gravíssimos, com consequências terríveis e nunca nos podemos esquecer da sociedade em que vivemos: situação complexa a nível mundial. Estamos a viver uma situação de disputa entre as grandes potências por um controlo cada vez maior dos recursos e da sua fatia dos lucros mundiais. É isso que explica a guerra comercial entre os EUA e a China, aquilo que tem sido a ocupação dos territórios ucranianos pela Rússia. Estamos a falar de um clima de muito conflito e que não sabemos o que se vai desencadear daqui para a frente com um clima de grande disputa e tensão entre potências e elites dominantes. e obviamente numa sociedade destas, a energia nuclear é perigosíssima, ou seja, não podemos confiar numa energia nuclear nas mãos destes senhores que são capazes de fazer de tudo para garantir o melhor para a classe que representam: os ricos, os poderosos, os donos disto tudo, a elite parasitária e, essa sim, subsídiodependente, que quando as empresas dão prejuízo vão chamar o Estado.
E se não fosse essa questão da má utilização pela elite da energia nuclear, o MAS já validaria a sua utilização?
Essa seria uma outra discussão numa sociedade absolutamente distinta à que vivemos hoje e depois obviamente de se estudar as pessoas mais capacitadas sobre essa temática.Teria de ser um diálogo a ser feito. Hoje, e a política é feita para os dias que correm e não para amanhã, colocamos de parte pelos perigos que acarreta.
O MAS fala de uma grande carga fiscal, cuja responsabilidade atribui tanto ao governo de António Costa como de Pedro Passos Coelho. O movimento Alternativa Socialista fala ainda sobre a necessidade de taxação das grandes fortunas. Pegando neste último aspeto, o MAS tenciona reduzir a carga fiscal sobre a classe média e focá-la em pessoas com rendimentos acima de algum valor em particular? O MAS reduziria o número de escalões de IRS com vista a que a carga fiscal afetasse mais as grandes fortunas e o menos possível a classe média?
E por ordem de que valor é que são essa grandes fortunas?
E preciso compreender que o MAS estando fora dos corredores de poder tem muita dificuldade em dar voz suficiente a este tipo de propostas e essa é uma das razões porque é necessário ter alguém no Parlamento para cumprir um papel de denuncia e propor alternativas e perceber que as grandes fortunas deste país são muito difíceis de avaliar de forma precisa com alguma aferição, porque como é óbvio usam todos os esquemas para ter inúmeras testas de ferro, para garantir que a sua propriedade não está em seu nome. Depois, passam as propriedades para outros membros da família, tem várias empresas em seu nome que, muitas vezes, subcontratam outras empresas que, por sua vez, fazem parte de um grupo económico que pertence a outro grupo. Depois, vai-se a ver e na prática estamos a falar de duas, três, quatro grandes empresas. Neste tipo de negócios é o vale tudo, o que dificulta a taxação na pratica de toda a riqueza destes senhores. ou seja mesmo que tivéssemos uma taxação efetiva desta fortunas. Ia sempre haver forma destes senhores conseguirem escapar, porque todas as leis estão construídas de forma a permitir que de facto para os ricos seja possível a acumulação infinita de riqueza e que para os pobres esteja garantida vidas de grande dificuldade, contratos precários, e não haver perspetivas de futuro e de ascensão social. Só há perspetivas de trabalho, trabalho, trabalho. Não tem de ser assim. No caso da Suíça, consegue uma arrecadação fiscal de mais do que 1% do PIB. Estamos a falar de valores significativos com taxas absolutamente irrisórias que ficam aquém daquilo que os grandes grupos económicos podem e devem pagar. Agora, não esperem que sejam os governos a arranjar as soluções, mesmo que possam parecer muito obvias e racionais e a terem de ser aplicadas imediatamente. Só vamos conseguir mudanças se de facto nos mobilizarmos por elas, sem luta não vamos conseguir nada, a votar de quatro em quatro anos não vamos conseguir nada.
O programa do Movimento Alternativa Socialista fala da necessidade de tabelamento das rendas em 30% do salário. Esse valor corresponde a 30% do salário mínimo ou do salário do inquilino?
Porque, mais uma vez, as propostas isoladas não vão resolver os grandes problemas estruturais que temos e, também, é conveniente perceber isso. Até porque estamos num momento de grande caça ao voto, de oportunismo, de que tudo vale, ou seja, só vale eleitoralismo e é preciso compreender que, ao ponto a que chegamos, são necessárias alterações muito profundas e combinar uma série de propostas. Não basta tabelar. Achamos que é a primeira questão fundamental: tabelar em 30%, mas é preciso também pôr fim à especulação imobiliária. Temos de compreender que o preço da habitação está no ponto em que está, por causa daquilo que tem sido o negócio em torno da habitação. Como sabemos, o Expresso, há uns tempos, lançou um artigo muito interessante sobre isso: há casas em que nunca viveu lá gente e que já foram vendidas duas a três vezes. Imaginem o contrassenso que é termos casas que não são habitadas por ninguém, não tem utilização absolutamente nenhuma e que estão sistematicamente a serem vendidas por aquilo que tem sido a especulação, o aumento galopante do preço da habitação. Depois, tivemos uma política, nos últimos anos, de investir, única e exclusivamente no turismo. Com a questão da pandemia, viu-se a fragilidade do que era uma economia assente no turismo. Acaba por ser uma economia muito mais fragilizada, que com contratempos, vai-se imediatamente abaixo e o facto de o Governo ter investido no turismo da habitação levou a que houvesse um aumento enorme na questão do alojamento local. Tudo isso vai acabar por encarecer o preço da habitação e por tornar absolutamente incomportável ter casa. E não nos podemos esquecer de uma coisa: que há muita gente que tem casa, mas que não vive em condições dignas. Percebemos, também, que temos ainda muita gente que infelizmente nem consegue viver numa casa, como a conhecemos, que vive em habitações precárias. E, ao mesmo tempo, temos casas sem gente. Ou seja, tanta gente sem casa e tanta casa sem gente. Não pode ser! Há que alterar, há que ter uma política interventiva do Estado na questão da habitação e não nos podemos esquecer, mais uma vez, que a habitação tem de ser um direito inalienável, garantido. Está na Constituição inclusive. Claro que o que está na Constituição é uma coisa, depois na prática vemos que a realidade é outra. Infelizmente, a Constituição é produto de uma revolução social, do 25 de Abril. É preciso uma alteração significativa daquilo que tem sido a política da habitação.
Quais são as propostas nas questões laborais e em que é que o MAS pode fazer a diferença na vida dos trabalhadores?
Ao contrário dos outros partidos, não somos oportunistas, não achamos que vale tudo. O MAS não faz política para a população toda que vive neste país, faz política para a classe trabalhadora e para os setores mais explorados, mais vulneráveis, mais desprotegidos, que não têm voz. Não falamos para a globalidade do eleitorado. Estamos aqui, única e exclusivamente, para defender um programa alternativo à miséria, desigualdade, injustiça, opressão, segregação e exploração mais vil. Queremos construir de facto uma sociedade alternativa a esta. Achamos que é fundamental a questão do trabalho é essencial haver uma alteração profunda daquilo que é o nosso Código do Trabalho, daquilo que são os nossos salários e pôr termo às empresas de trabalho temporário. Tivemos um governo do PS que fez uma das suas bandeiras eleitorais, o combate à precariedade, e a verdade é que o Estado continuou a empregar precários, continua a ser um dos maiores empregadores de precários. O próprio Estado não dá exemplo. Depois, continuamos com empresas de trabalho temporário que, na prática substituem os centros de emprego, ou seja, temos várias empresas de trabalho temporário, que se aproveitam daquilo que é a volatilidade do mercado de trabalho e coloquem os trabalhadores sob regimes absolutamente draconianos que lhes impossibilita de ter uma perspetiva de futuro, porque esta é única e exclusivamente com contratos precários que podem acabar a qualquer momento. Ou seja, é preciso pôr termo às empresas de trabalho temporário, denunciar o papel que elas cumprem, e é urgente a dignificação do trabalho e de devolver a dignidade ao trabalho. Temos um salário de 705 euros, de miséria. É preciso um aumento significativo de salário, que seria por volta de 200 euros, mas que é imperiosa uma alteração imediata daquilo que são os salários e depois a questão dos dias do trabalho que é também uma proposta diferente daquelas que foram apresentadas pelos partidos à esquerda (Livre, BE e PCP) que é a questão dos quatro dias de trabalho. Achamos que, neste país, se trabalha muito, se ganha pouco, se passa muito tempo no local de trabalho ganha muito, nas viagens para o trabalho e pouco tempo para disfrutar com os nossos amigos e familiares, ter espaço para o lazer e cultura e não estarmos submetidos a uma carga horária tremenda e a um ritmo de trabalho intensíssimos que obviamente nem nos permite disfrutar as poucas horas livres e as próprias folgas disponíveis.
O MAS concorda com a medida que o Partido Socialista está a propor quanto aos 4 dias de trabalho?
Qual é o objetivo do MAS para estas legislativas?
É a primeira vez que consegue concorrer a todos os círculos eleitorais. É muito difícil para o MAS chegar à comunicação social, tivemos pouquíssimas oportunidades de expor o nosso programa. Achamos que é necessário acordar a esquerda, apresentar um programa alternativo ao que tem sido as governações de direita e do PS. É necessário a esquerda voltar a oposição, a estar nas ruas, voltar a haver mobilização social, lutas, greves. Só assim é que vamos ter uma alteração qualitativa . E achamos que um deputado do MAS no Parlamento, a mais forte possibilidade é a Renata Cambra, porque pode fazer a diferença e contar muito mais do que qualquer deputado do BE ou do PCP. A Renata pode ser de facto a voz dos oprimidos, explorados dos ativistas que estão nas ruas todos os dias para alterar e achamos que a Renata pode ser a porta voz destes setores mais explorados para enriquecer uma minoria, que vive à nossa custa. Ou seja, a Renata é uma voz diferente, com propostas alternativas e esperança por uma sociedade diferente de capitalismo.
Entrevista por Filipe Pereira e Vasco Castro Pereira. Texto por Inês Pinto Pereira. Revisto por Filipe Pereira e Inês Pinto Pereira