Você conhece o Douyin, versão-matriz do TikTok que é autorizado na China?

Hoje decidi trazer um pouco de conteúdo mais “jornalístico” no sentido estrutural da coisa. Tenho escrito para um portal de notícias brasileiro sobre tecnologia blockchain e criptomoedas. Tenho lidado com pautas mais nesse sentido e aprendido sobre conteúdos mais “técnicos” — para não dizer chato. Essa estrutura amarradinha do jornalismo é meio quadrada demais…

Enfim… entre esses assuntos “novos”, achei bem pertinente compartilhar esse com vocês. Vamos lá então. 

Me parece que todo o mundo conhece, ou pelo menos já viu pelo Reels do Instagram, algum vídeo do TikTok. Trend, dancinhas, lives de famosos… mas e a aplicação Douyin, você já ouviu falar? 

Saiba logo de cara que os dois aplicativos possibilitam que seus usuários desenvolvam e compartilhem conteúdo. E mais, ambas as aplicações permitem transmissões ao vivo, deixando até que você adicione efeitos especiais divertidos, áudios pessoais e músicas em alta ao seu conteúdo. 

Sei, para quem já conhece isso é bem básico.

Contudo, mesmo que Douyin e TikTok sejam plataformas de compartilhamento de vídeo, eles apresentam algumas diferenças operacionais distintas.

Embora Douyin seja o aplicativo-matriz, as duas aplicações não estão vinculadas. Como pode isso? Uma diferença bem direta é que o Douyin só pode ser baixado nas lojas de aplicações chinesas, enquanto o maioral TikTok é acessível em todo o mundo.

Numa perspectiva de marketing e mídia social, em termos mais técnicos, as diferenças mais gritantes entre Douyin e TikTok podem ser vistas nas preferências dos usuários, que estão totalmente ninchadas de acordo com cada mercado. 

Ou seja, nas duas aplicações, tanto o conteúdo do usuário, como as funções no aplicativo e as técnicas de marketing da aplicação, estão diretamente influenciadas pelo que as pessoas desejam ver em cada plataforma. O algoritmo aprende as suas preferências e organiza o seu “feed” de acordo com as suas maiores interações e impressões. Nada de novo ao sol, até aqui. 

Mas também existem algumas diferenças segmentadas em “blocos” e vou comentar um pouco mais sobre elas agora. Rola a tela e segura a tua atenção aqui: 

Quesito acessibilidade 

Como já citei anteriormente, o aplicativo Douyin é exclusivo para pessoas localizadas na China Continental e só pode ser acessado por meio da China App Store. 

E mais, o TikTok chinês é um aplicativo padrão e exclusivo para consumidores chineses; enquanto no Ocidente, é impossível baixar a versão “original” do aplicativo. 

Bugou tua cabeça? Deixa explicar: o TikTok pode ser acessado e baixado para usuários estrangeiros da Google Play Store ou da Apple Store, mas é apenas uma versão feita para o resto do mundo. 

O curioso é que ambos os aplicativos apresentam processos de registro muito diferentes. Criar duas versões independentes do mesmo aplicativo foi uma jogada bastante sábia da Bytedance, desenvolvedores dos dois aplicativos. 

A Bytedance separou Douyin do resto do mundo por um motivo: questões políticas. 

Todo mundo sabe que o regime de regulamentação de conteúdo do governo chinês jamais permitiria que o aplicativo se expandisse para além de suas fronteiras. E isso implica dizer que, se Douyin permitisse que conteúdos de vídeos atravessassem as “muralhas da China”, ou que a nação pudesse acessar material de todo o mundo, de certo, o aplicativo seria bloqueado em um instante.

Filtros de beleza

Numa era totalmente estética-digital, um aplicativo sem filtro não vale de nada. Nesse quesito, as interfaces do TikTok e do Douyin são parecidas, mas existe uma diferença bem clara entre os dois aplicativos: 

Quando os usuários ligam suas câmeras, o Douyin possui um filtro de beleza automático capaz de suavizar a pele e até mesmo mudar o formato do rosto de uma pessoa. 

E isso é bem coerente com o governo Chinês, né isso!? Por acaso, se você não sabe, há muito tempo as mulheres na China enfrentam uma enorme pressão para se adequar aos padrões de beleza.

As chinesas são praticamente obrigadas a manterem um corpo esguio, pele orvalhada, olhos grandes e maçãs do rosto salientes. Não é àtoa que há uma demanda por cirurgia plástica no país.

Por isso, os aplicativos de beleza se empenham para criar filtros que mostrem aos usuários versões mais bonitas de si mesmos. 

No ocidente, embora o TikTok também tenha filtros de beleza, essa é uma ferramenta opcional, ficando a cargo dos usuários decidir selecioná-los ou não durante as suas filmagens.

O que não significa dizer que não exista uma pressão sobre nossos corpos e beleza, mas essa tensão aqui é mais social do que “política”.

Comprar direto da plataforma 

Aqui temos uma diferença bem significativa. A China oferece um enorme mercado de compras online. Portanto, a versão chinesa do aplicativo é bem focada nisso.  

O que você precisa saber nesse tópico é que as vendas de produtos ao vivo é a menina dos olhos de ouro do comércio. Estou falando de uma indústria multibilionária na China Continental. E durante a pandemia, esse mercado saltou!

Essa alta demanda faz com que as compras no aplicativo sejam facilitadas. Milhares de produtos, cupons de descontos saltando, serviços de compras a apenas um toque. Imagina ai o site da Shein, é bem isso. 

Logo, isso faz do Douyin uma plataforma extremamente importante para livestreamers, junto com Taobao, um tipo de mercado online semelhante ao eBay do Alibaba, ou para ser mais objetivo, é como o Mercado Livre no Brasil. 

Restrições 

Aqui nenhuma surpresa, né? A versão chinesa do TikTok, o Douyin, adota uma linha muito mais rígida com os usuários mais jovens. 

Por exemplo, todos os usuários menores de 14 anos podem acessar apenas conteúdos tidos como “seguros” para crianças. Usar o aplicativo? Apenas durante 40 minutos por dia. E mais, existe também um “toque de recolher”, eles não podem usar o aplicativo das 22h às 6h.

Aqui no ocidente, o TikTok tomou algumas medidas: todos os usuários com menos de 18 anos devem ter as suas contas  moderadas para um limite diário de tempo de tela de uma hora, mas diferente da China, os usuários adolescentes podem desativar essa nova configuração dita como padrão.

TikTok: entretenimento ideológico visceral e rentável 

É curioso analisar essas diferenças e perceber que existe uma grande preocupação da China com o uso do TikTok, mas que essa preocupação se aplica apenas ao seu país. Além de ser possível observar marcas culturais bem presentes na versão chinesa, como a aplicação de filtros automáticos, por exemplo. 

Para muitos pesquisadores sociais da atualidade, as redes sociais são consideradas uma grande fonte de informação e difusão cultural — e alienação. E, em tempos de marketing digital, uma arma muito poderosa para as grandes empresas e multinacionais. 

Há tempos que a indústria cultural já alertou que o entretenimento também é uma forma eficaz de diluição de opiniões e ideais. Por isso, controlar os conteúdos na China é uma forma de “proteger” os seus, blindando-se do mundo ocidental. 

Em contrapartida, o país também oferece o aplicativo, sem moderação, para o resto do mundo. Tendo em vista que grandes potências como EUA dominam o mercado de aplicativos de redes sociais mais relevantes (Instagram, Facebook, Whatsapp), a China entende a necessidade de ocupar o mercado das redes sociais com um aplicativo tão potente, de fácil interação e totalmente cativante. 

Saiba que o TikTok não é a única plataforma de propriedade chinesa que logrou êxito nos Estados Unidos. Dos 10 aplicativos gratuitos mais populares, quatro foram desenvolvidos com tecnologia chinesa. 

Além do TikTok, há também o aplicativo de compras Temu, a varejista de fast fashion de grande sucesso no Brasil, a Shein e o famoso aplicativo de edição de vídeo CapCut, que também pertence à ByteDance. 

É, meus caros, mesmo com muitos escândalos e uma grande possibilidade de ser banido dos EUA, seu maior concorrente comercial, o TikTok continua extremamente popular no país, com mais de 150 milhões de usuários mensais – quase metade da população dos EUA.

(Fonte: CNN Brasil)

Artigo da autoria de Ícaro Machado