Política
O CONFLITO ENTRE LUAS E ESTRELAS
“Quase não havia árvores ou arbustos por ali. Mesmo a oliveira e o cacto, aqueles amigos de um solo sem valor, tinham praticamente desertado do país. (…) Jerusalém é sem vida. Eu não desejaria morar lá. É uma terra sem esperança, sombria e desconsolada. (…) A Palestina está assente sobre saco e cinza. Sobre ela avulta o feitiço de uma maldição que tem feito definhar seus campos e limitado suas energias.”
Marc Twain
No passado mês de setembro uma comitiva de 13 eurodeputados, pertencentes ao Grupo Confederal da Esquerda Unitária Europeia/Esquerda Verde Nórdica, deslocou-se à Faixa de Gaza. O objetivo seria recolher informação in loco, ou seja, observar o estado da região e da população e também um contacto com autoridades. Essa mesma recolha de dados teria como finalidade apresentar uma proposta de intervenção, sobretudo em ajuda humanitária, por parte da União Europeia. Nas palavras de Marisa Matias “A União Europeia tem sido cúmplice da ocupação. A UE não reconhece os territórios ocupados – seja nos montes Golã, na Cisjordânia ou em Gaza – mas continua a atuar como se não estivessem ocupados. A UE tem um acordo de associação com Israel que declara no artigo segundo que não pode haver violação de direitos humanos, mas não suspende o acordo faça o que faça Israel.”. O eurodeputado do PCP em conformidade afirma que o estado judeu continua com as suas políticas militares devido ao apoio da União e também dos Estados Unidos da América: “As negociações de paz entre palestinianos e israelitas estão neste momento num impasse. E estão num impasse porque Israel, com o apoio dos Estados Unidos e da União Europeia, persiste em boicotá-las. Recusa pronunciar-se sobre as propostas palestinianas e mantém a sua política de instalação de novos colonatos, minando assim qualquer acordo. Neste momento, e apesar das condenações formais dos EUA e da UE, Israel ocupou de forma ilegal mais uma parcela de 1000 hectares na Cisjordânia (em Belém) onde pretende instalar mais um colonato.”
Dessa mesma lista de 13 deputados foi apenas autorizada a entrada de 8 destes. Todavia, esta permissão teve um retrocesso quando Israel acabou por barrar a entrada, autorizando apenas a passagem de ajuda humanitária. Segundo Miguel Viegas “O facto das autoridades Israelitas nos terem negado o acesso à Faixa de Gaza diz muito sobre o incómodo da nossa visita aos territórios palestinianos.”. Já a eurodeputada do BE acredita que desta vez o caos instalado será ainda pior do que das vezes em que conseguiu entrar no território nos anos de 2008 e 2011. Para isso baseia-a na descrição que lhe havia sido dada diretamente pelo responsável das Nações Unidas no terreno: “Lembra-se da primeira vez que lá esteve? Agora é incomparável. O nível de destruição é equivalente ao da segunda guerra mundial”.
Devido a este condicionamento de última hora, os representantes portugueses foram obrigados a entrar em Israel pelo Egito. Depois disso dirigiram-se a Jerusalém e aí iniciaram uma jornada de quatro dias. Para além de Jerusalém e Ramallah percorreram também as cidades de Belém e Hebron. Nesta última existem 104 postos de controlo onde todos os palestinianos são revistado e sujeitos a um longo compasso de espera para depois percorrerem apenas alguns metros. “Em algumas ruas, os colonos ocupam os primeiros pisos das casas de onde deitam de forma ostensiva lixo para baixo, obrigando os palestinianos a usar redes para evitar que as ruas se transformem num lixeira. Este exemplo, que pode ser replicado por centenas de outras localidades, deixa antever uma estratégia clara de provocação, procurando alimentar reações desesperadas por parte da população palestiniana e justificar assim mais carnificinas.” afirma Miguel. Marisa lembra que a passagem de todo o povo árabe é feita por uma única porta de passagem para a localidade vigiada por 6000 soldados. Segundo a própria é um ambiente onde “não se respira” e que recorda “verdadeiramente um regime de apartheid.”.
Para além deste contacto direto com a população, os eurodeputados travaram conhecimento ainda com os governadores e presidentes de câmara locais e com membros da OLP (Organização para a Libertação da Palestina). Esta organização fundada em 1964 é, desde 1974, a representante legítima do povo palestiniano aos olhos da Liga Árabe e foi gerida (até à sua morte em 2004) pelo conhecido prémio Nobel da Paz, Yasser Arafat. Começou por defender uma política antissionista, ou seja, contra a defesa da legitimidade do estado judeu devido aos critérios religiosos e históricos, porém passou a defender uma solução bi-estatal em que os dois estados pudessem coexistir dentro de determinados critérios.
Estiveram ainda com o primeiro-ministro do Governo de Unidade Nacional que conta com o apoio dos dois maiores partidos do país: o Fatah e o Hamas. O primeiro é o que tem uma maior expressividade dentro da OLP. Para além disso é o partido mais moderado e é o que procura um maior consenso com a parte judia. No caso do Hamas, provavelmente o mais conhecido, foi o partido vitorioso nas últimas eleições e hoje ainda contêm mais poder. É muito mais extremista e menos voltado para o diálogo.
A dignidade de um povo que é reduzida pela falta de água, eletricidade e até à falta de um hospital ou de uma simples escola. Reduzida quando de apenas 1.8 milhões, o número de desalojados chega aos 700 mil.