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Crónica

O PORTO DO PORTO

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O Porto é uma cidade indelevelmente ligada com o rio Douro e com as histórias que o tempo foi tecendo em torno dessa relação.

Do tempo longo, chegam relatos que são habituais nos mitos fundacionais das cidades. Suficientemente longe dos perigos que vinham por mar, a cidade foi-se desenvolvendo junto de um ponto onde a travessia era mais favorável. Desde a colina amuralhada onde ainda está a catedral medieval, o burgo foi descendo até às margens, até à “ribeira”, ao longo da qual se construíram muralhas que acumulavam a sua função militar e a regulação do comércio. Domínio e poder, comércio e relação, são constantes do código genético das cidades, aqui reforçadas pela facilidade que as estradas da água podiam oferecer quando as outras estradas eram menos eficientes e inconstantes. Foi assim até ao apogeu do comércio do Vinho do Porto e das rotas comerciais do Norte da Europa e do Brasil.

Passados séculos, o rio Douro deixou de ser o porto do Porto. A faina fluvial que Manoel de Oliveira exemplarmente documentou (Douro, faina fluvial, 1931), deixou de ser o motor económico do burgo, criador de emprego desde o trabalho árduo da estiva, à vertigem do dinheiro no Palácio da Bolsa ou à azáfama dos comerciantes, grossistas, transportadores, transitários, seguradores… O velho Porto desfuncionalizou-se e diluiu-se numa extensa mancha urbanizada e industrializada que quase vai de Aveiro a Viana do Castelo.

Agora no rio passam barcos de turistas e, nas suas margens, o que era armazém, alfândega, fábrica, casa pobre…, vai-se transformando em museu, condomínio fechado, hotel, parque temático, restaurante, loja de luxo e outra qualquer actividade produto deste novo ciclo de estetização e nobilitação do rio. Nem o Aleixo escapa à cobiça deste tesouro.

Assim é a urbanidade: construção social em permanente modificação, tomando novos usos e sentidos como diria Camões (…) E afora este mudar-se cada dia, / Outra mudança faz de mor espanto, / Que não se muda já como soía.

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