Cultura
GRINGOS E MUTANTES INVADIRAM O PORTO
Enquadramento histórico – São Paulo, Brasil, 1966:
Os irmãos Arnaldo e Sérgio Baptista formam, juntamente com a famosa cantora Rita Lee, uma banda influenciada pelas radiações Beetlianas e que viria a revolucionar a Música Popular Brasileira – Os Mutantes, que se estreiam em estúdio em Junho de 1968 com um álbum homónimo. Esta transfiguração musical a nível nacional viria a contar ainda com personalidades como Caetano Veloso, Gilberto Gil, Torquato Neto, Tom Zé, e muitos outros.
Em Tropicália: ou Panis et Circencis, a banda colabora com os artistas anteriormente mencionados e dá origem a um disco considerado, pela revista Rolling Stone, como o segundo melhor álbum Brasileiro de todos os tempos.
Antes de se afastarem do movimento musical de seu nome Tropicália, para experimentarem um rock mais ao gosto inglês e americano, ofertam ao mundo, em 1969, um novo disco: Mutantes.
Ganharam, ao longo de muitos anos de carreira, um afeto sincero de músicos como Kurt Cobain, David Byrne (dos Talking Heads), Flea (dos Red Hot Chili Peppers), os The Bees, e a lista continua…
Atualidade – Porto, Portugal, 2 de Dezembro de 2015, 22:10:
Oito álbuns e quarenta e nove anos depois, eis que a mítica banda dá por si, no percurso de uma intensíssima tour internacional, no palco principal do Hard Club. Coube ao O Gringo Sou Eu aguçar o apetite do público. Assim o fez, com o seu hip hop intervencionista e uma fantástica presença em palco apimentada por um excelente sentido de humor. Um artista que já tinha dado a conhecer as suas ousadas letras em terras lusas, destacando-se a sua atuação no festival Milhões de Festa neste ano.
Seguir-se-ia o “cabeça de cartaz”. Da formação original restava apenas Sérgio Dias Baptista, ainda cheio de pedalada, que se fazia acompanhar por um novo baterista e pelos restantes quatro músicos que participaram no último álbum da banda, Fool Metal Jack. Os Mutantes tocaram alguns temas mais atuais, mas não se esqueceram dos grandes clássicos como Bat Macumba, El Justiciero, Panis et Circencis, Balada do Louco, Portugal de Navio, entre muitos outros que marcaram mais do que uma época e do que um só continente.
A banda oscilou entre as batidas mexidas cariocas e umas valentes “rockalhadas” psicadélicas, e o público, por sua vez, ia ajustando a sua linguagem corporal, passando de tentativas de dançar uma hibridação de samba e forró ao headbanging meditativo que só uma trip musical de excelência consegue provocar.
Cantou-se em português, inglês e espanhol, mas sempre de forma sublime, ainda que com um aumento progressivo de rouquidão denotada na voz do líder do grupo. A lenda viva, para descansar, ia contando umas histórias engraçadas de concertos anteriores, até que foi revelado que era o seu aniversário. De imediato, a audiência dedicou-lhe alegremente o “Parabéns a você”, com um sotaque brasileiro sensivelmente bem imitado. Como forma de agradecimento, foi-nos dado a ouvir a “Sunshine of your love”, dos Cream. E não se podia pedir mais generosidade num concerto que foi, simultaneamente, um privilégio e uma lição sobre as raízes de uma evolução exponencial artística de um grande país.