Ciência e Saúde

SISMOS: DA PREVISÃO À PREVENÇÃO EM PORTUGAL CONTINENTAL

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O foco da apresentação foi a tese de doutoramento em Sociologia, publicada em 2006, mas ainda muito atual. O estudo, apresentado na Faculdade de Ciências da Universidade do Porto (FCUP), encara a evolução que a perceção do risco teve na sociedade e coloca a questão: “Como se distribuem as visões académicas e leigas em relação ao risco sísmico em Portugal Continental?”.

“As sociedades modernas encontram-se confrontadas com os princípios e os limites do próprio modelo de desenvolvimento”, explicou a investigadora. A segurança nos dias de hoje é comparada com um outro qualquer bem de consumo, e o perigo muitas vezes surge por uma decisão desinformada do consumidor. Há uma evidente dissociação entre a qualidade de vida e a produção de conhecimento.

A dissociação surge de um paradigma mantido durante vários anos em sismologia: o da previsão. Vários fatores explicam o atraso na capacidade de previsão da atividade sísmica. Um deles será o facto de os sismos serem eventos de probabilidade condicionada e não frequencista (isto é, dependem da análise de vários indícios em tempo real, e não ocorrem periodicamente, especialmente em regiões menos ativas). Outro motivo será a dificuldade do estudo de várias componentes como deslocações de terra, durante os sismos.

Foto: Mário Silva

O objetivo da previsão é tão antigo como a ciência em si, sendo “inerente à ciência como explicação”. No entanto, um foco único na investigação da previsão sísmica ignora um papel mais relevante: o da prevenção. Há uma função do cientista enquanto cidadão, e uma responsabilidade associada às instituições académicas em informar o público e auxiliá-los na única ferramenta ao seu dispor.

O que distingue “risco” de “perigo”, defende Carmen Gonçalves, ecoando Luhmann (sociólogo alemão), é que o perigo é uma situação sem decisão por parte da vítima, podendo no entanto conter decisões de construção ou ordenamento do território por outras entidades. Por outro lado, o risco assenta na decisão informada, e na aceitação consciente da situação em que o cidadão se encontra. Neste mecanismo entram cientistas, legisladores e seguradoras, que fornecem informação para a decisão a ser tomada.

Na tese, Carmen Gonçalves explora as opiniões expressas por amostras de cientistas ligados à área do risco sísmico em Portugal, juntamente com focus groups de leigos e cientistas do Porto e Lisboa. Os cientistas mostraram uma preocupação em informar e participar ativamente na sociedade como cidadãos,”procurando preservar, contudo, a sua identidade como experts“. Há um esforço relativo à “responsabilidade social na especificidade da sua cultura intelectual” para melhorar os processos de comunicação nas áreas técnicas em que são especialistas, explicou a especialista.

Foto: Mário Silva

O caminho para tornar esta visão realidade, na sua opinião, é assegurar o papel do Estado na sua responsabilidade de informar a população (especialmente pela via escolar) quanto aos riscos inerentes à atividade sísmica e à sua prevenção, incluindo “planos de assistência e socorro, e exercícios de simulação e de evacuação”.

Outra conceção mais abrangente é a da reformulação da atitude política face à probabilidade deste tipo de eventos. A noção do governo “mandato a mandato”, conjugada com a memória curta dos portugueses sobre a atividade sísmica séria no país, poderão, na opinião da socióloga, levar a sérios problemas. Deve estar-se atento a estes fenómenos para assegurar não só a regulamentação, mas também a fiscalização permanente.

Na opinião de Carmen Gonçalves, a realidade toma um papel importante em expor as nossas incapacidades de lidar com eventos relativamente raros e destrutivos, e a necessidade da informação científica traduzida entre campos e para a população é maior do que nunca. A memória recente dos fogos florestais em Portugal fornece um exemplo recente da nossa capacidade de prevenção, tal que este tema dominou as sessão de questões após a palestra.

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