Ciência e Saúde

Vírus G4 EA H1N1 com potencial pandémico encontrado em porcos na China

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O estudo publicado nesta segunda-feira, 29 de junho, na revista científica americana Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS), por investigadores da Universidade Agrícola da China (CAU), anuncia a probabilidade de uma futura pandemia por um vírus do tipo influenza entre os seres humanos.

Segundo o estudo, o vírus, apelidado de G4 (G4 EA H1N1), é geneticamente descendente do vírus H1N1 que causou a pandemia de Gripe A, variante da gripe suína, em 2009. Porém, o anúncio não é motivo para pânico. O G4, embora possua “todas as características de um candidato a vírus pandémico”, como dizem os investigadores, não representa uma ameaça imediata à saúde global.

A gripe suína ocorre em pessoas que entraram em contato com porcos infetados e os sintomas são similares àqueles da gripe comum: febre, falta de apetite, tosse, dores de garganta, coriza, náusea, vómito e diarreia. Após o surto de H1N1 em 2009, estudos relatam uma nova disseminação do vírus nas populações suínas ao redor do mundo, levando à recombinação genética e criação de novos vírus, como o G4.

Com a maior população de gado suíno do mundo, contando com cerca de 500 milhões de cabeças, a China monitoriza constantemente a evolução do vírus influenza em fazendas e matadouros. “A criação de porcos é uma indústria maciça na China e os porcos podem ser importantes hospedeiros dos quais podem surgir novos vírus influenza”, explica James Woods, diretor do departamento de Medicina Veterinária da Universidade de Cambridge, em entrevista para a rede CNN. Para Woods, o estudo foi um “lembrete de que estamos constantemente em risco de surgimento de novos patógenos zoonóticos e que os animais de criação, com os quais os seres humanos têm maior contato do que com a vida selvagem, podem atuar como importantes disseminadores de vírus pandémicos”.

Monitorização e descoberta

Como parte de um projeto para identificar potenciais estirpes pandémicas do vírus influenza, o grupo liderado pela investigadora Liu Jinhua, da Universidade Agrícola da China analisou cerca de 30 mil amostras de conteúdo nasal de porcos em matadouros e clínicas veterinárias de 10 províncias chinesas entre os anos de 2011 e 2018. As amostras continham 179 vírus influenza suínos, na sua vasta maioria, do tipo G4. “O vírus G4 mostrou um aumento acentuado desde 2016 e é o genótipo predominante em circulação nos porcos estudados”, referem os investigadores.

A variante G4 é especialmente preocupante, uma vez que no núcleo há material genético proveniente do vírus da gripe aviária – para a qual o Homem não tem imunidade – misturado com o das estirpes comuns em mamíferos (incluindo a estripe de H1N1 da pandemia de 2009). Estudos em laboratório feitos pela equipa de investigadores responsáveis pela descoberta, mostram que o G4 pode infetar e se replicar facilmente nas células epiteliais humanas. O vírus também se mostrou adepto a transmitir-se rapidamente entre furões, um animal popular como modelo de estudos de transmissão de influenza, uma vez que apresentam sintomas semelhantes aos dos humanos.

Os vírus do tipo influenza frequentemente passam de porcos para humanos, mas poucos são transmissíveis entre humanos. Os dois casos documentados de infeção humana pelo G4 não apresentaram transmissão para outras pessoas. Embora a probabilidade de pandemia por essa variante seja baixa, a bióloga do Centro Internacional Fogarty do Instituto Nacional de Saúde dos EUA, Martha Nelson, lembra que “o vírus influenza pode nos surpreender”, recordando o surto de 2009 quando ninguém sabia da transmissão de H1N1 de porcos para pessoas até surgirem os primeiros casos entre humanos.

De acordo com testes de imunidade realizados pelos investigadores, 10,4% dos trabalhadores de fazendas e matadouros na China já teriam sido expostos ao G4, e cerca de 4,4% da população chinesa (com base numa amostra de 230 pessoas) também já teria anticorpos para a nova estripe.

Daniel Lahr, professor do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo (USP) e especialista em microbiologia evolutiva, explica que “o vírus existe. Ele está sendo transmitido entre porcos. E também já foi determinado que ele infeta de um porco para uma pessoa. Agora, só falta um passo e para isso [o vírus] precisa de modificações muito menores. Ele pode conseguir passar de humano para humano. A parte mais difícil para o vírus é mudar de hospedeiro – é ir do porco para o humano –, isso ele já fez. Agora falta ele passar de humano para humano, e é um passo muito menor. Não quer dizer que vai acontecer, mas existe uma boa probabilidade.”

Repercussões

Para além de um aumento da monitorização, Jinhua e sua equipa estão certos de que é preciso desenvolver uma vacina contra o G4 tanto para porcos, quanto para humanos. Isto, uma vez que somente o abate do gado suíno infetado, medida comum em casos semelhantes, não seria o suficiente, já que o vírus consegue infetar humanos.

Um porta-voz da Organização Mundial da Saúde (WHO) comunicou que o estudo será lido cuidadosamente para entender a situação. “Sabe-se que o vírus da Gripe Suína da Eurásia está a circular na população suína da Ásia e é capaz de infetar seres humanos esporadicamente. Duas vezes por ano, durante as reuniões de composição da vacina contra a gripe, todas as informações sobre o vírus [influenza] são analisadas e é discutida a necessidade de novos vírus candidatos a vacinas”, acrescenta.

Especialistas defendem que as vacinas devem ser adaptadas antes mesmo da possibilidade de um surto entre pessoas. “Precisamos de estar vigilantes a ameaças de novas doenças infecciosas, mesmo durante este momento de COVID-19, pois os vírus não têm interesse em saber se já estamos a ter outra pandemia”, completa a bióloga Martha Nelson.

Nesta quarta-feira, em comunicado, a China minimizou o perigo de uma nova pandemia a partir da propagação do vírus G4. Zhao Lijian, porta-voz da diplomacia chinesa, afirmou que “os especialistas concluíram que o tamanho da amostra citada no relatório é pequeno e não é representativo”, e ainda garantiu que o país continuará a monitorizar a doença. A China “dará o alerta se for necessário e irá tratá-la a tempo”, informa Lijian.

 

Artigo elaborado por Giovanna Vernacci Moreno.

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