Artigo de Opinião

Mais do que ciência

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A suspensão da vacina da AstraZeneca não é um problema científico, mas uma guerra política. Há dezoito países que preferem alimentar a desinformação e o negacionismo a vacinar com base em evidências e sensatez.

A decisão de Portugal é uma decisão de arrasto (como já é habitual) e de pânico injustificado. A análise e a contextualização dos números foi preterida em favor dos joguinhos de xadrez de Bruxelas, que podem acabar mal. Suspender a vacina da AstraZeneca é um momento de ouro para alargar os mares que separam a União Europeia do Reino Unido, criar falso ceticismo em relação a esta vacina e, quem sabe, até travar as exportações. Criticamos os conspiracionistas, mas estávamos ansiosos por nos precipitarmos para rápidas conclusões e medos injustificados.

António Costa diz que a vacina é segura. Quem se junta é o coordenador do plano de vacinação contra a Covid-19, o vice-almirante Gouveia e Melo, que também afirma que esta é apenas uma pausa curta. Nem é uma suspensão, é apenas uma pausa. Estamos a vacinar a um ritmo tão alucinante que não sofremos de tromboembolismo, mas sim de falta de ar e precisamos de nos sentar um bocadinho a descansar.

A análise e a contextualização dos números foi preterida em favor dos joguinhos de xadrez de Bruxelas, que podem acabar mal.

Depois de 10 milhões de vacinas administradas, a AstraZeneca reportou 28 episódios de formação de coágulos. Já a Pfizer, depois de 11 milhões de vacinas administradas, registou 25 casos do mesmo problema. Vacina do Reino Unido? Hm, vamos pensar… Vacina das Américas? Perfeito, levo já onze!

Segundo números mais recentes, avançados pela AstraZeneca, em mais de 17 milhões de pessoas inoculadas houve 15 episódios de trombose venosa profunda e 22 casos de embolia pulmonar.

Tanto a Agência Europeia do Medicamento como a Organização Mundial de Saúde já reforçaram a confiança nesta vacina. A OMS avançou até que não há evidências científicas que liguem os incidentes à vacina. Contudo, se a Agência Europeia do Medicamento decidisse interromper a vacinação por graves problemas, não existiria igualmente motivo para alarme. Muito pelo contrário, tal decisão apenas serviria para aumentarmos a confiança nas entidades reguladoras.

A quem tiver uma dose ou duas da vacina da AstraZeneca, liguem-me à vontade que tenho um braço livre.

Segundo os dados, em média, são registados incidentes em 0,23 pessoas por cada 100 mil vacinados. Em Portugal, morrem 166 pessoas por COVID-19 por cada 100 mil habitantes. Os potenciais benefícios de suspender a vacinação são menores do que as vantagens de continuar e assim conseguir evitar mortes e casos mais graves da COVID-19. Ou seja, é mais provável ir parar ao hospital por causa da COVID-19 do que por causa da vacina. Em milhões de pessoas vacinadas, é normal que os incidentes continuem a existir e os números mostram que esse número de casos não está a ser exponenciado pela vacina. A vacina não faz com que as pessoas deixem de sofrer de todos os outros problemas de saúde, nem os passa a causar. Como dizia um artigo do Washington Post, correlação não significa causa.

A quem tiver uma dose ou duas da vacina da AstraZeneca, liguem-me à vontade que tenho um braço livre.

 

Artigo da autoria de João Paulo Amorim.

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