Ciência e Saúde
Extremófilos
É fácil considerarmos a Terra o local ideal para a vida, com temperaturas agradáveis, proteção contra radiações perigosas do Sol, humidade e pressão atmosférica excelentes. No entanto, nem todos os recantos da Terra mantêm estas condições ótimas para a vida humana: o fundo do oceano é escuro e a pressão elevada, os polos são frios e os desertos demasiado áridos. Porém, são precisamente estes os locais que os extremófilos habitam.
A palavra extremófilo tem as suas raízes no latim, e significa “adorar o extremo”. Desde a sua descoberta em 1969, a gradual compreensão destes seres tão diferentes de nós tem vindo a ampliar a própria definição de vida.
Que tipos de extremófilos existem?
Os extremófilos classificam-se de acordo com a condição extrema na qual prosperam. Como tal, os termófilos são os vivem a elevadas temperaturas, muitas vezes acima dos 80ºC, enquanto os psicrófilos preferem temperaturas muito baixas, até mesmo abaixo do ponto de solidificação da água. Aqueles que conseguem viver a valores de pH muito baixos ou muito altos, são os acidófilos e alcalinófilos, respetivamente. Existem ainda os barófilos, que suportam pressões de cerca de mil atmosferas, e os halófilos, que vivem com concentrações de sais muito elevadas.
Alguns extremófilos são capazes de enfrentar várias condições extremas ao mesmo tempo – por exemplo, temperatura e pressão elevadas – sendo, por isso, chamados de poli-extremófilos. São estes que têm o maior interesse para a astrobiologia – uma área que se dedica ao estudo da origem da vida e da possibilidade de vida noutros planetas – por serem os modelos que mais se podem assemelhar a formas de vida extraterrestre.
Todos os extremófilos são microrganismos?
A vida na Terra divide-se em três domínios: Bacteria, Archaea e Eukaria, sendo neste último que se inserem todos os mamíferos, incluindo os seres humanos. Apesar de existirem extremófilos em todos os domínios, a maioria são bactérias e arqueia e, portanto, microrganismos.
Por outro lado, no domínio Eukaria existem simultaneamente extremófilos que não são microrganismos – como algumas algas e fungos – e microrganismos – os protozoários. Dentro deste grupo, destacam-se os tardígrados, conhecidos por serem os animais mais resistentes do planeta. Em 2007, a Agência Espacial Europeia lançou uma cápsula com vários tardígrados a bordo para a órbita da Terra. Quando regressaram, após dez dias no vácuo do espaço, expostos à radiação cósmica e à radiação ultravioleta do Sol, a maioria estavam vivos, tornando-se assim os primeiros animais a sobreviver no vácuo do espaço.
Como é que conseguem sobreviver nessas condições?
Os extremófilos possuem várias adaptações fisiológicas que lhes permitem viver em condições severas. Para além de produzirem proteínas e compostos orgânicos diferentes dos nossos, a composição e estrutura da própria membrana das suas células é diferente. Alguns são ainda capazes de entrar num estado de dormência, denominado de criptobiose, em que toda a sua atividade metabólica – desde movimentação, digestão e até mesmo respiração – se reduz ao mínimo. Os tardígrados, por exemplo, conseguem sobreviver durante décadas, sem água, ao adotarem este estado próximo da morte.
Porque são importantes?
Algumas das moléculas que os extremófilos produzem para sobreviver em ambientes extremos podem ser usadas para aplicações comuns, como tratamentos médicos, fermentação de alimentos, produção de biocombustíveis e até mesmo na indústria cosmética.
No entanto, um dos campos que mais beneficia dos extremófilos é a astrobiologia. Como estes vivem em condições tão diferentes da realidade que presenciamos diariamente na Terra, constituem os melhores modelos para estudar potencial vida extraterrestre. Estudar extremófilos na Terra, quer através de simulações laboratoriais, quer por análogos de campo, ajuda a entender que formas a vida poderia tomar em planetas e luas, quer no Sistema Solar, quer fora dele.
Em Portugal, temos alguns locais ideais para estudos de campo, como as grutas das Ilhas Selvagens, as fontes hidrotermais subaquáticas dos Açores e as águas ácidas da Mina de São Domingos, que servem como análogos para climas de outros planetas, constituindo uma abordagem mais acessível do que a exploração espacial.
A descoberta e compreensão dos extremófilos, acima de tudo, leva a reconhecer que, planetas que se pensavam ser incompatíveis com a vida, talvez possam ser uma fonte próspera dela. Afinal, quem teria imaginado que organismos pudessem viver comodamente no gelo do Ártico, no deserto do Saara, nos abismos dos vulcões subaquáticos e até mesmos nos derrames radioativos de instalações nucleares?
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Texto por Isabel Sousa. Revisto por Diana Cunha e Joana Silva.