Ciência e Saúde
Células estaminais
Células estaminais são capazes de originar os diferentes tipos de células especializadas que constituem o corpo humano.
O corpo humano é constituído por vários tipos de células, responsáveis pelas funções que sustentam a vida. Os cardiomiócitos, no coração, permitem a sua contração; os neurónios, no cérebro, são responsáveis pela transmissão dos impulsos nervosos; os queratinócitos, na pele, garantem a proteção e integridade do corpo, entre outras. Cada tipo celular é, assim, especializado na execução de determinadas tarefas.
No século XIX, dois cientistas – Theodor Schwann e Matthias Schleiden– propuseram a “Teoria Celular”. Apesar de aparentemente simples, esta teoria defende três ideias que definiram as bases para a compreensão do funcionamento das células:
- Todos os organismos são compostos por uma ou mais células;
- A célula é a estrutura básica e funcional da vida;
- Todas as células são originadas a partir de células pré-existentes.
Neste contexto, é fácil entender que as células especializadas que existem no organismo têm origem noutras células que existiam previamente.
É neste contexto que surgem as células estaminais que, para além de conseguirem autorrenovar-se e formar células iguais a elas mesmas, conseguem ainda diferenciar-se em células especializadas. O processo de diferenciação de todas as células está relacionado com alterações na informação genética das células, o ADN.
O ADN é como um livro; a célula estaminal mais indiferenciada – o zigoto, que origina todas as outras de um organismo – é um livro em que todas as páginas podem ser lidas. Cada vez que se diferencia, alguns dos capítulos – os genes – são bloqueados, e a sua leitura passa a ser impossível. Assim, uma célula especializada é aquela em que apenas alguns capítulos – aqueles que são necessários para a sua função no órgão em que está – conseguem ser lidos.
Que tipos de células estaminais existem?
A classificação das diferentes células estaminais é feita de acordo com a sua capacidade de diferenciação. As células totipotentes possuem um maior potencial de diferenciação, sendo capazes de se dividir em todas as células do corpo, bem como as dos tecidos extraembrionários, como da placenta e do cordão umbilical.
De seguida, numa escala decrescente de potencial de diferenciação, encontram-se as células estaminais pluripotentes, que originam todas as células do corpo. Existem dois tipos de células pluripotentes: as embrionárias – que, tal como o nome indica, existem apenas no embrião – e as induzidas, produzidas em laboratório.
Finalmente, existem as células estaminais multipotentes, que se conseguem diferenciar apenas em alguns tipos de células, e as unipotentes, que originam apenas um tipo. Tanto as multipotentes como as unipotentes existem no corpo humano adulto, desempenhando um papel fundamental na renovação dos tecidos e reparação de danos.
Um exemplo são as células estaminais hematopoiéticas, que, sendo multipotentes, originam todas as células do sangue – como os glóbulos brancos e vermelhos, e fazem com que seja possível doar sangue e voltar a recuperar o volume perdido. Outro exemplo são as espermatogónias, que se dividem apenas em espermatozóides, pelo que são unipotentes.
Porque é importante estudar células estaminais?
As células estaminais são muito investigadas para aplicações em medicina regenerativa, nomeadamente para tratar doenças degenerativas, crónicas e lesões graves. Atualmente, na União Europeia, está aprovada uma terapia com células estaminais – Holoclar, para tratar uma doença rara da córnea, a camada invisível de células que está à frente da íris do olho. Cerca de 1,5 milhões de pessoas receberam já transplantes de células estaminais hematopoiéticas, nomeadamente para tratamento de leucemias.
Para além do tratamento de doenças, o estudo das células estaminais permite perceber vários processos intrínsecos ao envelhecimento e desenvolvimento humano, como a formação dos órgãos.
Há problemas éticos associados?
O uso de células estaminais para investigação tem sido alvo de vários debates pela comunidade científica e pelo público. Em teoria, o potencial ilimitado das células estaminais pode ser usado para clonagem de humanos. Para além disso, a fonte das células estaminais embrionárias leva a que várias pessoas se oponham ao seu uso, argumentando que a destruição do blastocisto humano – uma das primeiras fases do desenvolvimento embrionário – não é ética.
As células estaminais têm um potencial inestimável para o avanço científico, nomeadamente no tratamento de diversas doenças. Contudo, o seu uso requer cautela, exigindo uma implementação rigorosa de legislação, de forma a garantir a integridade ética e segurança do seu uso.
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Texto por Isabel Sousa. Revisto por Diana Cunha.