Ciência e Saúde
A dieta vegan é mais saudável?
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Uma dieta vegan equilibrada reduz o risco de cancro e diabetes, protege o planeta e evita a crueldade animal. Será esta a alimentação do futuro? Descubra os benefícios e desafios.
O final de mais um veganuary, um desafio anual que, durante o mês de janeiro, encoraja os participantes a seguir uma dieta vegan, dá lugar à pergunta: a dieta vegan realmente apresenta benefícios para a saúde?
Atualmente, há um aumento mundial da população vegan, vegetariana ou que, simplesmente, reduz o consumo de carne e peixe. Em resposta a esta tendência, várias organizações dedicadas à saúde têm estimulado a pesquisa científica nesta área, a fim de perceber se, efetivamente, estas dietas trazem benefícios para a saúde.
Dieta vegan e vegetariana: qual a diferença?
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), a dieta vegan exclui o consumo de todos os produtos de origem animal. Isto inclui não só a carne, peixe e crustáceos, como ovos, laticínios, entre outros.
Por outro lado, a dieta vegetariana exclui o consumo de apenas alguns tipos de produtos animais. Por exemplo, a dieta lacto-vegetariana omite o consumo de carne, peixe e ovos, mas inclui o consumo de laticínios. Já a dieta ovo-vegetariana exclui o consumo de carne, peixe e laticínios, mas inclui o consumo de ovos. Outro exemplo é a dieta pesco-vegetariana, que inclui o consumo de peixe, ovos e laticínios, excluindo apenas a carne.
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Esquema representativo dos principais alimentos incluídos em alguns tipos de dietas vegan e vegetarianas.
Quais são os benefícios para a saúde?
Vários estudos têm destacado os benefícios na saúde que uma dieta vegan equilibrada pode trazer. Indivíduos que seguem uma dieta vegan ou vegetariana têm menor risco de desenvolver qualquer tipo de cancro e diabetes. Estas dietas estão igualmente associadas a uma proteção contra doenças cardiovasculares, renais e mortalidade causada por doenças.
Pelo contrário, as carnes processadas – como o fiambre, salsicha, molhos à base de carne ou qualquer carne processada por salga, cura, fumagem e fermentação – são carcinogénicas. De acordo com a OMS, consumir 50 gramas de carne processada por dia aumenta o risco de desenvolver cancro colorretal em 18%.
As carnes vermelhas não ficam também fora do panorama, sendo consideradas como provavelmente carcinogénicas. Isto significa que existe evidência científica que relaciona o seu consumo ao aumento da probabilidade de desenvolver cancro, mas não é tão forte como a que existe, por exemplo, para as carnes processadas. A OMS indica que, caso esta relação seja verdadeira, consumir 100 gramas de carne vermelha por dia, aproximadamente equivalente ao tamanho de um baralho de cartas, aumenta o risco de desenvolver cancro colorretal em 17%.
Perante esta realidade, várias entidades científicas internacionais tomaram a posição pública de defender a dieta vegan como sendo apropriada para todas as idades, desde a infância, adolescência, gravidez e amamentação. Estas entidades incluem a OMS, a American Academy of Nutrition and Dietetics, a British National Heath Service e a Canadian Pediatric Society.
Em Portugal, a Direção Geral da Saúde defende que “dietas vegetarianas, quando apropriadamente planeadas, incluindo as ovo-lacto-vegetarianas ou veganas, são saudáveis e nutricionalmente adequadas em todas as fases do ciclo de vida, podendo ser úteis na prevenção e tratamento de certas doenças crónicas”.

De acordo com a OMS, todos os anos, cerca de 34 mil mortes por cancro são causadas por dietas ricas em carnes processadas.
A dieta vegan permite obter todos os nutrientes necessários?
Atualmente, com uma dieta vegan ou vegetariana equilibrada e bem planeada, é possível obter todos os nutrientes necessários, dentro dos níveis recomendados. No entanto, alguns micronutrientes existem em quantidades menores em fontes vegetais, ou então estão menos biodisponíveis – o que significa que não conseguem ser tão bem absorvidos.
Um dos exemplos mais pragmáticos é a vitamina B12. Esta vitamina é encontrada apenas em alimentos de origem animal – como os laticínios, os ovos, a carne e o peixe. Assim, indivíduos que sigam uma dieta vegan podem incluir alimentos que sejam fortificados em vitamina B12, como bebidas vegetais e cereais. Adicionalmente, a sua suplementação pode ser recomendada.
De uma forma geral, os nutrientes aos quais se deve ter especial atenção nas dietas de base vegetal são vitaminas B2, iodo, zinco, cálcio e selénio. Ainda que estes possam ser obtidos a partir de fontes vegetais, a inclusão de alimentos variados é chave para assegurar a toma dentro dos níveis adequados.
Por estes motivos, para garantir que uma dieta vegan ou vegetariana é completa e saudável, é fundamental que os indivíduos estejam bem informados. Neste sentido, a Direção Geral da Saúde (DGS) disponibiliza documentos informativos sobre cuidados a ter para uma alimentação vegetariana saudável na idade adulta e em idade escolar.
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A vitamina D é essencial em qualquer dieta, incluindo a vegan. A DGS recomenda a sua suplementação em crianças com menos de 12 meses, podendo ser necessária também para adultos.
Porquê ser vegan?
Para além dos benefícios que a dieta vegan tem para a saúde, existem outros motivos que levam à adoção deste estilo de vida.
Uma das razões está relacionada com a sustentabilidade das dietas de base vegetal. Estima-se que uma dieta à base de carne polua até três vezes mais do que a dieta vegan. Atualmente, os animais de pecuária consomem um terço da água potável do mundo e contribuem para a emissão de 14% dos gases de efeito de estufa. Esta percentagem é superior à das emissões de todos os carros. Para além disto, 36% das calorias de todos os cereais produzidos são utilizados para alimentar animais de pecuária, das quais apenas uma fração chega aos produtos finais – como a carne, leite e ovos – que são consumidos pelos humanos.
Outro motivo são as perspetivas éticas pessoais. Alguns indivíduos defendem que a exploração, comercialização e morte de animais não é justificável quando existem alternativas alimentares ao alcance de cada um. A título de exemplo, é aceite que porcos têm autoconsciência, criatividade e complexidade emocional, de forma semelhante aos cães. No entanto, estes e outros animais são sujeitos durante toda a vida a práticas desumanas até à sua morte.
Este motivo está intrinsecamente relacionado com a saúde pública. A criação de animais em cativeiro é responsável pelo uso de 50% dos antibióticos produzidos em todo o mundo. Isto contribui para o aumento da resistência antimicrobiana, um problema que ameaça a eficácia dos tratamentos médicos e coloca em risco a vida de milhões de pessoas. Para além disso, a pecuária intensiva está associada à propagação de doenças como o COVID-19 e a Gripe das Aves.
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Em Portugal, 257 milhões de animais foram mortos em 2018. Isto corresponde a 25 vezes a população do país. Créditos: Farm Sanctuary, flickr
É certo que a dieta vegan, por vários motivos sociais, económicos e individuais pode não estar ao alcance de todos. No entanto, para a maioria da população portuguesa, a redução do consumo de carne poderá trazer benefícios para a saúde, ajudar a garantir a saúde pública e a integridade ambiental para as gerações futuras.
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Texto por Isabel S. Sousa. Revisto por Ana Luísa Silva.
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