Ciência e Saúde
Microplásticos no corpo humano
Estudos recentes confirmam a presença de microplásticos em vários órgãos do corpo e até na placenta. Deste modo, a comunidade científica tem vindo a tentar compreender quais os impactos a longo prazo e quais as possíveis estratégias a adotar, de modo a mitigar a exposição humana.
Plástico: definição
Do grego “plastikós”, a palavra “plástico” significa “aquilo que pode ser modelado”. Deste modo, este termo refere-se a uma diversificada gama de compostos sintéticos ou semi-sintéticos que são produzidos por reações de polimerização ou de condensação, sendo, por isso, constituídos por polietileno, PVC ou nylon.
O que são os microplásticos e qual a sua origem?
Os microplásticos são partículas de plástico de dimensões inferiores a 5mm. Estes podem ser subdivididos em duas categorias, dependendo da sua origem:
- Microplásticos primários: Representando entre 15 a 31% dos microplásticos existentes nos oceanos, estes são libertados diretamente para o ambiente já na forma de pequenas partículas. As suas principais origens relacionam-se com a lavagem de roupas sintéticas, os produtos cosméticos (como microesferas adicionadas em esfoliantes faciais) e o desgaste dos pneus dos veículos.
- Microplásticos secundários: Estes representam cerca de 69 a 81% dos microplásticos encontrados nos oceanos e a sua origem relaciona-se com a degradação de resíduos de plásticos de maiores dimensões (ex: sacos e garrafas de plástico).
Assim, estes plásticos de pequenas dimensões podem entrar no corpo humano através da ingestão de alimentos, água e outras bebidas e inalação de ar contaminado.
Os efeitos dos microplásticos no corpo humano
Fonte: Antagonista
Ao longo dos anos, estudos que têm como foco microplásticos mostram que estes componentes podem ser encontrados em todos os órgãos do nosso corpo. Além disso, estas micropartículas podem ser a causa do aumento de doenças inflamatórias intestinais, cancro do cólon e diminuição da contagem de esperma.
Segundo um estudo, publicado em maio de 2024, pela revista Toxicological Sciences, foram identificados microplásticos acumulados nas 62 amostras de placentas humanas alvo de estudo, situação que pode pôr em causa a saúde dos fetos em desenvolvimento. O polietileno foi o polímero mais frequente, representando 54% dos plásticos detetados nas amostras. Os possíveis danos que estes possam ter na saúde humana ainda estão a ser investigados. Porém, as primeiras experiências desenvolvidas em ratos, mostram que estas partículas podem interromper o desenvolvimento cerebral do feto, o que pode levar a um défice no desenvolvimento neurológico.
Partindo desta preocupação, no que toca aos possíveis danos que os microplásticos poderão ter no cérebro, foi realizado um estudo, publicado na Nature Medicine, a 3 de fevereiro deste ano (2025). Nesta pesquisa, o principal autor do estudo, Matthew Campen, analisou ao longo de oito anos (desde 2016 até 2024) os cérebros de indivíduos falecidos. O investigador registou um aumento nas concentrações de microplásticos nos cérebros analisados em 2024 quando comparados com os de 2016. “Isso ocorre simplesmente porque estamos mais expostos”, explicou Matthew. Para além disso, estas partículas foram detetadas entre três a cinco vezes mais em pessoas diagnosticadas com demência, antes do seu falecimento, sendo que na maioria dos casos, os microplásticos foram encontrados nas paredes das artérias e veias do cérebro, bem como nas suas células imunológicas.
Ademais, a crescente concentração de microplásticos nos tecidos humanos pode estar diretamente associado ao aumento de alguns problemas de saúde como o cancro do cólon e a doença inflamatória intestinal. Um estudo realizado pela Universidade de Nanjing (na China), em 2021, que se baseou na análise de amostras de um grupo de 102 pessoas, 52 com Doença Inflamatória Intestinal (DII) e, as restante 50, pessoas saudáveis, concluiu que os indivíduos com a doença apresentam cerca de 50% mais de microplásticos nas suas fezes. Os investigadores acrescentam ainda que existe uma possível ligação entre a exposição dos doentes a estas partículas e o seu estágio da doença (uma vez que concentrações mais altas foram encontradas em indivíduos com DII mais grave).
Num outro estudo norte-americano, publicado na revista Toxicological Sciences, cientistas analisaram testículos humanos e caninos e concluíram que todos continham microplásticos. De acordo com a experiência realizada, a concentração destas partículas nas amostras humanas foi de 330 microgramas por cada grama de tecido, quase três vezes mais do que a concentração contabilizada nos cães. É importante salientar que estes microplásticos interferem com o processo de produção de espermatozoides, a espermatogénese, e podem também prejudicar a produção e circulação de mensageiros químicos, como hormonas, que regulam o funcionamento dos órgãos.
O que fazer para reduzir a exposição aos microplásticos?
Embora seja difícil evitar por completo a exposição aos microplásticos, uma vez que a sua presença é generalizada em todo o tipo de ambiente, existem alguns cuidados e medidas a tomar de modo a reduzir a sua presença e reduzir os seus potenciais riscos à saúde.
Beber água da torneira
Segundo um estudo publicado na revista científica Proceedings of National Academy of Sciences, um litro de água engarrafada contém cerca de 240 mil micropartículas de plástico. Assim, reduzir o consumo da água engarrafada e optar pelo consumo de água da torneira filtrada pode ajudar a reduzir significativamente a ingestão de microplásticos.
Evitar alimentos altamente processados
Os alimentos altamente processados contêm quantidades de microplásticos muito superiores em comparação com os minimamente processados. Um estudo encontrou microplásticos em todos os 16 produtos processados de origem proteica analisados.
Evitar calor em recipientes de plástico
De acordo com um estudo da Universidade de Nebraska (EUA), em apenas três minutos de aquecimento de alimentos no micro-ondas, por centímetro quadrado de área plástica de recipiente, libertavam-se cerca de quatro milhões de microplásticos e dois mil milhões de nanoplásticos.
A presença de microplásticos no corpo humano é incontornável, resultado da constante exposição a esse tipo de partículas através da alimentação, ar e água. As diversas pesquisas realizadas neste tópico demonstram que estas partículas já se acumulam em órgãos vitais e podem estar associadas à origem ou agravamento de várias doenças. Ainda que os impactos a longo prazo não sejam objetivamente conhecidos, a tendência aponta para potenciais riscos graves à saúde. Deste modo, investigadores reforçam a necessidade de adotar estratégias para reduzir a exposição diária a estas partículas.
Texto por Beatriz Novais Ferreira. Revisão por Joana Margarida da Silva.