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Ciência e Saúde

Resíduo Alimentar Contribui para o Desenvolvimento de Novos Fármacos

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Durante a colheita da castanha de caju, o líquido que se encontra na sua casca é descartado e considerado resíduo alimentar. No entanto, tal como o fruto, este conteúdo líquido que o rodeia também possui a chamada “boa gordura” e acarreta propriedades igualmente benéficas para a saúde do ser humano.

Face ao facto de ser uma fonte de lípidos não aproveitada,  investigadores da Faculdade de Farmácia da Universidade de Toronto, no Canadá e da Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade de Brasília, no Brasil, publicaram um artigo denominado “Phenolic Lipids Derived from Cashew Nut Shell Liquid to Treat Metabolic Diseases” (em português, Derivados de Lípidos Fenólicos da Casca da Castanha de Caju para o Tratamento de Doenças Metabólicas). Neste estudo, foi reportado que o líquido presente na casca de castanha de caju tem como alvo recetores nucleares, sendo que apresenta uma alta especificidade em relação aos recetores prolifero-ativados do peroxissoma (PPARs), de forma a manter a homeostase da glucose e a regulação do metabolismo dos lípidos. Esta descoberta é bastante promissora para a criação de um tratamento de doenças metabólicas, como a obesidade ou diabetes, que seja mais sustentável.

Os PPARs são recetores nucleares que atuam como fatores de transcrição na regulação metabólica, ou seja, certos lípidos participam na regulação de processos metabólicos através da ligação aos recetores e consequente ativação destes PPARs. Os fármacos, que foram criados anteriormente com a finalidade de atuar nos PPARs têm diversos efeitos secundários graves, uma vez que era necessária uma alta potência de fármaco para ativar o PPAR. Devido a esta desvantagem, estes medicamentos foram descontinuados.

Tendo em conta a necessidade de desenvolver novos fármacos que atuassem na PPAR, o químico medicinal Luiz Romeiro da Universidade de Brasília, considerou o conteúdo descartado da castanha de caju como um potencial agente terapêutico. Com isto, o químico, juntamente com a sua equipa, começou a colaborar com a equipa de investigadores da Universidade de Toronto liderada por Carolyn Cummins. O objetivo seria determinar se o líquido presente na casca do caju, que é considerado um resíduo alimentar, seria capaz de ter o PPAR como alvo e se seria possível desenvolver um novo fármaco como menos efeitos secundários severos.

Para isso, as equipas de investigação procederam a uma triagem de uma biblioteca de moléculas derivadas do cardanol e do ácido anacárdico, isto é, dos dois componentes principais do líquido presente na casca da castanha de caju, e encontraram derivados capazes de atuar como agonistas de PPAR, onde este recetor era o alvo parcial e, em alguns casos, até mesmo total.

Com esta descoberta, iniciaram-se os testes in vivo, tendo sido descoberto o LDT409, um derivado fenólico que ativa o PPAR no cérebro. Concluiu-se, através da cromatografia líquida e da espectroscopia de massa, que ao fornecer uma dose diária do LDT409 a um rato, uma determinada concentração desse composto mantinha-se constante na corrente sanguínea, contribuindo assim para a eficácia do fármaco.

Segundo Carolyn Cummins, “O LDT409 pode ser útil como um potencial agente terapêutico em doenças metabólicas que afetam mais países de baixo e médio rendimento do que os Estados Unidos ou o Canadá, mas o facto de ser produzido no Brasil e ser possível a sua extração e formulação, eu penso que é ótimo.”.

Além desta descoberta promissora, Luiz Romeiro referiu que “Este primeiro artigo é apenas a ponto do iceberg porque há uma grande quantidade de informação que ainda estamos a estudar.”. Como há suspeita de que este derivado fenólico seja capaz de ativar outros recetores, a identificação de novos alvos encontra-se nas perspetivas futuras desta equipa.

Texto por Joana Silva. Revisto por Maria Teresa Martins.

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