Cultura

DA NOSTALGIA DE BRIAN WILSON À PERSISTÊNCIA DE KIASMOS

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A tarde começou com White Haus, às 17 horas, que, juntamente com Cass McCombs, foi aquecendo um recinto que precisava de estar preparado para a grande noite que se avizinhava. Sentados na relva ou de pé, os festivaleiros iam batendo o pé e baloiçando o corpo; as palmas e assobios revelavam que estava mais gente do que no primeiro dia. Pouco antes das 18:50 a multidão dirige-se para o Palco Super Bock, pronta para assistir ao concerto dos Destroyer. Das suas músicas vão surgindo danças mais lentas ou mais rápidos, arabescos desenhados no ar com os braços. Com a ajuda dos instrumentos de sopro convencem-nos de que estamos na primavera, com melodias que nos fazem respirar sol, flores e descontração.

O Palco. foi recebendo Mueran Humanos, BEAK> e Dinosaur Jr., mas a espera por Brian Wilson fez com que escolhas entre palcos tivessem que ser feitas. Alguns fãs sentados no chão a guardar lugar, outros de pé na ânsia de estar perante uma lenda viva. Os Beach Boys revolucionaram da música nos anos 60 e toda a gente sabia disso. Estávamos perante um ídolo dos nossos avós, dos nossos pais e agora nosso. Alguém cuja música atravessou gerações, provando ao Mundo a importância que teve na história. Com “I Get Around” e “Surf in USA” animou a plateia, com “Wouldn’t it Be Nice” e “God Only Knows” emocionou os mais sensíveis, que foram trocando abraços e olhares cúmplices. Vai partilhando memórias de uma vida, como o facto de ter escrito “Surfer Girl” com apenas 19 anos e as suas inspirações para certos êxitos que tocavam vezes sem conta nas jukeboxes. Ao longo do espetáculo vai fazendo movimentos que acompanham os instrumentos, como se conhecesse aquelas canções desde sempre. E conhece. Despede-se com “Good Vibrations”, criando uma euforia geral no Parque. No fim o público fica estático; como se não soubesse reagir à viagem que fez a tempos em que nem sequer viveu, à nostalgia que sentia sem saber bem porquê e à emoção de ter estado a dançar músicas que foram a banda sonora de tantos romances, de tantos Verões, de tantas vidas.

A indecisão entre a escolha de palcos continuava e, depois de um momento como o de Brian Wilson, as expectativas estavam altíssimas. Entre Savages e Empress Of as escolhas estavam mais inclinadas para o lado das britânicas que já são adoradas pelos portugueses. A presença de Jehnny Beth, a vocalista, encheu o vazio da noite. Na primeira fila todos vibram com “City’s Full”, deixando que a música perfure as suas almas. A entrega de Savages ao público do Primavera Sound culmina com o crowdsurf de Beth enquanto canta “Hit Me”. Deixam os que ali estão presentes (ainda mais) rendidos a si e com vontade de voar para a próxima vez em que as voltarão a ver. Enquanto Savages angariavam fãs sem se aperceber, os Floating Points provavam que nem sempre os concertos mais aclamados são os mais importantes. Sem focos de luz apontados para si, num anfiteatro iluminado apenas pelas estrelas, vão brincando com a música enquanto são projetadas formas geométricas em verde néon, que criam ilusão óticas e quase permitem uma experiência de hipnose.

PJ Harvey e Freddie Gibbs começavam a tocar quase à mesma hora, não tivesse o concerto do rapper americano sido cancelado. A vontade de reviver o post-grunge britânico parecia vencer e até aqueles que esperavam ouvir hip-hop se renderam. A cantora fez-se acompanhar de uma banda que entrou à sua frente, como se de uma orquestra se tratasse, a antecipar a sua chegada triunfal. Os adjetivos entre o público dividiam-se entre “ninfa” e “deusa do rock”, a que PJ fazia juz com o adereço que trazia na sua cabeça. De saxofone na mão e dona de si, encantou portugueses e estrangeiros com êxitos da sua carreira e músicas do novo álbum, “The Hope Six Demolition Project”. Foi considerado por muitos o melhor concerto do Primavera até então.

Uma das grandes surpresas da noite avizinhava-se. O palco Super Bock foi-se enchendo aos poucos para o concerto do duo islandês “Kiasmos”, fosse por admiração do seu trabalho ou apenas por curiosidade. O palco enche-se de fumo que cria o suspense da sua entrada e, assim que começam a tocar, põe um mar de gente a dançar. Uma falha repentina no som pára a música e as projeções; os artistas saem e todos ficam triste, chateados e à espera que este voltem. Voltam cheios de energia, incentivam o público a dançar, até que mais uma falha no som acontece. Ólafur Arnaldo e Janus Rasmussen abandonam o palco e, após dez minutos, sem dar sinal da sua presença voltam para uma terceira tentativa. Desiludidos com a falha técnica, mas acima de tudo de coração cheio por toda a gente ter esperado para os ver. Com efeitos de luzes semelhantes aos dos Ratatat, Kiasmos encantaram um público que dançou como se não houvesse amanhã.

Foi a sensibilidade dos Beach House que encerrou o palco NOS. As notas musicais que saíam do teclado de Victoria Legrand penetravam o relvado, as lágrimas dos fãs juntavam-se a eles, e juntos marcavam um território que agora também lhes pertence. Com o tema “Days of Candy” a vocalista pede “Nunca percam a vossa sensibilidade”, o seu carapuço cai e a harmonia entre a guitarra e o teclado dizem “até já” a um público que os ama.

A noite continuou no palco Pitchfork com Roosevelt, que quase arrastava para lá quem vinha do sentimentalismo de Beach House, qual flautista de Hamelin. A dança continuou até às seis da manhã com Black Madonna, que entre música eletrônica foi fazendo analogias ao passado com êxitos que encerravam com chave de ouro um dia intenso, carregado de nostalgia e emoção.

O festival despede-se hoje com Air, Ty Segall and The Muggers e Moderat.

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