Cultura

KEELY DENHAM: “O MEDO ESTÁ SEMPRE PRESENTE”

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Com a intimidade do seu estilo conversacional e uma paixão pelo universo da música folk, Keely Denham oferece, pela sua voz doce, vida musical às imagens e vivências que traz na sua bagagem.

A jovem cantautora australiana lançou em 2016 o seu EP chamado Pocket Sounds que pode ser ouvido na sua página do Bandcamp -, e percorreu alguma da Europa durante o presente ano a divulga-lo: Espanha, França, Reino Unido, Finlândia, Estónia e Alemanha foram alguns dos países por onde a artista passou, tocando na rua e vendendo o seu disco independentemente.

Agora, hospedada no Porto, Keely diz que procura viver na cidade, com maior estabilidade, a longo prazo. Diariamente, ocupa as suas tardes na Ribeira, um lugar pela qual se apaixonou. Em conversa com o JUP, Keely Denham contou algumas das experiências que mais moldaram o seu ano, e referiu como tem sido o processo de, aos poucos, se dar a conhecer através da sua música.

“A barreira da linguagem”, referiu nos primeiros minutos, “pode ser sempre um bocado assustadora”. Keely sublinha até que, nos primeiros momentos da sua estadia na Ribeira, o facto de cantar em inglês levantou algumas inseguranças. “Tinha algum medo que se porventura algumas pessoas percebessem menos bem o que estava para lá a dizer, dar-me-iam pouca importância”.

Mas a artista ficou contente por ver o quanto a arte a ajudou nesses termos. “Acho que a Austrália tem uma espécie de pensamento secular quanto a isto, mas… crescendo habituada à língua inglesa e como que rodeada da cultura pop americana, foi necessária a música para deitar abaixo algumas dessas barreiras. E só o facto de viajar também tornou essa tarefa muito mais facilitada. Fiquei mesmo muito surpreendida com o modo como as pessoas se relacionam com aquilo que estão a ouvir, quer percebam o que é dito ou não. Elas ficam mesmo entusiasmadas com a músicas, o que é excelente”.

Keely reconhece a importância que o “passa-a-palavra” tem tido em chegar a uma maior audiência – especialmente na fase da carreira em que está. Teve até, quanto a este tópico, elogios a tecer à comunidade portuense: “pela minha experiência, as pessoas de Portugal e Berlim têm sido as mais estimulantes e gratificantes no seu feedback”.

Muitos ouvintes podem encontrar no EP influências de artistas significativos tais como Joni Mitchell, tal é o estilo narrativo que define muitas das letras de Keely – como se estivesse a contar histórias. Isto é, de resto, algo que corrobora. “A minha mãe é obcecada pela Joni desde que me lembro. Demorou-me algum tempo a perceber o quão os seus discos me inspiraram. Penso que é algo que acontece à medida que uma pessoa cresce: passei a entendê-la e a relacionar-me muito mais com ela a partir da minha idade adulta”.

A artista ainda recontou a experiência de escrever as músicas de Pocket Sounds pela primeira vez, e algumas das problemáticas mais abordadas no projecto. “Havia alguma turbulência em determinados relacionamentos… eu acho que os temas refletem um bocado a ideia de amor nessa perspectiva. E há diferentes níveis de amor – o que se tem com a família é diferente daquele que se constrói com os amigos, e por aí fora. Há também o medo de ser incapaz de corresponder às expectativas – sejam as minhas próprias ou as dos outros -, o medo está sempre muito presente. O importante é saber enfrentá-lo”.

Talvez o medo de que a cantautora fala leve a que as suas músicas adquiram um tom ligeiramente depressivo ou triste. Ela própria tem consciência disso e, num tom humorístico, lembra o processo de escrever as suas músicas “Take Me Out” e “Midnight” e as dificuldades que teve em tornar a sua sonoridade mais colorida: “eu decidi firmemente criar temas alegres, mas não saíam de maneira nenhuma! As letras eram tudo menos felizes!”. Keely diz que esse mesmo medo também se verificava nos seus espectáculos ao vivo: “Fosse em tocar uma coisa em público pela primeira vez, ou o próprio ato de subir ao palco… Nos primeiros tempos, havia definitivamente uma dose de insegurança. As minhas mãos e a voz tremiam tanto! Mas eventualmente acostumei-me e comecei a sentir-me mais tranquila. E há uma beleza em tocar nas ruas: dá mesmo para sentir e receber a energia que o público te transmite”.

Quanto aos seus planos para o futuro, a artista diz que tem vindo a produzir novo material desde o lançamento de Pocket Sounds, mas confessa que isso nem sempre é fácil. “Às vezes preciso do meu conforto em casa para poder escrever como quero. Eu gosto de pensar muito nas palavras que uso e nos sons que crio, mas o processo está definitivamente em ordem. E tentar colocar em palavras estes últimos nove meses será engraçado. Tanta coisa pode acontecer em 9 meses… um bebé!”, refere entre risos.

“O plano é viver aqui no Porto”, remata. “E, quando estivermos mais habituados às andanças da cidade, definitivamente começaremos a organizar novos trabalhos com maior lucidez. O último EP pareceu quase nostálgico: houve sentimentos por detrás daquelas músicas de que só me apercebi passados dois anos. Por isso é que gosto de ter aquele tempo para me sentir à vontade. Aí eu volto atrás na minha cabeça, penso em todas as coisas que aconteceram e naquilo que senti, e escrevo”.

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