Cultura

VIVARIUM FESTIVAL: O HOMEM, A MÁQUINA E A ARTE

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A porta à direita do quarto andar do número 178 da Rua de Passos Manuel foi a casa de quem procurou perder-se em arte este fim de semana. O evento multidisciplinar “Vivarium” teve como principal objetivo explorar a relação entre o ser humano e a tecnologia, debatendo a corrupção que o digital pode, ou não, exercer sobre a experiência e intimidade humanas. Este movimento cultural dispôs de uma diversidade de atividades, que questionaram a aliança da tecnologia à expressão artística.

Entre espetáculos e convívios, destacou-se a estreia nacional de Marco Donnarumma com o projeto “Corpus Nil”, que lhe valeu o prémio internacional Ars Electrónica Center. Já na área da literatura, Gonçalo M. Tavares conduziu um Workshop baseado no seu livro “Atlas do Corpo e da Imaginação”.

Gonçalo M. Tavares e António Cerveira Pinto, diretor artístico do The New Art Fest, participaram numa conversa estimuladora, moderada por Patrícia Vieira Campos. O tema debatido, “Questões éticas e estéticas abertas pela revolução digital”, evocou opiniões e perspetivas divergentes entre o público e os oradores. “Com a tecnologia o amor muda? O espaço aumenta?” são as questões levantadas por Patrícia no arranque da conversa, às quais António respondeu apenas que, sem a tecnologia, “teríamos um mundo muito diferente, muito menos interessante e muito mais pobre”.

Este momento do festival enveredou por vários caminhos, falou-se da disponibilidade total exigida pelas redes sociais, referiu-se a importância da liberdade na democracia, e ainda se debateu o impacto da tecnologia no (des)emprego. Contudo, o aspeto mais polémico desta conversa foi a dualidade ética inerente à tecnologia: a sua utilização para o Bem e para o Mal. Além disso, Gonçalo alerta para o facto de que o progresso tecnológico pode levar ao progresso humano, mas também ao seu retrocesso.

“É evidente que a tecnologia depende do uso bom ou mau, mas é completamente diferente eu ter uma garrafa de plástico e uma de vidro (…) têm éticas diferentes (…) o próprio material tem ética”, explicou Gonçalo.

Pedro Oliveira, baterista, apresentou “Krake”, um projeto experimental intenso e até humorístico, que proporcionou ao púbico um sábado à noite muito fora do convencional. Pedro provou que a percussão não necessita de ser feita apenas com as baquetas e utilizou todo o tipo de materiais ao seu dispor, desde uma corrente de ferro a tigelas de inox. Nesta composição musical ousada foi aliando outros sons, passando pelo dedilhar de um cortador de ovos e culminando a sua performance numa volta à sala a tocar flauta de êmbolo. Esta atuação, que ao início pareceu chocar os espectadores, manteve um ritmo acelerado e agressivo que desafia quem diz que fazer barulho não é fazer música.

Ainda na noite de sábado o bailarino e coreógrafo Jonathan Schat, e o músico Nicolas Canot apresentaram o projeto “In Vitro”. Na apresentação simularam um aquário enevoado, servindo-se de uma sala envidraçada do Maus Hábitos e uma máquina de fumo. Schatz intrigou o público com a sua indumentária dicromática (riscas pretas e brancas) e os seus movimentos misteriosos que demoraram muito a ser percecionados no nevoeiro. O suspense de não se conseguir ver o que estava, ou não, a acontecer captou por completo a atenção de quem por ali passou.

Domingo à tarde, Ícaro Pintor, artista plástico, e Joaquim Pavão, músico, apresentaram o seu projeto conjunto, “Ifting Split”, uma experiência de criação plástica, que traduz graficamente o som produzido pelo desenho. Ao som da guitarra de Joaquim, Ícaro reproduziu e gravou os sons resultantes dos movimentos que fazia enquanto desenhava. Depois de envolver o ambiente familiar de domingo na música criada pela arte de desenhar, Ícaro terminou o seu desempenho com a afixação das obras abstratas resultantes.

Em termos de artes visuais, o festival exibiu, em várias zonas da associação cultural, obras de Silvestre Pestana (“P OVO N OVO Virtual”), Miguel Palma (“Incisão”) e Nerea Castro (“A Tale of Spring”).

Uma das atividades programadas para domingo, a conversa “Techno-fascismo e Máquina Esventrada”, orientada por Diogo Tudela e Ana Carvalho, foi cancelada por motivos desconhecidos ao público. A exposição “Suboptimal Automata”, de Diogo Tudela, também não marcou presença em nenhum dos dias do festival.

Para quem ficou até mais tarde, a noite de sábado contou ainda com dois espetáculos de encerramento: a performance de Atila e a festa clubbing do coletivo artístico Rabbit Hole.

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