Cultura
JUP RADAR: O ROCK MILLENNIAL DOS FUGLY
O punk rock dos Fugly é tão enérgico e jovial quanto é atento aos problemas e “crises” da geração em que os seus membros se inserem. No seu primeiro álbum Millennial Shit, lançado no passado dia 19 de Janeiro, a vivacidade de Pedro Feio (voz e guitarra), Nuno Loureiro (guitarra) e Rafa Silver (baixo) é uma constante – desde a sonoridade explosiva de “Hit a Wall” ao frenesim de “Yey” ou às melodias viciantes da faixa-título e de “Inside My Head” – mas parece haver sempre nas letras uma preocupação. Preocupação por essa Geração Y, “voz do emprego precário, dos estágios intermináveis, da abstenção política”.
Esta é a geração Fugly, atenta, como quem os ouve: «a maior parte das pessoas que falava comigo depois dos concertos falavam “aquele riff é mesmo fixe” (…) e agora já me vêm dizer coisas do género: “concordo com aquilo que estás a dizer nas canções” – ou “discordo”, também já me disseram isso – e é fixe, de repente, podermos ter uma mensagem a passar e não só a parte musical», reflete Pedro Feio.
Já a passagem da ideia das músicas para o papel ficou a cargo de Telmo Soares, que dá a voz e a guitarra a First Breath After Coma, mas também os traços à capa desenhada do disco dos Fugly. “É um puto adolescente meio ressacado a sair de uma festa de cuecas e com a máscara de urso” e partiu de um desenho improvisado pelo amigo da banda. Acabou por dar o rosto para o álbum e também o argumento para o videoclip de uma das faixas.
Millennial Shit nasceu em janeiro e, nos dois últimos meses, já andou por Espanha, França, Alemanha, Holanda, Bélgica, Itália e Polónia, em concertos de mão dada com os Whales, de Leiria, na Euro Sprint Tour.
Pedro olha para a experiência internacional como um começar do zero: “foi giro porque nós arriscamos tudo, ninguém sabia quem é que nós éramos”. Apesar de terem tocado para o técnico de som algumas vezes – “ou para a outra banda que estava a tocar” – o público que escolheu ir à descoberta de Fugly não pareceu ficar indiferente, considera Pedro.
O vocalista ressalva ainda a importância de “conhecer um bocadinho mais sobre o sítio onde estamos a tocar, conhecer as pessoas, conhecer o ambiente” no feedback da música que fazem, tanto lá fora como em Portugal.
Entre 2016, data de lançamento do EP Morning After, e o álbum novo, o recém-nascido Millennial Shit, o modelo da banda passa por ensaios pré-digressão, pelas gravações na Adega e pelos concertos, já que a distância geográfica entre os amigos impossibilita reuniões semanais. A escrita toca a Pedro, a mistura a Rafa. Pedro admite que prefere os palcos à fase de criação: “regra geral, gosto muito mais de tocar do que de gravar. No concerto (…) há uma espécie de libertação (…) é quase um alívio fazeres aquilo. Não é porque tem que ser”.
Falar dos Fugly é falar também d’O Cão da Garagem. A editora independente do Porto une a banda de Pedro Feio aos Sunflowers, 800 Gondomar, El Señor, Moon Preachers e Huggs, a mais recente adoção de uma família que vai além da música.
“Estamos todos mais ou menos dentro do mesmo espetro musical, temos todos gostos muito parecidos, somos todos daqui do Porto, temos muita facilidade em comunicarmos e estarmos juntos e acaba por se criar uma grande amizade entre todos”. E a intenção é de que a família cresça: «Há putos que vêm falar connosco e dizem: “Eu tenho uma banda!” e nós:”Fixe, nós temos uma editora!”. »
Pedro considera importante que “num país em que a cultura representa zero ou quase zero para a economia nacional”, se dê apoio a quem, a par dos Fugly, quer crescer na música e, em maior escala, na expressão artística. Essa é uma missão que poderá caber à editora: “acho que falta arriscar (…) e espero que daqui a 5 anos muita coisa mude nesta cidade. Agora estamos a viver aquela fase do turismo (…) começamos a movimentar os turistas para uma zona da cidade e o resto começa a puxar por outras coisas que são mais interessantes”.
A conversa acabou com Pedro a falar um pouco sobre algumas “curiosidades” musicais da banda. Um nome que provocou espanto e risos após ser mencionado foi o de Avril Lavigne. “Ouvi muitas vezes, quando era miúdo. Acho que há pessoal que tem vergonha de admitir que gosta de um certo tipo de música, mas eu acho que é normal!”. Conta que, na paragem por Toulouse, na Euro Sprint Tour, compraram o álbum da cantora pop dos anos 2000 por 1€. “Agora está na carrinha, estacionado à beira do álbum dos Sunflowers e do nosso; então só podemos escolher um desses 3 e, regra geral, vai ser sempre o da Avril Lavigne”.
É na mesma carrinha que realizam o ritual pré-concerto que, segundo Pedro, é o único que têm. «Sempre que passamos numa lomba na estrada gritamos: “Paula Borges!” – é a mãe do Rafa». Mas, além de Avril Lavigne, diz que a música faz parte da preparação da banda, tanto antes dos concertos como nos momentos de criação. A seleção é, no mínimo, eclética: “influências é sempre a pior coisa que nos podem perguntar (…) Posso dizer que há uma música que é inspirada em Radiohead como posso dizer que há uma inspirada nos Beatles, ou nos The Who, ou sei lá em quem”, e aponta ainda King Gizzard & the Lizard Wizard como uma das bandas de eleição dos Fugly, ou os californianos FIDLAR. “Gosto muito da capa do primeiro álbum deles”, afirma entre sorrisos.
Com um álbum nos ouvidos dos portugueses e concertos energéticos que bateram nos corações da Europa, os Fugly são, seguramente, artistas emergentes que sobem a passos largos na escada do punk português.
Quais são os planos da banda para o futuro? “Daqui a 5 anos? Já acabaram. [risos] Não sei, não faço a mínima ideia. Nós, cada vez mais, estamos convencidos de que é isto que queremos fazer, dedicarmo-nos a este projeto. Se fosse com melhores condições que o que temos agora ou não, acho que não fazia assim muita diferença. Claro que é fixe dormir num hotel melhor em vez de dormir no chão, (…) mas (…) é mesmo pela experiência de tocar e de ter uma resposta do pessoal que está lá a ver”.
JUP Radar é a rubrica mensal do Jornal Universitário do Porto, incluída na editoria de Cultura, que explora os artistas emergentes, nas mais diversas áreas, que chegam ao nosso radar. Os artigos saem no último domingo de cada mês.