Cultura

PORTO POST DOC: HÁ BOM CINEMA PORTUGUÊS?

Published

on

Nas duas sessões a que assisti do Porto/Post/Doc 2018, senti o mesmo espírito de profundidade humanística com um contrabalanço de uma individualidade proveniente da arte conceptual contemporânea. Nas palavras de Salomé Lamas, a protagonista da segunda sessão, incluída no programa Cinema Falado, compacto o que tenho a expressar sobre a arte contemporânea a ser fabricada, pensada e produzida: “eu estava mais interessada no processo e na forma do que no produto final. Se este filme está aqui a vossa disposição é pelo trabalho de uma equipa de produção inteira. O produto final não se pode colocar ao lado do processo”.

A primeira sessão a que assisti intitulava-se School Trip Quando Éramos Putos Era Sempre Verão e contou temas da juventude, do que somos agora, e o que estamos a viver, como adultos miúdos. Contava com seis curtas – Amor, Avenidas Novas (2018) de Duarte Coimbra, Onde O Verão Vai (Episódios da Juventude) (2018), de David Pinheiro Vicente, A Barriga de Mariana (2018), de Frederico Mesquita, A minha juventude (2016), de Rita Quelhas, Rochas e Minerais (2015), de Miguel Tavares e o videoclip de Luís Severo – tChuca (2018), de Duarte Coimbra.

Destaco Amor, Avenidas Novas e Onde o Verão Vai. O primeiro pela abordagem única ao que é existir no presente de uma maneira divertida e aleatória, tendo tido uma excelente resposta do público, numa viagem com a Lena d’Água para soar a um bom português, e numa simples conversa com a mãe ao telemóvel.

O segundo, pela capacidade artística da execução. Se houvesse um filme para descrever bom cinema independente português, seria Onde o Verão vai. Cada frame parecia uma pintura fauvista. A história não se forçava na audiência e simplesmente planava pelo ar.

Barriga de Mariana tentou transmitir algo, mas ficou muito aquém do que o enredo e a potencialidade da história diziam ser. As restantes curtas pareceram apenas peças para unir os pontos relevantes, e não causaram grande resposta ou marca na audiência.

No segundo dia, assisti à sessão Cinema Falado, que contava com os filmes Sombra Luminosa, de Francisco Queimadela e Mariana Caló, e Extinção, de Salomé Lamas. Sombra Luminosa foi a actuação de abertura de palco para Extinção. A primeira lida com peças antropológicas de um museu situado em Guimarães, com uma coleção permanente sobre vodoísmo a ser desconstruída por esta entidade superior, focando-se no processo de conseguir alterar e recompor o que já se diz por terminado.

Uma boa tentativa de transmitir a visão sobre o ser humano, num contacto com o seu eu interior e num processo de auto-reflexão através de paralelismo visuais e sonoros, que ficou “quase lá”, mas que, no entanto, fez um excelente papel de introdução para o que viria a ser a nova longa metragem de Salomé Lamas, Eldourado XXI (2016) e outros projectos premiados a nível internacional, Extinção. As duas abrangem desde o espaço de intervenção interior do ser humano para o espaço exterior. As acções humanas e civilizacionais pelas quais lutamos e defendemos todos os dias.

O filme segue uma equipa num documentário ficcional ao longo de uma corrente de fronteiras de leste. Explora as consequências socio-políticas e financeiras, depois da separação da União Soviética, dos negócios ilegais que beneficiam o grande estado, focando o caso de uma pequena divisão em território moldavo mas pertencente juridicamente à Rússia.

Extinção brilha como uma estrela no cosmos a explodir pela primeira vez, com um trabalho de fotografia coeso e de extrema relevância para toda a peça, assim como um ritmo de edição muito característico mas relacionável, que causa ao público a ilusão de estar a assistir a uma peça de Kubrick.

Leave a Reply

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

Exit mobile version