Cultura
S. PEDRO AINDA ESTÁ LONGE DO FIM
O FIM foi só o princípio. Pelo menos é isso que Pedro Pode, mais conhecido na estrada como S. Pedro, tem a dizer. O artista da Maia tem nome de santo, é verdade, mas andou a prevaricar pelas ondas de rádio o verão inteiro com “Apanhar Sol”.
Os últimos meses foram preenchidos para o ex-vocalista e compositor dos doismileoito. Mais do que se possa pensar. No remodelado auditório do Centro Católico dos Operários do Porto (CCOP) – que, depois das obras, foi batizado no passado domingo com um concerto dos Kikagaku Moyo –, conta ao seu público que “passou-se muita coisa, mas isso não é importante agora”. A história até é simples, e é explicada ao JUP de forma muito sucinta no backstage. Mas lá iremos.
Para já, o concerto. E esse alinhamento? As músicas de O FIM fazem-se ouvir, claro. “Apanhar Sol” também não podia faltar. Mas há ainda temas novos a mostrar. “Ia haver um disco hoje”, refere S. Pedro, indiscutivelmente bem-disposto, antes de passar para “Conversas com o Senhor”. “Está pronto, mas precisamos de acabar uns pormenores primeiro. Espero que estejam a gostar das cenas novas e das antigas”, continua o cantautor, por entre risadas e piscares de olho.
“O [manager] Diogo marcou estes concertos porque pensava-se que ia haver um disco inteiro para apresentar. Essa apresentação acabou por se transformar na estreia de algumas canções”, conta S. Pedro ao JUP, na pequena e aconchegada sala de bastidores. “Mas mantivemos os concertos. Quem falhou fomos nós”, brinca.
E que dizer dessas novas canções? Depois de “Pinhal” e “Modas”, a banda tenta a sua sorte com “Canção do Outro”. “Está muito bem ensaiada”, assegura. “Só canto o que eu quiser / dê lá por onde isso der / mas é assim que eu durmo bem. Se algum dia mudar / e disser que teve de ser / não me ouçam mais”, pode ouvir-se no refrão. A astúcia e o olho atento de S. Pedro estão tão presentes nas novas músicas como nas composições de O FIM. O artista, nunca iludido pelo sucesso, continua, como até disse quando pegou na sua guitarra pela primeira vez no palco, “afinadíssimo”.
Mas voltemos ao início por uns instantes. O que se passou depois do verão? Porquê o quase-silêncio depois de “Apanhar Sol” dominar as playlists das rádios nacionais meses a fio? No backstage, S. Pedro acalma os ânimos e refere que não aconteceu nada de assim tão grave. “Tive um filho, mudei de casa e de estúdio, depois trabalhei no disco… Já não tocávamos desde Paredes de Coura, por isso houve um intervalo grande. E como nunca tive muita atividade nas redes sociais, quase parecia que tinha acabado. Mas estava a trabalhar em muitas coisas”, frisa.
O músico sublinha ainda que “a banda está muito mais presente neste novo disco. S. Pedro quase devia ter outro nome. Devia ser S. Pedro e mais qualquer coisa. Toda a gente tocou a sua parte e eu concentrei-me mais naquilo que eu tinha de fazer. Eu tinha assumido no início do projeto que S. Pedro era uma banda minha e os músicos iam sendo músicos extra, mas agora encontrei a Dream Team e é fixe trabalhar com eles.”
Isto é excelente para o cantautor, porque fazer O FIM foi bem diferente. “Quando trabalhas em formato analógico, precisas de ensaiar muito bem antes de gravar. Muitas vezes chegava ao estúdio e não conseguia gravar bem uma bateria, não a conseguia tocar bem do início ao fim porque não atinava com um pormenor. Tive que aprender a tocar bem os temas. E a entrar bem no espírito das músicas. Tinha que tocar, ouvir nos fones algumas vezes, perceber qual era o caminho que aquilo devia seguir, e as músicas ganharam contornos solitários”, confessa.
Para o álbum que aí vem, S. Pedro continua a “ir buscar músicas antigas. Mas houve uma atualização nas letras. Para fazer sentido. Para uma pessoa ir sentindo aquilo que diz.” S. Pedro busca constantemente essa atualização, mesmo em temas já escritos e lançados, como os de O FIM. “Quando as outras pessoas sentem qualquer coisa com as canções, tu passas a pensar que se calhar há aqui alguma coisa e eu é que não estou a perceber. Para as pessoas terem gostado, alguma coisa deve estar a ser bem feita. Eu é que já estou demasiado habituado às músicas e acabo por tentar redescobri-las.”
Demasiado habituado ou não, S. Pedro continua a receber o sinal de aprovação de quem o ouve. “CBDV”, “Quim” e “Amores de Inverno” ainda intrigam e inquietam como se estivessem a ser ouvidas pela primeira vez, e “Que Azar” até tirou uns quantos pés do chão. “Olha a malta a dançar. Que fixe”, observou o cantor com Tó Barbot, o baixista.
Foi no seu estilo desarmante que reinventou o que o público já conhecia e apresentou o que tinha de novo para mostrar. “Até se vão passar com esta. Por acaso é fixe. Estão a curtir ou quê?”, aligeirou antes de tocar a novinha em folha “Passarinhos”. Aligeirou porque versos como “Hoje foi só um dia bom / o mais certo é voltar ao tom / a vida assim-assim”, cantados logo a abrir, trataram de trazer uma aura mais pesada sobre a canção. É a veia tragicómica do artista a vir ao de cima, e a se preservar com a mesma qualidade de sempre.
“A brincar, a brincar, uma pessoa chega ao final do concerto”, anunciou antes de “Apanhar Sol”. Nicolau Fernandes, dos doismileoito, ainda subiu ao palco para o encore, e S. Pedro aproveitou para se divertir com o seu público uma última vez. “Nós temos mais uma. Vamos tocar já em vez de sairmos do palco de novo e vocês pedirem mais uma. Despachamos isto logo. Aproveitem para dançar mais um bocadinho.”
No ar fica a boa-disposição e a promessa de um álbum que não vai demorar muito mais tempo a sair. “O novo disco está com mais energia. Vou queimar os últimos cartuchos enquanto posso”, brinca. S. Pedro pode dizer que está a queimar os últimos cartuchos mas, a julgar pela qualidade demonstrada no CCOP, ainda está longe do seu fim.