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Cultura

JUP RETROSPETIVA: OS MELHORES ÁLBUNS DE 2018

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Os dias passam a correr e nem sempre temos o tempo desejado para processar ou digerir tudo o que acontece ao nosso redor. As retrospetivas permitem analisar as coisas com mais calma. Elas ajudam-nos a construir as imagens mentais de mais um ano cheio de tonalidades distintas e a admirar o que de melhor ele nos ofereceu.

O JUP volta a aproveitar os últimos dias de dezembro para fazer essa retrospetiva. Olhamos hoje para aqueles que consideramos os melhores álbuns de 2018. Hoje as nossas escolhas são estas. Amanhã podemos dar de caras com uma obra que nos obriga a reformular as nossas pequenas listas completamente. As retrospetivas têm destas coisas engraçadas.

Mas por agora fica a celebração. 2018 foi um ano cheio para o mundo da Cultura e 2019 já está aí à espreita.

Capa de "Kids See Ghosts", de King Cudi e Kanye West.

Capa de “Kids See Ghosts”, de Kid Cudi e Kanye West.

Kids See Ghosts – Kids See Ghosts

Yeezy season approaching/Fuck whatever y’all been hearing” nunca fez tanto sentido como em junho deste ano. Depois de um magnífico Daytona, de Pusha T – produzido na sua quase totalidade por Kanye – e do seu próprio projeto ye, chegou a vez do artista unir forças com Kid Cudi numa colossal e paradisíaca odisseia pelas mentes tão geniais quanto transtornadas dos dois gigantes da música.

Com sete músicas e 24 minutos, Kids See Ghosts nunca nos deixa à espera de mais – está tudo lá. Se a energia e caos indomáveis de Kanye foram o calcanhar de Aquiles do seu projeto a solo, aqui Cudi nunca deixa que tal aconteça. Como que numa batalha amistosa e saudável constante, mentor e pupilo trazem ao de cima o melhor que cada um tem para oferecer. O conforto e a vulnerabilidade são tão grandes e óbvios que faixas como “Reborn” e “Cudi Montage” são como um abraço sonoro entre os dois artistas, e um aconchego para todos aqueles que os acompanham de perto há anos.

A essência de Kids See Ghosts encontra-se aí. Os hmm’s que salvam vidas desde 2008; a assertividade e gentileza dos “keep moving forward”, dos “I can still feel the love” e dos “stay strong”; a crueza nos versos de quem já anda nisto há muitos anos e continua a superar-se e o companheirismo genuíno na era das colaborações feitas a pensar em dinheiro e fama. Kids See Ghosts é renovação; a sensação de paz depois de uma batalha ganha; o levantar pela própria mão depois de uma queda na berma do abismo. É um renascer das cinzas e um marco de absoluta excelência num novo ciclo das carreiras dos dois artistas.

Capa de "Some Rap Songs", de Earl Sweatshirt.

Capa de “Some Rap Songs”, de Earl Sweatshirt.

 Some Rap Songs – Earl Sweatshirt

Crescer aos olhos do mundo não é fácil. Crescer aos olhos do mundo enquanto rapper prodígio é mais difícil ainda. Desde 2010 que a constante demanda de novo conteúdo por parte dos fãs de Earl quase alcança níveis de meme à la Frank Ocean. Apesar de comprovadamente irritante para o rapper, esta exigência é compreensível. Depois dos projetos enquanto parte dos Odd Future, da mixtape angsty Earl e dos álbuns Doris e I Don’t Like Shit, I Don’t Go Outside, Earl Sweatshirt continua a surpreender.

A humildade na atribuição do título, apesar de característica do rapper, em pouco se adequa ao projeto em si. Esta, aliada à curta duração das músicas, poderia apontar quem não está familiarizado com ele na direção “preguiça” ou “mais um álbum às três pancadas para fazer dinheiro”. Mas, de facto, Some Rap Songs não é definitivamente só algumas músicas de rap.

Embaladas em beats lo-fi não alinhados, as características às quais já estávamos habituados, como a mestria da lírica, as brilhantes metáforas e aliterações e o ambiente melancólico e sombrio, continuam lá. Em “Peanut”, a penúltima faixa e uma das duas gravadas após a morte do seu pai, Earl assegura-nos: “flushin’ through the pain, depression, this is not a phase”. Quando pensava servir-se do álbum para se reconciliar com o progenitor, o MC foi tomado de surpresa pelo seu falecimento no início deste ano, mas a presença do mesmo paira no projeto como em nenhum anterior. A raiva e o ódio deram lugar ao processamento de emoções que, por sua vez, deu a Earl a paz de espírito suficiente para o perdoar.

Some Rap Songs é a aceitação de que, por vezes, depois da tempestade não vem a bonança e que o melhor remédio é aprender a lidar com isso da melhor maneira que conseguirmos. Para o jovem rapper prodígio, continuar a fazer poderosa, emotiva e genuína poesia sónica é a melhor maneira. Sem nunca querer, Earl permanece a voz e cara de todo um som e movimento, e um dos artistas mais respeitados e amados da atualidade, com toda a justiça.

Capa de "Oil of Every Pearl’s Un-Insides", de SOPHIE.

Capa de “Oil of Every Pearl’s Un-Insides”, de SOPHIE.

Oil of Every Pearl’s Un-Insides – SOPHIE

Desde o lançamento do seu primeiro single em 2013 que os olhos do mundo estão postos na intrépida produtora SOPHIE. Se a compilação de 2015 Product consistiu, precisamente, nisso – uma compilação de singles -, em Oil of Every Pearl’s Un-Insides encontrámo-la no seu melhor: confiante, irreverente, matura e dona de nove assombrosas faixas que se ligam coesa e detalhadamente umas às outras naquele que é o álbum mais fresco de 2018.

Num universo musical quase a abarrotar, os holofotes brilham cada vez mais naqueles que se sabem diferenciar. Certamente a produtora não é a primeira a fazer experiências com outros géneros – e não será a última -, mas é a maneira genuína e única como o faz que a singulariza dos outros. Os synths pesados, as batidas distorcidas e a atenção ao detalhe na manipulação de vocais lancinantes, aliados à vulnerabilidade e sensibilidade de versos como “I’m freezing/I’m burning/I’ve left my home/Soft ache, me/Earth shaking/I feel alone” fazem de Oil of Every Pearl’s Un-Insides a prova de que não há mais ninguém a fazer o que SOPHIE está a fazer.

O apelo tanto à versão de si mesma que almeja em “Infatuation”, como a um outro ser no caótico interlude “Not Okay” dão lugar à autoafirmação, autodescobrimento e liberdade no hino pop Immaterial. A confiança nos versos “I could be anything I want / Anyhow, any place, anywhere, anyone / Any form, any shape, anyway, anything, anything I want” é contagiante. SOPHIE inspira-nos a ser como ela; a fazer parte do seu universo; a desembaraçarmo-nos de rótulos e a sermos livres para correr atrás da pessoa que ambicionamos ser, ou já somos. “There’s a whole new world” e é a SOPHIE que ele pertence.

Capa de "Now Only", de Mount EErie.

Capa de “Now Only”, de Mount Eerie.

Now Only – Mount Eerie

A morte é talvez a única grande certeza na vida. Quando pessoas adultas, entendemos e aceitamos que eventualmente o nosso tempo chegará. Mas aquilo que nunca parecemos aceitar é a possibilidade da morte de um próximo enquanto ainda cá estamos. Quando para Phil Elverum, esse próximo foi a sua mulher, e o resultado foi o emocionalmente devastador e traumatizante A Crow Looked at Me, lançado quase exatamente um ano antes de Now Only.

É impossível falar de Now Only sem mencionar o seu precedente – elencado pelo JUP nos Melhores do Ano de 2017. O mais recente projeto é como que uma sequela; um epílogo do anterior. Em A Crow Looked at Me, Phil estava cego e imerso na dor e solidão, envolto em pensamentos deambulantes face à ausência da pessoa a quem eram destinados. Em Now Only, o cantor continua a dirigir-se a Geneviève – “I sing to you/You don’t exist/I sing to you though” são os versos que abrem o álbum -, mas apesar disso, aqui Phil já não deixa o seu coração partido defini-lo por completo.

O total assolamento do projeto predecessor deu agora lugar a vislumbres de aceitação e esperança. As faixas já não tratam apenas e só o luto. Um ano depois, Elverum sente a liberdade suficiente para se debruçar sobre as memórias de quando ele e Geneviève se conheceram; para sair de casa e ir cantar músicas sobre morte para “a bunch of young people on drugs” e para falar com Father John Misty no backstage sobre composição.

Para Phil, a música é um refúgio. A maneira como descreve avassaladoramente os detalhes do apodrecimento do corpo da sua mulher e os sítios onde depositou as suas cinzas em Earth ou a naturalidade com a qual entoa o refrão “people get cancer and die/people get hit by trucks and die” na faixa que rouba o título ao álbum são mecanismos de enfrentamento.

Now Only é a conformidade e a procura do sentido e da continuidade na face da desolação. A falta de estrutura e poeticidade em comparação a Crow em nada o tornam inferior, pelo contrário. Ao invés de deixar a tragédia defini-lo, Elverum apoderou-se dela, transformando-a numa bonita e depressiva fotografia musical.

Capa de "Die Lit", de Playboi Carti.

Capa de “Die Lit”, de Playboi Carti.

Die Lit – Playboi Carti 

Se, há dois anos, disséssemos a um dos seus fãs que Playboi Carti viria a lançar dois projetos no espaço de treze meses, a resposta seria, muito provavelmente, um riso. Nessa época remota – segundo a unidade de tempo do mundo do soundcloud rap – todos os leaks e snippets do jovem de Atlanta eram tão valiosos quanto ouro mal surgiam na internet. Cansados das poucas faixas oficiais e dos mesmos vídeos-snippet de quinze segundos, os fãs exigiam em todos os posts do rapper nas redes sociais – “drop the tape!”. E assim foi – em 2017 fomos abençoados com a sua mixtape self-titled. Mas Carti não ficaria por aí.

Em clássica oldhead fashion, as críticas ao projeto rondaram a falta de lírica; de “conteúdo” e a repetição. Mas o rapper não quis saber – ele tem a perfeita consciência de tudo isso. Ao invés de se tentar provar aos auto-intitulados anciãos defensores dos portões imaginários do hip-hop, Carti apoderou-se daquilo pelo qual é criticado por uns e louvado por outros – os constantes ad-libs, o rap em formato balbucio e os temas levianos. Os versos “fuck that mumblin’ shit/ Bought that crib for my mama off that mumblin’ shit” na banger “R.I.P” são o derradeiro flex, e prova da postura “you getting mad while I’m getting rich”, tão característica dos mumble rappers.

Mas não se poderia sequer pensar em louvar a triunfante rebelião de Carti sem mencionar o mágico em grande parte responsável pelo sucesso da mesma – o produtor Pi’erre Bourne. O mundo sónico criado pelo duo é reminiscente de uma química só conhecida a Gucci Mane e Zaytoven que, por coincidência, também quebraram as convenções do rap típico há mais de uma década atrás – de Atlanta para o mundo.

Para além da rara autoconsciência e noção que possui para identificar as suas forças e as suas limitações, o rapper é igualmente responsável por trazer ao de cima o melhor dos outros. Die Lit está repleto de features de luxo – desde o bestie Lil Uzi Vert, ao pais do mumble rap Chief Keef e Young Thug, ao fenómeno Travis Scott e até a Nicki Minaj, Carti faz com que todos aspirem ao nível da sua energia.

No seu melhor – que consiste, basicamente, no projeto inteiro – o álbum é como uma high constante da qual não queremos sair. Não, os versos não rimam, nem são “profundos”, nem fazem chorar. Mas será que isso importa? Não. “We So Proud of Him”, indeed.

Adriana Pinto

Capa de "Astroworld", de Travis Scott.

Capa de “Astroworld”, de Travis Scott.

Astroworld – Travis Scott

Travis Scott regressa às raízes com o seu terceiro álbum, suposta continuação do primeiro, Rodeo. Astroworld era o nome de um antigo parque de diversões da sua cidade natal, Houston, e transporta-nos para o trabalho mais pessoal, até à data, do artista norte-americano.

O álbum não identifica as participações dos artistas nas músicas, de maneira a que o ouvinte não selecione à partida que música ouvir. Mas não demorou que os fãs descobrissem a monstruosa participação com o rapper Drake. Sicko Mode, que é a segunda música mais longa do álbum, transporta-nos para três momentos onde podemos ver a evolução do artista, tanto na produção como na letra. Este tema, como outros, inclui referências da sua relação atual e da sua filha, que também inspirou o tema “infantil” da capa do álbum.

Com 17 músicas e 59 minutos de satisfação, Astroworld é como um grande parque de diversões: há muito para ver e experimentar. Com participações desde Stevie Wonder à Pharrell Williams e Tame Impala, é sem dúvidas o álbum mais inovador de Travis Scott.

Capa de Black Panther, banda sonora do filme homónimo.

Capa de Black Panther, banda sonora do filme homónimo.

Black Panther – Vários artistas

Inspirado no filme Black Panther, surge uma das trilhas sonoras mais aguardadas e surpreendentes do ano. Kendrick Lamar, um dos responsáveis pela composição e produção do álbum, foi o artista que mais contribuiu para o álbum, com um total de 5 músicas.

Influenciado em batidas e ritmos sul-africanos, o objetivo do álbum sempre foi de transportar o ouvinte para o som mais próximo da cultura africana e de adotar o conceito revolucionário do filme. O conjunto conta com participação de três artistas sul-africanos e dos principais nomes do mundo do Hip Hop e R&B. As letras das músicas também são referentes a acontecimentos do filme, como é o caso de King’s Dead. A música, interpretada por Jay Rock, Kendrick Lamar, Future e James Blake, refere-se à morte do Rei T’Challa e os cânticos no final na música, podem ser ouvidos na cena da luta final, no fim do filme.

Com uma duração 49 minutos, o álbum celebra o primeiro filme de origem africana da Marvel e explora a mistura do Hip Hop com sons exóticos e tribais.

Capa de "Beerbongs & Bentleys", de Post Malone.

Capa de “Beerbongs & Bentleys”, de Post Malone.

Beerpongs & Bentleys – Post Malone

Caracterizado como um artista de hip-hop, Post Malone prova que a veia de rockstar também corre no seu sangue.  Stoney, o primeiro álbum do artista norte-americano, trouxe a habitual mistura de géneros e temas. Beerpongs & Bentleys não foi diferente.

Neste segundo álbum, Post Malone fala do mundo de excessos que um rockstar tem, mas não deixa de sublinhar as suas desvantagens. Na maioria das suas letras, o artista partilha sentimentos profundos sobre si e relações passadas. Em temas como Better Now, Malone relembra que dinheiro não é solução para tudo e que a felicidade não se compra. Já conhecido pelas melodias cativantes, o artista norte-americano não deixa de surpreender com uma mistura de vários géneros, como é o caso de Over Now, que conta com uma participação especial de Tommy Lee, baterista da banda metal Motley Grue.

O álbum passa por dezoito temas, com duração de uma hora e quatro minutos. Conta com participações dos artistas Swae Lee, 21 Savage, Ty Dolla $ign, Nicki Minaj, G-Eazy e YG. Este trabalho, como o anterior, mostra a diversidade de Malone.

Detalhe da capa de "Queen", de Nicki Minaj.

Capa de “Queen”, de Nicki Minaj.

Queen – Nicki Minaj

O tão aguardado Queen da artista norte-americana e “melhor trabalho até a data” chegou em Agosto deste ano. Nicki Minaj, lançou o seu quarto álbum, com 19 músicas e conta com participações de Eminem, Lil Wayne, Ariana Grande, The Weeknd, Swae Lee e Foxy Brown.

É o álbum com maior conteúdo lírico e mais ligado ao estilo rap da artista. O trabalho concentra-se na vida da Minaj na comunidade do Hip Hop e o fato de já não ser a única rapper feminina de sucesso, atualmente.

As duas primeiras faixas do álbum são do estilo familiar de Nicki, mas é na terceira faixa que a rapper volta às raízes da sua cidade natal. Em homenagem a The Notorious B.I.G., Nicki Minaj usa a batida de Just Playing (Dreams) para uma versão hilariante, em Barbie Dreams. Enquanto B.I.G. faz referência à artistas femininas que mais admirava na altura, Minaj decidiu fazer um “roast” aos artistas e atletas predominantes da altura. Mais tarde a rapper confirmou nas redes sociais que não passa de uma brincadeira e que apenas referiu artistas que admira. Majesty e Hard White são um exemplo de faixas em que Nicki aposta completamente nas barras e conteúdo lírico. E em Ganja Burns, opta por um género mais ligado às suas bases caribenhas.

Queen engloba uma mensagem de empowerment às mulheres e o percurso de Nicki Minaj como uma das artistas mais influenciáveis do Hip Hop.

Capa de "?", de XXXTentacion.

Capa de “?”, de XXXTentacion.

? – XXXTentacion

Uns meses antes da sua morte, Jahseh Onfroy, de nome artístico XXXTentacion, lançou o seu segundo álbum de estúdio no final de Janeiro. O artista explicou que o álbum é sobre palavras, mas sim sobre o sentimento – “Será difícil de perceber, mas muito fácil de se ouvir” – daí, o nome do álbum ser um ponto de interrogação.

Conhecido por um estilo mais contemporâneo, ? é composto por temas que abordam sentimentos suicidas, sombrios e íntimos, que o artista sentia durante a sua prisão domiciliar. Apesar de letras profundas, XXX não se afastou completamente do trap. O artista também faz uma ligação na ordem das músicas, como é o caso de Moonlight, SAD! e the remedy for a broken heart (why am I so in love). Moonlight é sobre uma rapariga de quem o rapper gosta e tem ciúmes, SAD! aborda a dificuldade de ultrapassar uma perda e sofrer por depressão, e the remedy for a broken heart (why am I so in love) faz referência a uma ex-namorada que morreu. Portanto, fica aqui a dúvida se as três músicas são sobre a transição de sentimentos sobre a mesma rapariga e, se, as três estão conectadas com a mesma ex-namorada de quem XXXTentacion se refere no álbum anterior, 17.

Apesar da partida tão breve, Jahseh Onfroy deixou a sua marca pelo fato de abordar os problemas mentais num mundo em que o homem não pode ser fraco. XXXTentacion também quebrou barreiras pelo facto de ? não se basear nas melhores rimas ou barras de referência, mas sim no ritmo e, música em si, que apresenta.

Darcielle Costa

Capa de "Lost & Found", de Jorja Smith.

Capa de “Lost & Found”, de Jorja Smith.

Lost & Found – Jorja Smith

Ao longo de 46 minutos, Jorja apresenta-nos Lost & Found. A artista explica o nome do álbum como uma referência ao que sentia quando tinha 18 anos. Foi nessa altura que se mudou para Londres, cidade que a fez sentir perdida, mas que a levou em busca de si própria. Esses sentimentos contraditórios são audíveis nas doze faixas que constituem este álbum, e que foram escritas entre os 16 e os 21 anos. O disco é uma viagem musical, onde acompanhamos o seu crescimento, e que funciona também como um diário sonoro.

Lost & Found é um disco muito variado, onde se inclui a crítica social, como na canção “Blue Lights”, em que Jorja usa um sample de “Sirens”, de Dizzee Rascal.  Também se encontram canções sobre romance adolescente (“Teenage Fantasy”), amor e esperança (“Wandering Romance”, “Lost & Found”), incertezas (“The One”,“February 3rd”) despedidas ou perdas (“Where Did I Go”, “Goodbyes”), e encontros e desencontros (“Tomorrow”), mostrando uma maturidade superior à sua idade.

Não é um disco teenager, de temáticas “fáceis”, o que lhe tem valido elogios de artistas consagrados como, por exemplo, Snoop Dogg.

Quais serão os próximos passos da jovem artista? A indústria musical aguarda, com ansiedade, pelo seu crescimento artístico que este álbum – que tem a capacidade de nos emocionar e transportar para o seu universo muito pessoal – deixa antever. Jorja Smith, que tem atualmente 21 anos e virá a Portugal no próximo ano, onde vai atuar no festival NOS Alive, está aqui para ficar!

Capa do EP "Being Human in Public", de Jessie Reyez.

Capa do EP “Being Human in Public”, de Jessie Reyez.

Being Human in Public – Jessie Reyez

Em 2016, Jessie Reyez obteve um enorme sucesso com o seu primeiro single, chamado “Figures” (do qual existe uma versão com outro grande artista atual, Daniel Caesar). O tema veio a fazer parte do EP de estreia, chamado Kiddo. Com Being Human in Public, o seu segundo EP, Reyez mostra não ser uma one hit wonder, sendo para muitos uma das vozes que mais se destaca no panorama do R&B/soul dos últimos anos.

Uma voz áspera e marcante, cheia de soul, Reyez, ao longo de sete canções e 22 minutos, apresenta-se num registo cru, e, por vezes, até desconcertante, tendo em conta o teor de algumas das suas letras. Um bom exemplo é “Dear Yessie”, onde Jessie Reyez interpreta, com enorme intensidade, uma canção que fala sobretudo sobre os obstáculos que teve de ultrapassar para obter sucesso e o mundo por vezes cruel do show-business.

Reyez canta como escreve: com uma enorme agilidade e honestidade, abordando temas complexos com enorme coragem, criando um estilo próprio e original.

Being Human in Public fala também dos seus desejos de alcançar reconhecimento (merecido), como em “Saint Nobody”. Canta ainda sobre amor (“Apple Juice”), relações amorosas confusas (“Imported”, com a participação de JRM, ou “Fuck Being Friends”) e ainda critica o slut-shaming em “Body Count“ (com a participação de Normani e de Kehlani). É um álbum de temas variados e honesto, como seria de esperar de uma das artistas mais cruas dos últimos tempos, evocando nomes de outras eras da música soul, que usavam este estilo para passar as suas mensagens.

Capa de "Mechelas", de Sam the Kid.

Capa de “Mechelas”, de Sam the Kid.

Mechelas – Compilação de Sam the Kid

Em 18 faixas e 69 minutos, Sam the Kid, um dos maiores MCs e produtores nacionais, conseguiu juntar grandes nomes da old-school e da new-school numa viagem pelo passado e presente do hip-hop.

Apesar de todos os instrumentais serem exclusivamente produzidos por Sam the Kid, quase todos os temas, à exceção de “Sendo Assim”, contam com a participação de outros artistas, não só portugueses, mas também brasileiros e dos PALOP. Outros nomes como Boss AC, Bob (Rage Sense), Bispo, GROGnation, Maze, Sir Scratch, ou Phoenix RDC surgem e demonstram a enorme criatividade e vitalidade do movimento hip-hop nacional.

“Sendo Assim” é a única faixa em que Sam the Kid aparece sozinho. É a primeira vez que surge a solo desde que lançou “Pratica(mente)” em 2006. “Sendo Assim” encerra o álbum, com os habituais trocadilhos a que Sam já nos habituou. Neste tema, reflete sobre o hip-hop atual e do passado, questiona qual será o seu espaço no hip-hop de hoje, e não deixa de fazer uma espécie de dedicatória aos que apoiam a cultura e os princípios originais deste movimento.

Acima de tudo, o que Mechelas nos lembra é que, quaisquer que sejam os contornos e evoluções do hip-hop, há nomes que irão permanecer e características que não desaparecerão. Sam the Kid já conquistou um espaço indiscutível na história do hip-hop nacional e aguardamos, com expetativa, os seus próximos passos, já que, de Sam the Kid, temos sempre que esperar o inesperado.

Capa de "Invasion of Privacy", de Cardi B.

Capa de “Invasion of Privacy”, de Cardi B.

Invasion of Privacy – Cardi B

O meio do hip-hop é, predominantemente masculino. As vozes femininas são poucas, e, talvez, por esse motivo (mas não só) seja tão refrescante ouvir alguém como Cardi B, sem papas na língua, em Invasion of Privacy.

Após o enorme sucesso de “Bodak Yellow”, primeiro single deste tão esperado álbum, as expetativas eram altas e foram atingidas. Com a honestidade excêntrica que tanto a caracteriza, Cardi fala das suas origens humildes e da ascensão à fama, de relações complexas – como é a sua com Offset -, do grupo de hip-hop Migos, (“Be Careful”), de dúvidas amorosas (“Ring”, com participação de Kehlani) e do seu sucesso e da inveja que isso pode suscitar (“Bartier Cardi”, com 21 Savage, e “I Like It”, um dos temas mais ouvidos do verão, em que Bad Bunny e J. Balvin também participam).

Apesar de ter recebido algumas críticas ao seu flow e às rimas, Cardi B demonstra uma notável auto-confiança, que, por vezes, pode ser, injustamente, confundida com arrogância.

Invasion of Privacy é um álbum forte e duro, com uma grande produção, que reforça a mensagem geral do álbum: a importância da atitude e do amor-próprio face a qualquer circunstância e como forma de expressão, que a artista usa eficazmente.

Este disco reflete o crescendo da importância do rap no universo feminino, continuando o trabalho de outras artistas que vieram antes de Cardi B, como Missy Elliot ou Nicki Minaj, que abriram as portas para um maior equilíbrio de género no hip-hop. Quem sabe se Invasion of Privacy vai inspirar o surgimento de outros nomes do rap no meio feminino?

Com este álbum, Cardi B ganha maior dimensão artística e respeito, ultrapassando a ideia de que era apenas uma “desbocada” ou uma “excêntrica sem conteúdo”.

Capa de "Deepka Looper", de Papillon.

Capa de “Deepak Looper”, de Papillon.

Deepak Looper – Papillon

Papillon (em francês, borboleta) é o nome artístico de Rui Pereira, membro do coletivo GROGnation. Papillon era já um dos grandes nomes da nova escola do hip-hop nacional quando lançou este álbum, o seu primeiro a solo.

As suas qualidades como MC e escritor já eram evidentes. O sucesso deste Deepak Looper era, portanto, previsível para quem estivesse atento à cena hip-hop nacional, e surge na sequência desse potencial que muitos terão captado em vários momentos.

Deepak Looper é um disco conceptual, desde o seu título até à sua composição, passando pelo seu tom introspetivo. Aliás, os títulos de 11 das 13 faixas começam, de maneira mais ou menos evidente, por “I’m” (Eu). Papillon oferece-nos 56 minutos de música na sua mais pura essência.

Produzido por um dos outros grandes nomes da cena “tuga”, Slow J (que aparece em temas como “Impasse”, por exemplo), este trabalho tem ainda a colaboração de outros artistas, como Lhast ou Holly.

Apesar do carácter auto-biográfico, existe uma faceta universal nestes sons: Papillon reflete acerca do seu passado, presente e futuro, e sobre a sociedade em geral. Isto faz-nos pensar, ao mesmo tempo, na nossa própria condição humana. “Impec” é, provavelmente, a canção mais consensual, aquela com que mais pessoas se identificarão. Contudo, não será o único momento do disco em que isso acontece. Temas como “Iminente” (em que Plutónio também participa) ou “Impressões” também podem criar esse efeito coletivo. Um dos aspetos mais importantes do álbum é o de conseguir criar uma sensação coletiva, sendo simultaneamente introspetivo e universal.

Deepak Looper é um primeiro álbum prometedor, e que não tem um subgénero específico, o que o torna ainda mais versátil e inovador. Papillon é certamente um nome a seguir com atenção no hip-hop nacional.

Francisca Costa

Capa de "Sleep", dos The Sciences.

Capa de “Sleep”, dos The Sciences.

The Sciences – Sleep

O regresso aos trabalhos de estúdio era mais que esperado das lendas do doom metal, depois de Dopesmoker lançado em 2003 mas editado em 1998. Mas foi com surpresa que a banda entregou o novo álbum aos seus fãs no dia 20 de abril.

Batizado como The Sciences, o quarto álbum dos Sleep, é excelente exemplo da criatividade que é possível ter com um estilo musical tão monótono e semelhante. O novo disco não foge a esse registo, mas traz algo refrescante ao simples peso dos riffs em drop C, é lento e rápido ao mesmo tempo, o baixo de Al Cisneros trava uma batalha de velocidade com a guitarra de Matt Pyke e o incrível e dinâmico registo de Jason Roeder na bateria.

Apenas seis músicas, e pouco mais de 50 minutos, e um culminar em Sonic Titan, um tema já conhecido pelos fãs mais atentos por ser incluído nas setlists de vários concertos ao longo dos anos. Os Sleep regressam nesta aventura de um cosmonauta num álbum repleto de referências a clichês do seu stoner metal. Para 2019, anseia-se um regresso aos palcos portugueses, depois da passagem pelo Reverence Valada em 2015.

Pormenor de "Masana Temples", de Kikagaku Moyo.

Capa de “Masana Temples”, de Kikagaku Moyo.

 Masana Temples – Kikagaku Moyo

A ligação da banda de rock psicadélico japonesa com Portugal continuou a crescer em 2018, à semelhança da sua reputação. Já desde o lançamento dos seus primeiros álbuns que a banda era presença regular em Portugal, tocando em salas pequenas no Porto e em Lisboa, em 2017 entraram no mundo dos festivais de verão com um concerto no Sonic Blast Moledo. Este ano escolheram mesmo a capital para a gravação do seu quarto trabalho de estúdio.

O álbum inicia com um tema de vibe oriental, com a cítara a sobrepor-se para um crescendo até o break onde começa a segunda música, Dripping Sun. As paragens e mudanças de ritmo são comuns no decorrer do álbum, iniciando calmamente, muitas vezes com inspirações de blues para rapidamente se alterar para algo mais alegre e dançável.

Masana Temples passa por dez temas ao longo de 40 minutos de música. Com produção de Bruno Pernadas, o quinteto de Tóquio acrescentou um toque jazz à sua viagem psicadélica por um mundo oriental e ocidental. Apesar do leque de instrumentos usado pelo conjunto nipónico, a sua música transmite sempre uma simplicidade e um cariz inocente a tudo o que os rodeia.

Capa de "And Nothing Hurt", de Spiritualized.

Capa de “And Nothing Hurt”, de Spiritualized.

And Nothing Hurt – Spiritualized 

And Nothing Hurt é a resposta da banda britânica Spiritualized, formada em 1990 após a separação dos Spacemen 3, ao grande retorno do shoegaze, meio adormecido desde a década de 90, mas com crescente preponderância nos últimos anos.

O regresso da banda de J. Spaceman aos álbuns de estúdio não altera o registo demonstrado em álbuns como Ladies And Gentlemen We Are Floating In Space, mas é representativo das experiências do seu fundador. Não é por acaso que o rock n’ rol e psicadelismo é complementado pelo shoegaze – a representação musical de melancolia e ataraxia – todo esse romantismo e melancolia demonstrados neste trabalho são fruto das vivências de Jason Pierce.

A dimensão do trabalho é impressionante, desde o uso de vários instrumentos de cordas e sopros e a presença constante de um coro, todo o investimento neste álbum tem um propósito, todos os toques que os diversos instrumentos acrescentam criam uma experiência musical distante de qualquer trabalho anterior.

No final permanece uma sensação de conforto, como o fechar de um capítulo, talvez este tenha sido o último trabalho da banda britânica, mas pelos palcos ainda irão dar a sua graça ao marcar presença na próxima edição do Vodafone Paredes de Coura.

Capa de "III", de Naxatras.

Capa de “III”, de Naxatras.

III – Naxatras

Depois de dois trabalhos bem-sucedidos, a banda de stoner psicadélico da lendária cidade de Tessalónica regressa, sem grande demora, ao estúdio para gravar o seu trabalho mais ambicioso. Batizado com um simples nome representativo dos seus três álbuns de estúdio, a banda opta agora por um registo menos “pesado”, com temas mais melódicos, mas com o psicadelismo sempre presente.

Os Naxatras têm neste trabalho um álbum extremamente coeso, que dificulta a escolha de uma música que se destaque, mas após uma hora de viagem por um final de tarde solarengo, o trio termina com uma balada, Spring Song, quase ao jeito de um clichê de rock típico dos anos 90. Apesar de toques de blues, as raízes dos primeiros álbuns mantêm-se, no entanto a inocência e falta de experiência dos trabalhos anteriores dá lugar a uma maturação e um desenvolvimento musical notório.

A avaliação do álbum foi tida em conta pela organização do Sonic Blast ao colocar a banda a tocar precisamente ao final na tarde na última edição do stoner fest de Moledo. Espera-se a continuação da evolução de uma das novas bandas mais promissoras do género.

Capa de "Eternal Return", de Windhand.

Capa de “Eternal Return”, de Windhand.

Eternal Return – Windhand

A banda de Virgínia celebrou a sua década de existência com o lançamento do seu melhor trabalho até agora, Eternal Return. Conhecidos pelo contraste do peso das suas cordas com a voz de Dorthia Cottrell, o conjunto de doom metal regressa aos discos após o trabalho de 2015, Grief’s Infernal Flower e o primeiro álbum sem um dos membros fundadores, Asechiah Bogdan.

Sem grandes introduções, o álbum começa ligeiramente mais rápido do que o habitual, mas cedo também surge um break que transporta a música para a famosa riff filled land. Num estilo musical sem pressas, o álbum prolonga-se ao longo de uma hora pelas nove músicas, com um registo mais melódico do que o habitual.

Uma imensidão de breaks e mudanças de ritmo, com uns momentos mais suaves” pelo caminho, como Pilgrim’s Rest e Feather, há uma ligação subtil entre cada música que torna Eternal Return em algo mais simples do que um simples álbum de doom carregado de riffs cavernosos e afinações dois tons abaixo do habitual. Windhand explora agora algo mais místico e nebuloso, quase com uma aproximação ao goth metal, explorando ainda alguns solos que se aventuram pelo mundo psicadélico.

Mais uma vez o público português pode chamar-se sortudo, com a presença já confirmada da banda na próxima edição do Sonic Blast.

Francisco Cardoso