Cultura
PORTO BLUES FEST: UM REAVIVAR DO FESTIVAL QUE FEZ CELEBRAR O BLUES
A terceira edição do Porto Blues Fest visitou os jardins do Palácio de Cristal nos dias 17 e 18 de maio. Com a colaboração da empresa Porto Lazer, a cidade organizou durante duas noites um festival que celebrou o blues.
O cariz do festival juntou um público de um grupo de idades mais avançado, no entanto a aura criada foi, sem dúvida alguma, muito jovial. Descontraído, tranquilo e acolhedor foram os adjetivos mais ouvidos da parte dos festivaleiros.
Além do palco, situado na Concha Acústica dos jardins do Palácio de Cristal, o recinto incluiu ainda inúmeras barracas de conteúdo variado que complementaram o elemento protagonista do festival: a música.
Na ala da restauração, a experiência de street food proporcionada foi desde comida tailandesa, responsável pelo aroma agridoce no ar, às típicas tripas de Aveiro e outros crepes, a uns «pecados salgados» que contrabalançaram o doce, e sobretudo aos sabores de Nova Orleães, trazidos pelo chef argentino Chakall. Os cheiros diversos que pairaram no ar abriram o apetite, sendo que quem por lá passava era tentado a acomodar-se nos bancos e mesas alinhados e a deixar-se levar pelos pequenos prazeres da vida.
O primeiro dia do festival iniciou a um ritmo tranquilo. Às 22h00, hora marcada para o início dos concertos, ainda chegavam pessoas que tomavam os seus lugares – ou em pufes e mantas espalhados pelo espaço, ou encostados a postes, ou ainda simplesmente de pé, precavidos para dançar.
Henrik Freischlader, músico alemão, foi o detentor das honras de abertura do festival. Acompanhada por mais quatro instrumentos, a voz de Freischlader pôs o público a balançar ao som de melodias múltiplas. Consoante a onda musical, as expressões do público viajavam de pensativas a sentimentais a puramente sorridentes. Nitidamente divertidos no palco, também o saxofonista, o teclista e o baterista tiveram os seus momentos a solo, enriquecendo a atmosfera. Sonoramente aplaudido no final, o grupo ainda estendeu o concerto a “só mais uma” música, reduzindo a sua intensidade de forma gradual e culminando numa nota que, suspensa, ficou a ribombar nos ouvidos.
A segunda e última banda da noite não só deu continuação às interpretações musicais como ainda aqueceu o ambiente e acordou as pessoas. A voz arrebatadora da cantora de Filadélfia, aliada a mais instrumentos dos quais ressaltou a harmónica, deu uma energia adicional ao festival. Juwana Jenkins, através de uma mistura de soul e rock, bem como de uma interação constante com as pessoas, fez com que estas se movimentassem mais, além do típico abanar de cabeças e de pés. Ter de apanhar um avião às seis da manhã não inibiu a cantora de se entregar por completo ao concerto, dançando de forma poderosa e cantando muitas obras inéditas em Portugal. Também prolongando o concerto o mais possível, o grupo conseguiu que na última música estivessem todos de pé a jubilar.
Não houve desânimo com o fim do primeiro dia de concertos – o público levou boa disposição para casa e altas expectativas para o dia seguinte.
Por entre os muitos rostos transeuntes no segundo dia do festival, viram-se vários comuns ao dia anterior. Um bom sinal: as pessoas gostaram e mantiveram o interesse pelos concertos vindouros. O público também se revelou mais experiente, trazendo toalhas e mantas consigo, embrulhando-se nelas, de modo a combater o frio indesejado.
Os concertos iniciaram com um blues “mais progressivo, mais agreste”, segundo o apresentador do festival. Gwyn Ashton, guitarrista “apelidado de ‘rei do feel’ por Robert Plant, vocalista dos Led Zepellin”, marcou uma forte presença. Bastou ele e a sua guitarra para preencher todo o palco, difundindo o som pelo recinto.
Introduzindo quase sempre os temas tocados com o lançar da pergunta “Are you ready?”, Ashton ofereceu um programa recheado e musicalmente composto, de onde sobressaíram na melodia os contratempos inesperados.
O guitarrista, pouco antes do final do concerto, não deixou de partilhar filosofias com os seus ouvintes, confessando que está a passar por uma “crise de identidade”, originada pelo mergulho fundo já de longa data no blues. Pelos vistos, quanto mais se mergulha no blues, “menos se sabe quem é”.
Por volta da meia-noite, chegou o momento mais esperado da noite: a banda portuguesa Minnemann Blues Band, que festeja os seus 40 anos de existência. Minnemann, vocalista e teclista alemão. com morada em Portugal desde 1973, e os seus três companheiros – um baixista, um guitarrista e um baterista, deram um concerto que foi, não só ao vivo, como realmente vivo. Digno de todas as expectativas criadas, a reação explosiva do público exteriorizou uma opinião comum: este concerto foi, seguramente, o highlight do festival. Solos vibrantes, diálogos musicais entre os instrumentos como que num jogo de pergunta-resposta, convívio e diversão, tudo num só palco – em poucas palavras, um puro blues.
Como a banda era portuguesa, conhecendo até vários espectadores pessoalmente os seus membros, o ambiente foi de grande proximidade e descontração. Inicialmente com quatro elementos em palco, no final já eram sete: ao longo do concerto, Minnemann lançava nomes para o ar e os músicos subiam desafiados ao palco para tocar com o grupo. Entre os convidados estiveram: um teclista, com solos de uma força intensa (talvez proveniente de se pôr em pé de língua de fora) e um jovem guitarrista. Esta última participação de cordas por Miguel Dinis resultou de um acordo entre o festival e a Academia de Guitarra do Porto, que premiou o melhor aluno com a possibilidade de este tocar com músicos profissionais.
A banda terminou o concerto com uma música que “deixam sempre para o final há já 40 anos”: a intitulada “Relax your mind“. Com um público triste a acenar para o palco e uma banda abraçada a fazer uma vénia conjunta, deu-se por encerrado um momento musical inesquecível.
Uma pequena sondagem pelas pessoas que costumam acompanhar o rumo do blues no Porto permitiu apurar que esta terceira edição contou com mais pessoas e com uma zona de restauração mais convidativa, comparativamente aos outros anos. “O festival tem vindo a crescer” e, após esta edição, tem tudo para continuar a evoluir no mesmo sentido.