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LUCA ARGEL TROUXE O BRASIL AO CCOP NO SEU ANIVERSÁRIO

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Luca Argel, ou Lucargéu, em português do Brasil, conta já com três álbuns publicados a solo, e também faz parte dos projetos Samba Sem Fronteiras, Orquestra Bamba Social e Ruído Vário, em que, junto com Ana Deus, dá música a vários poemas de Fernando Pessoa e heterónimos. Na quarta-feira, veio ao Círculo Católico dos Operários do Porto (CCOP) celebrar o seu aniversário com vários amigos e companheiros de profissão.

A presença de Luca em palco faz o auditório lotado do CCOP acabar gradualmente as conversas e desligar os ecrãs dos telemóveis. Mas primeiro o que vem primeiro: os parabéns. Antes do cantautor começar aquilo que seria uma noite introspetiva de dança e festa, o público cantou-lhe, em coro, os parabéns. Sem dúvida um sinal da boa disposição que se sentia e do que aí vinha.

O concerto começa com “Me Dá a Penúltima”, de João Bosco. Uma música, Luca admite, que “não era para ser a primeira, mas depois dos parabéns é a que melhor encaixa”.

O riso e a boa disposição estão instalados, numa noite em que o mais recente álbum de Luca Argel, Conversa de Fila, comemora três meses de vida. “Pisque Três Vezes” é o primeiro cheirinho do álbum, seguido de “Não Digo”.

Como a vida é mais bonita em conjunto, Luca Argel aproveita para chamar o seu primeiro convidado ao palco. Márcio Silva, melhor conhecido como Edu Mundo, vem abraçar Luca e dá um ar da mística da música luso-brasileira, uma verdadeira dança entre o sotaque carioca e o sotaque português. Ambos dialogam brevemente em palco, como amigos que são; Edu ri de como Luca é “como Chico Buarque, que dizia que não conseguia escrever com alguém a ver”, e diz que, portanto, tinha sido “um privilegiado” de ter escrito “Canto do Vento Frio” com ele. A dupla acaba a canção num abraço próximo, e Luca volta ao seu formato a solo.

“Privilégio para quem veio na minha festa de anos”, ri-se o brasileiro enquanto afirma que aquela é a primeira vez que os dois cantam aquela canção ao vivo. “Volta, Carlos”, diz Luca ainda a rir-se para chamar o seu fiel percussionista a palco.

Seguiu-se “Samba Invertido”, de Conversa de Fila, que, com as suas letras cómicas, causou animação e risos por toda a plateia. A mistura de cores amarelas e verdes ajudava a trazer o Brasil ao CCOP, enquanto soava também “Natal, Natal”, canção em que Luca Argel descreve, de maneira bem-humorada, a maneira como o Natal é celebrado no Brasil – com “pinheiro de plástico, calção de banho e neve de esferovite”. Houve ainda espaço para cantar “Boas Festas”, de Assis Valente, um hino natalício típico do outro lado do Atlântico.

O ambiente era de conforto e muito, muito riso. A voz aconchegante de Luca Argel, acompanhada pelo som da sua guitarra e pela sua poesia, carrega em si o poder de abraçar cada um dos ouvintes.

Luca Argel aproveita o momento de boa disposição para dar uma pequena contextualização sobre a canção que deu nome ao seu mais recente álbum – “Conversa de Fila”. Escrita enquanto estava, literalmente, numa fila para embarcar num avião, a letra agradou todo o público, tendo os mais atrevidos murmurado a letra em simultâneo com Luca. Houve até espaço no fim para brincar um bocado com a última frase do tema: “com a Dona Camila, que mora na vila da tia Priscila / E conhece um gorila, que só se depila em volta da…“, ficando no ar qual poderá ser a última palavra, tendo Luca acabado com o suspense com um: “da axila, pessoal… Da axila”.

Depois de “Pra Não Dizer Que Sou Mau”, Luca traz Bandeira ao CCOP com “Acanalhado”, que o público acompanhou ao longo de toda a sua duração.

Sendo o mote de todo aquele concerto o aniversário de Luca Argel, não poderiam faltar as homenagens a vários músicos que inspiraram a sua obra, como aconteceu em “Boas Festas”, de Assis Valente, e “Me Dá a Penúltima”, de João Bosco. Chegou, ainda, a hora de falar de Chico Buarque, que recebeu recentemente o Prémio Camões, e cuja canção “Doze Anos” inspirou a sexta música de Conversa de Fila – “Anos Doze”. Ambas falam saudosamente duma infância passada, no entanto, enquanto Chico Buarque relembra travessuras e dias passados lá fora, Luca Argel fala da sua infância muito mais nerd, passada, como diz a canção, “jogando Mario Kart num apartamento”.

Para dar seguimento ao ambiente nerd que se tinha instalado com “Anos Doze”, Luca Argel salta para “Estar o Ó, Ep. 2”, do álbum Bandeira, para fazer uma homenagem à franquia Star Wars.

Como nem tudo é festa e alegria, o concerto entra num momento de reflexão mais séria com “Vila Cosmos”, que acaba com total escuridão na sala. Luca Argel aproveita então para fazer um pequeno monólogo sobre a história de Conversa de Fila e das suas influências. “O Conversa de Fila ficou pronto quando o Brasil entrou num momento delicado”, confessa Luca. “No entanto, o samba é um género entre a alegria e a tristeza, a luta e a festa. O riso de Conversa de Fila serve como combustível enquanto brasileiro para com outros brasileiros que se vêem tristes, deprimidos e desesperançosos.

Após uma salva de palmas sentida de quem viu nas palavras de Luca Argel refletidos os seus pensamentos, o cantautor prossegue com “Ninguém Faz Festa”, novamente banhado por cores verdes e amarelas. Uma perfeita ilustração daquilo de que Luca acabava de falar, o samba nasce da necessidade do brasileiro inventar uma maneira de lidar com os seus problemas e com as tristezas da vida, um olhar em frente com o pensamento positivo de que tudo correrá bem. Aliás, Luca Argel afirma que a festa não nasce da felicidade e da alegria, mas sim da necessidade de afugentar a miséria e a depressão. Tudo lindamente conjugado com a letra daquela que é mais uma música do seu álbum de 2017, Bandeira.

Após uma breve passagem por “Rato! Rato! Rato!”, a segunda convidada da noite é chamada a palco. Ana Deus, com quem Luca Argel tem o projeto Ruído Vário, acompanha o brasileiro em “Barrow-on-Furness”, baseada no poema homónimo de Álvaro de Campos. Há ainda espaço para cantar uma canção “pré-Ruído”, dos tempos em que, segundo Ana Deus, ela “cantava músicas brasileiras com sotaque português e ele cantava músicas portuguesas com sotaque brasileiro”. Essa música é “Juízo Final”, de Nelson Cavaquinho.

A vontade de continuar a tocar e a celebrar o seu aniversário está longe de acabar, e a vontade do público de ir embora era também nula neste momento. Depois de Edu Mundo e Ana Deus, é a vez de Luca pedir aos seus colegas do projeto Samba Sem Fronteiras para se juntar a ele em palco, com os quais interpretou “Gentrificasamba”, uma canção que não estava planeada como parte do Conversa de Fila, uma vez que a sua génese está nos Samba Sem Fronteira e não a solo. Ainda assim, tendo-se mostrado como uma das músicas mais cativantes dos concertos de Luca Argel, este decidiu incluí-la no álbum. “Vocês não ficam chateados comigo, certo? Ainda bem, afinal a música é minha”, brinca o carioca com os seus colegas e amigos.

Os vários instrumentos dão toda uma nova sonoridade ao concerto, menos íntima, mas mais cheia. “Fita Amarela” de Nélson Gonçalves segue, com acompanhamento em força do público.

“Agora que está a ficar bom, é para terminar”, confessa Luca Argel, que mereceu mais uns parabéns cantados, desta vez com direito a arranjo musical do Samba Sem Fronteiras.

O samba-enredo da Mangueira trouxe definitivamente o Brasil até ao Porto, junto com “Peito Banguela”, cuja letra é da autoria de Aldir Blanc e que Luca Argel produziu em conjunto com Keso.

Sentia-se o fim da noite a chegar, os corpos já cansados ainda tinham energia para receber mais um bocado do Brasil, do samba, da paçoca e do pé de moleque.

Luca aproveita para contar a breve história de como, quase sem querer, acabou por integrar um disco de homenagem a José Mário Branco, que inclui uma versão sua de “Queixa das Almas Jovens Censuradas”, uma canção baseada no poema homónimo de Natália Correia.

Para acabar definitivamente a noite, Luca Argel agradece fortemente a todos os que celebraram o seu 31º aniversário com ele, dedicando, em tom de brincadeira, a última música da noite – “Calote” – a Joe Berardo.

Dançou-se, cantou-se, riu-se e sentiu-se neste que foi o aniversário de Luca Argel no auditório do Círculo Católico de Operários do Porto. Um riso que vem não só da alegria e da felicidade, mas da procura de respostas e soluções para os problemas da vida e para os momentos difíceis. Os leves acordes da guitarra, enaltecidos com as letras e a voz de Luca Argel conseguem quase que dizer-nos “tudo estará bem”. Parabéns, Luca!

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