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Cultura

O AMOR É O JOGO DE ACASOS QUE SE VÊ

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O Jogo do Amor e do Acaso, que conta com a encenação de Roberto Merino, esteve em cena na Sala do Tribunal do Mosteiro de São Bento da Vitória, uma sala intimista, na qual o público passou oitenta minutos de esquecimento, enredado nos malabarismos das personagens.

Com interpretação dos alunos finalistas da licenciatura em Teatro da ESAP, a comédia escrita pelo dramaturgo francês Marivaux, em 1730, encena o amor e as suas surpresas a partir de um imprevisível e ambíguo jogo de máscaras, cómico e ousado, que questiona a ordem estabelecida.

Sílvia e Dorante viajam no interior de um “Jogo”, em três atos, que permite testemunhar a genialidade dramática de um autor que é celebrado pela sua particular “metafísica do coração”.

A peça inicia-se com uma extensa dissertação sobre as questões morais de um indivíduo, em particular relativamente ao casamento. No caso, a protagonista Sílvia começa a dissertar a respeito de um homem abstrato, desconhecido, a quem lhe foi prometido o casamento pelo pai. Num ato audaz pede ao pai autorização para que, quando o noivo a vier visitar, troque de lugar com a sua criada, a fim de poder analisar o caráter do futuro marido de forma mais imparcial. O pai consente, perspetivando já o imbróglio que se formaria, porque fora já informado pelo pai do noivo que este tivera a mesma ideia. Desta forma, os noivos conhecer-se-iam como meros criados, explorando o seu íntimo sem a pressão social oriunda de casamentos arranjados e de um futuro prometido pelo dinheiro.

Sílvia e Dorante, com a rebeldia própria de uma juventude que quer afirmar a sua personalidade e o seu direito de escolha, decidem trocar de papel com os criados, Lisette e Bourguignon, para estudar o respetivo noivo, encobertos pelo disfarce. Os criados, no falso papel de amos, desempenham um papel caricato de enamorados, com linguagem própria da paródia grotesca, representando o núcleo mais cómico do enredo.

O tema do disfarce e da troca de “vidas” está presente nas peças de Marivaux, chegando ao duplo disfarce nesta obra, num período histórico de grande diferenciação social. O autor contesta e imprime às suas personagens características muito marcadas das suas origens que superam as aparências. No desenrolar das duas farsas, o espetador assiste a duas peças paralelas: a comédia dramática de Sílvia e Dorante, cujos sentimentos um pelo outro crescem graças ao convívio mais próximo próprio do serviço doméstico; a commedia dell’arte representada por Lisette e Arlequim, que desajeitadamente se tentam seduzir, camuflados por roupas dos patrões e íntimos de convenções sociais, que contribuem para a caricatura da época.

O Jogo do Amor e do Acaso é uma comédia em todos os sentidos: uma comédia de erros, em que um equívoco inicial gera uma série de situações hilariantes e, por fim, é uma comédia clássica em que “rindo se corrigem os costumes”. No final, cada uma das personagens encontra (moralmente) o seu lugar.

A cenografia serve-se de espaços vazios e movimentações em palco que reproduzem as próprias exigências da mente humana, as opiniões e anseios que mudam constantemente e até os desejos mais secretos. No encanto da representação, cada ator traduz o espírito da sua personagem, numa argumentação repleta de vivacidade e humor, um cunho de Marivaux.

Produzida em parceria com o Teatro Nacional São João (TNSJ), a peça encerra o ciclo As Escolas no TNSJ, que incluiu apresentações de alunos do Balleteatro Escola Profissional e da Escola Superior de Música, Artes e Espetáculo. 

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