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Cultura

Unorthodox: Olá smartphone, onde está Esty?

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Unorthodox, minissérie (tomemo-la por um maxifilme) acabada de sair do forno da Netflix, é uma clara demonstração da multiplicidade de realidades construídas que podem definir o mundo.

Neste caso, deparamo-nos com uma comunidade judaica ultraortodoxa instalada no bairro de Williamsburg, em Brooklin, que funciona segundo princípios religiosos de restrição e conservadorismo extremos. Por descender diretamente das vítimas do Holocausto, é uma comunidade com uma grande preocupação relativa à proliferação da descendência judaica, pelo que, se um casal não tem logo filhos passado um ano desde a sua noite de núpcias, então algo está de errado: e a mulher é a responsável.

Em Nova Iorque, os dias de Esther Shapiro (interpretada por Shira Haas) são limitados por deveres e restrições: não pode cantar, não pode mostrar os braços, não pode falar antes do homem, (…) não pode, não pode. Com 19 anos, Esty casa-se com Yanky, seguindo o rumo pré-definido da mulher na sua comunidade, e passa a ter de cozinhar, ter fazer o marido sentir-se “como um rei” durante as relações sexuais, ter de procriar, ter de, ter de.

Mas a verdade é esta: Esty pode e não tem de.

E é esta libertação que a protagonista vai procurar em Berlim, fugindo de um casamento arranjado por matchmakers e do local cuja familiaridade transgrediu para um sentimento de sufoco.

https://www.youtube.com/watch?v=-zVhRId0BTw

Unorthodox é baseada num enredo verdadeiro, mas com desenrolares ficcionais. Durante os seus quatro episódios, ficamos a conhecer a história de uma rapariga que larga tudo e vai sem nada ao encontro da multiculturalidade de Berlim. Esty fazia parte de uma comunidade onde os jovens não sabem como a Internet funciona, não sabia pedir sequer um café americano e, da mesma forma, não tinha permissão para ter acesso aos telemóveis que se autodenominam de inteligentes.

No entanto, encerra uma maturidade precoce desconcertante, por ter crescido num ambiente onde já se tem de ser adulto quando ainda mal se saiu do casulo.

É uma série que se desenvolve por meio de pulos no tempo e, consequentemente, por mudanças de cenários, vidas e perspetivas, as quais se refletem na própria evolução psicológica e física de Esty.

Esta é a história sobre o escape de uma vida. Uma vida que lhe fechava os olhos para aquilo que, para nós, é tão claro e inquestionável. Tanto que, na maior parte das vezes, nem precisamos de os abrir para sabermos da sua existência.

Este novo vislumbre leva-a à descoberta do seu próprio caminho e do sabor da liberdade.

Liberdade esta com a qual, na nossa sociedade, se acorda e se adormece sem se dar verdadeiramente conta, por estar misturado com o sentimento de normalidade que nos está incutido. Mas é, precisamente, essa sensação que nos salva de uma desorientação crónica, e acorda o nosso desinteresse e apatia para com o mundo.