Crónica
Ver arte, senti-la, vivê-la
Hoje faço uma ode à arte. Uma ode a Leonardo da Vinci, uma ode a todos os grandes nomes que a História entoa, uma ode aos pequenos cuja memória desvaneceu, porque todos nesses existiu graça e um desejo de criar.
Ouvi algures que o que nos separa dos outros seres vivos nem tanto é o intelecto, uma vez que os avanços da ciência nos têm demonstrado que, mais ou menos, todos os animais têm capacidade de juízo. O mundo animal, tal como nós em todas as outras áreas da ciência, procura resolver problemas que vão de encontro à natureza da sobrevivência. Conquistámos a agricultura para não sermos vítimas das condições agrestes e termos sempre alimento; desenvolvemos as ciências para domarmos a natureza e darmos qualidade de vida ao Homem; inventámos as letras para podermos comunicar; e, após termos concretizado uma Sociedade, criámos as ciências económicas e políticas para tudo isto ser administrado. Como uma alcateia, cada elemento desempenha o seu papel. E a sociedade prospera.
E a arte, onde se encaixa nisto tudo? Embelezar, estar mais próximo do divino? Levantar questões inicia um ciclo incessante de perguntas, e todas elas me parecem redutoras do conceito de arte – que, em cada momento da história, envergou por caminhos diferentes, com linguagens diferentes, por meios diferentes.
Pensemos na pirâmide de Maslow, que visa organizar as diferentes necessidades do Ser Humano: será que a necessidade de ter e fazer arte, se encontra no topo ou na base? Precisamos tanto de arte como necessitamos de respirar, ou apenas quando todas as outras necessidades estão cumpridas é que a arte floresce?
Talvez Leonardo concordasse que para ele a arte seria como respirar. Nem todos podemos ser “Leonardos”, mas todos podemos, nas palavras de Saramago, podendo ver, olhar e podendo olhar, reparar. Se te dissesse, querido leitor, que vivemos cegos talvez não acreditasses em mim. Então, sugiro-te o seguinte exercício: já pensaste como são as casas da tua rua? Que altura têm, quantas janelas, de que cor são? Como era a textura da camisola da senhora que se sentou ao teu lado no comboio?
A verdade é que as coisas só existem se as notarmos e lhes dermos existência, e arte permite-nos ver e conhecer o que está diante dos nossos olhos. O artista materializa o intelecto, expressa algo além daquilo que vemos, e faz uma triagem do que quer e como quer representar. A pintura é coisa mental, revelava Leonardo da Vinci.
“La pittura è cosa mentale”
Se disto não retirares nada, se fores capaz de viver num mundo onde a arte não é critério, onde não se produz música, pintura, arquitetura, cinema, teatro, performance, escultura… Espero que retires ao menos que viver com atenção redobrada dá uma cor especial às coisas. Porque, tanto quanto sei, apenas vivemos uma vez, e o valor de uma pessoa reside sobretudo na capacidade de ver Beleza em qualquer coisa.
E o que é isto, senão a forma mais pura de Arte?
Artigo da autoria de Catarina Fernandes