Cultura
“Labirynth”: um convite ao Corpo
Labirynth decorreu na cave do Café au Lait, nas Galerias de Paris. Neste espaço escuro, a que chegamos depois de descermos umas escadas íngremes, é-nos apresentado algo que vai para além de uma simples exposição de fotografia. Uma instalação artística que se assemelha a um labirinto, onde o Corpo e o Ser são convidados a se perderem.
A exposição integra composições com elementos variados, desde lã, lençóis, arames e plásticos, tudo combinado numa harmonia peculiar com as obras fotográficas. Segundo Diogo Oliveira, um dos autores da exposição, todos os materiais utilizados “vieram da raiz”, “do campo e de casa da Inês e nós conferimos-lhes outro propósito”.
Inês Vieira expõe uma série fotográfica designada “Cuarto”, em que explora o nu feminino. Inspirando-se em nomes como Marina Abramovich, Yoko Ono, Ana Mendieta e Carolee Schneemann, a artista estuda o corpo feminino pretendendo superar a sexualização a ele associada.
Em Labirynth, Diogo Oliveira apresenta uma série de autorretratos também focados no corpo humano. Nesta série é explorado o conflito entre o corpo e o animal, a dualidade entre o lado Humano e o Ser, a constante luta que habita no cerne de todos nós.
Todas as obras expostas por Diogo são registos de momentos performativos em que o artista explora os limites do corpo e o apresenta ao espetador de forma provocatória, procurando exibir o imenso poder de um corpo maleável, e com fronteiras moldáveis.
A acompanhar a exposição estava a performance de Nuno Fareleira, que, utilizando plásticos a envolver o corpo e a cara, se movimentava de forma quase animalesca. Servindo-se de um instrumento de ferro durante a performance, o artista produzia sons metálicos acutilantes, que se assemelhavam ao som de correntes a serem arrastadas pelo chão. No final da sua atuação, Nuno acaba sentado de pernas cruzadas, e vindo do público ouve-se um sussurro:
“Parece que acabou de nascer”
A exposição contou também com a participação das artistas Rita Galanó e Angela Ugarte, enquanto curadoras e integrantes do coletivo Sobjetivo.
“Cuarto”: “o poder do nu feminino” na obra de Inês Vieira
Inês Vieira, nascida em Barcelona, reside atualmente no Porto. Em conversa com o JUP, no final da exposição, a artista referiu que o seu percurso escolar teve bastante influência na sua obra. “Frequentei um colégio americano até aos 15 anos, só depois é que ingressei na escola pública. Esta mudança fez-me sair da ‘bolha’ onde me encontrava e foi a partir daí que me tornei mais política e desenvolvi consciência social.”
Destaca também o papel de uma docente da FBAUP, Rita Castro Neves, que lhe permitiu expandir as suas conceções da arte “para algo mais moldável e livre”, do que Inês julgava ser.
A artista salientou ainda que as temáticas relacionadas com o género e a sexualidade têm sido o objeto das suas obras há bastante tempo, “e do meu pensamento ainda há mais”, aponta.
“Sinto uma necessidade pessoal e política de entender os mecanismos com os quais funciono, e entender quais os que me pertencem a mim e quais são do mundo exterior e não meus. O que eu sinto realmente meu, e o que eu sinto por imposição.”
No que concerne ao corpo feminino, objeto central das suas obras, a artista destaca que “ver o nu feminino em contextos que não sexuais é extremamente poderoso”, sublinhando que sempre sentiu conforto no seu próprio corpo, mas que “elementos externos” a si lhe impuseram noções de “vergonha” e “culpa” que agora tenta desconstruir no seu trabalho. Inês frisou ainda o papel dos outros artistas que participaram na elaboração da exposição, “há uma união no nosso trabalho. Lidamos com a liberdade, com a autonomia e com a delicadeza que é o Ser e o existir num mundo que espera tanto de nós”.
“Olhar corpo a corpo” com a série de autorretratos de Diogo Oliveira
Diogo Oliveira vem de São João da Madeira e mudou-se para o Porto no último ano. Confessa-nos que vir para o Porto foi imperativo para poder “ganhar liberdade” e “desenvolver o seu potencial artístico”.
O fotógrafo não tem uma formação superior no campo das artes, tendo, contudo, formação em dança contemporânea, algo que considera influenciar muito os seus trabalhos. “Sinto a necessidade de expressar o corpo a voltar a mim de outra forma”.
Com as suas obras, cujas grandes referências são os artistas Francis Bacon e Antoine D’Agata, o artista procura “criar uma constante provocação”, através da exposição do corpo de forma “animalesca”. Realça que o ser humano sente necessidade de se “ver no outro” para poder estabelecer empatia. Nesta série fotográfica, Diogo apresenta um corpo, mas “não da forma que querem”.
Para o artista, explorar as várias facetas do corpo materializa-se não num projeto, mas “numa necessidade”, longe de terminada. Por fim, o fotógrafo confessa que ainda quer “aprofundar ainda mais o trabalho fotográfico e enveredar também pela área da performance”.