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Cultura

A DYSTOPIA BRILHA LÁ AO LONGE

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A sala está escura. O silêncio é rapidamente substituído por sons arrastados e altos que acompanham o também grave cair de uma cortina toda dourada. Quando se começa a perceber o quão brilhante o pano é, este apaga-se no meio de fumo sem que nada se possa fazer. Mas eis que, numa confusão de luzes e flashs, a cortina reaparece e, como fundo, quatro vozes partilham um microfone fixo.

Dystopia é a segunda instância de uma trilogia que explora a ideia do “lugar”, agora transformado num “mau-lugar”. A Trilogia do Lugar Utopia (2013), Dystopia (2014), Heterotopia (2015) – é um projecto plurianual de investigação e criação no campo das artes performativas realizado a partir da desconstrução de textos já publicados.

Inspirada na obra 1984 de George Orwell e no autor argentino Jorge Luis Borges, a peça critica a sociedade atual, onde a imagem de tudo é “uma bota a pisar um rosto humano para sempre”. Medo, raiva, humilhação e triunfo são palavras de ordem e nos 90 minutos que dura esta experiência ainda há tempo para se falar num Deus e na sua mensagem – mas que Deus e que mensagem?

Enjauladas por uma cortina preta esfiapada, as quatro personagens despem-se e vestem-se de roupas e preconceitos enquanto são apresentadas. A nudez apresentada, sinal da natureza humana elevada ao expoente máximo, mostra o quão cru o ser humano pode ser e o quão desconfortável realmente se sente nessa pele.

Do embrenhado de corpos que é muito mais que quatro corpos e não passa em simultâneo de uma só pessoa em estados diferentes, surgem pensamentos sobre o tempo e uma obsessão bem presente pelo passado.

Com coreografias contemporâneas que sobre a forma de linhas e gestos abruptos transmitem uma ideia de autoflagelação, a cortina é calcada por personagens que se julgam mortos, consumidos pela luxúria, indecisão e pela ideia inconcebível da ortodoxia. O ideal da terra dourada é representado de modo tao etéreo que quando a cortina dourada é violentamente arrancada por duas das personas se prova que, afinal, apesar dos tons dourados e prateados, não passa de plástico e que até essa ideia tinha um falso valor.

Sem se dar por isso e sem aviso prévio, também o público é puxado para esta realidade desconcertante. Ofegantes, a audência é fixamente fitado por uma persona que fala calmamente de assuntos inquietantes e que jura que nos “havemos de encontrar num lugar onde não há trevas”. Infelizmente, também ela não sabe onde é esse lugar.

O Ponto Teatro, sob a encenação de Emanuel de Sousa, terá a peça em cena no Teatro Helena Sá e Costa, Porto, dias 16 a 26 Outubro QUI – SAB, 21:30 e DOM, 16:00.

 

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