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Cultura

RIVOLIVRE

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cultura_gif1 Rivoli_Ana FroisEm 1913, o Teatro Nacional foi inaugurado com pompa e circunstância, em pleno coração da Invicta. A sua programação incluía óperas, concertos e teatro, sendo a sala com maior lotação do país. Todavia, mudanças na baixa portuense obrigaram a sua renovação e, entre 1928 e 1932, o edifício sofreu obras, sob a direção do arquiteto Júlio José Brito. Em janeiro, já adaptado para a exibição de cinema, o teatro então apelidado de Rivoli abria as portas com a peça “Peraltas e Sécias”, de Marcelino Mesquita.

A partir daí, D. Maria Borges levou o Rivoli à sua época áurea com uma programação rica e entusiasmante, particularmente em música e ópera. Contudo, os anos 70 deram a conhecer ao Rivoli um período de decadência, sem programação regular e falta de público. Dez anos mais tarde, foi adquirido por uma sociedade de construções, que pretendia demoli-lo e construir um complexo imobiliário. Foi o Município do Porto que impediu a demolição e, em 1989, veio a comprar o Teatro. Quatro anos mais tarde, Isabel Alves Costa assumia o cargo de diretora artística.

 

A celebração da “Rivolimania”

Isabel Alves Costa, fundadora e diretora do aclamado Festival Internacional de Marionetas do Porto, teve um papel fundamental na dimensão cultural da cidade. A sua intervenção no Rivoli foi das mais valiosas e marcaria uma época de ouro na história do Teatro. Após a sua morte, em 2009, diversas personalidades testemunharam sobre a falta que ela faria, tanto aos amigos como à cidade. No ano de 1993, quando assumiu o cargo de diretora artística, revelou que “gostaria que o Rivoli se tornasse num lugar onde as contradições circulem, onde o espírito se manifeste, (…) onde o público não se contente em assistir aos espetáculos, mas que deles fale.” De facto, no ano seguinte, apresentava o programa “Rivoli Vazio”, que tinha como princípios a formação, a experimentação, a criação e a partilha e que incluía programas dinâmicos como “Nascer da Noite” ou “Chá das Seis”. Isabel Alves Costa utilizaria a palavra “Rivolimania” para se referir à epoca frutífera do Teatro.

Todavia, as questões financeiras impor-se-iam à programação e a própria diretora artística viria a revelar que, em 2005, “a impossibilidade crescente de poder programar levaria a que, a pouco e pouco, o Rivoli fosse sendo transformado num mero espaço de acolhimento, numa barriga de aluguer. Perdia-se uma ideia de programação a troco de uma calendarização“. No ano seguinte, a Câmara do Porto decidia entregar a gestão financeira e cultural do Teatro Rivoli a entidades privadas.

 

O “peça a peça” de La Féria

No final de 2006, foi elaborado um contrato válido por quatro anos que entregaria a gestão do Rivoli à Todosaopalco, empresa de Filipe La Féria, a partir do dia 1 de maio de 2007.

A entrega do Rivoli a La Féria, durante os mandatos de Rui Rio, ocorreu com muita contestação. Em 1996, o Munícipio do Porto havia promovido a constituíção da Culturporto, uma associação sem fins lucrativos responsável pela programação do Rivoli. Com a privatização da gestão do Teatro Municipal, a Culturporto foi extinguida e os seus trabalhadores foram despedidos. Um processo foi iniciado no Tribunal da Relação, que considerou ilícito o despedimento dos ex-trabalhadores. Estes exigiram então a sua reintegração, fazendo um ultimato à Câmara do Porto. Numa guerra continuada, a Autarquia recorreu ao Supremo Tribunal de Justiça, que, por fim, acabou por dar razão à Câmara Municipal.

Por outro lado, inúmeros elementos do corpo artístico portuense insurgiram-se contra a entrega do Rivoli a La Féria, e em 2006, o Teatro foi ocupado por parte do elenco e espectadores de uma peça após esta terminar. “Rivolição” foi o nome da ação e o Movimento Juntos no Rivoli ergueu-se. No entanto, nada foi impedido e La Féria estreou imediatamente o teatro com “Jesus Cristo Superstar”, peça por si produzida e encenada. Desde aí, viveu-se a era do encenador, que foi apelidada pelos ex-trabalhadores do Rivoli, como a época do “peça a peça” de La Féria, uma vez que o teatro abria as portas quase exclusivamente para apresentar peças do encenador. Tal fez com que a sua dimensão local, nacional e internacional fosse sendo perdida e a proximidade do Rivoli ao seu público fosse diminuindo.

 

cultura_pgdireita1_Ana FroisDepois da Rivolimania e da Rivolição, Rivoli-quê?

Rivoli Já Dança!“. Este é o nome dado ao ciclo de dança que ocupa agora o Rivoli, mas poderá porventura denominar a nova fase na vida do Teatro Municipal. O ciclo, que teve início de lotação esgotada a 12 de setembro, com a Companhia Nacional de Bailado, e que acaba em dezembro, ilustra com perfeição o que se espera alcançar com o renascimento do Rivoli: pô-lo a dançar, os pés a pisar o chão do teatro com o hush-hush de antigamente. O vereador da cultura, Paulo Cunha e Silva, explicou que o preço do passe geral do espetáculo, 25€, que inclui 15 atuações, mostra que o Rivoli está “aberto a toda a gente”.

Embora “Rivoli Já Dança!” não tenha tido intervenção do novo diretor artístico, o ciclo já funciona como promessa para a programação futura. Tiago Guedes, coreógrafo de 36 anos, é ex-diretor do Teatro Virgínia, de Torres Novas, e foi escolhido por concurso público para dirigir o recentemente criado Teatro Municipal do Porto, resultante da fusão do Rivoli com o Teatro do Campo Alegre. No entanto, esta transição não tem sido nada senão controversa, já que o novo diretor artístico, em entrevista ao Público, põe em Filipe La Féria a responsabilidade pelo mau estado em que o Rivoli foi deixado. Aliás, estas alegações levaram a que Pedro Carvalho, vereador da CDU na Câmara do Porto, propusesse uma auditoria à gestão do Rivoli desde a extinção da Culturporto.

A proposta tinha como principal intuito o apuramento de “todas as consequências para o Munícipio do Porto da decisão de entregar a gestão do Teatro Rivoli a uma empresa privada”. Para além disso, a CDU reitera a importância em esclarecer quais as verbas que a câmara terá de dispor para devolver ao Rivoli a sua “forma original“.

A proposta foi, no entanto, chumbada na Assembleia Municipal do Porto, tendo sido criticada por vários partidos. André Noronha, do PNP, considera que “não vale a pena andar a cavalgar esta mula velha e cansada“, já o PSD acusa a CDU de pretender “um encontro de contas com o passado“. Por sua vez, Manuel Pizarro, do PS, mostra que a Câmara se encontra indisponível para “caças às bruxas“. No que lhe diz respeito, Rui Moreira, presidente da Câmara, não se revê nas críticas feitas por Tiago Guedes. No entanto, a CDU insiste na importância de se conhecer a sua veracidade.

 

cultura_gif2 balanchine_Ana FroisTeatro do Campo Alegre, o irmão mais novo do Rivoli

Agora de mãos dadas ao Teatro Rivoli, o Teatro Campo Alegre (TCA) vai apresentar uma programação diferente: enquanto que o Rivoli vai acolher grandes produções, tanto nacionais como internacionais, o TCA trará ao palco produções locais. Aliás, Tiago Guedes pretende lá instaurar um “laboratório creativo“, espaço onde as companhias portuenses possam ensaiar, produzir e apresentar os seus espetáculos. O diretor artístico vai mais longe e fala em juntar as equipas dos dois teatros, já que o Rivoli se encontrava quase tão desprovido de pessoal técnico como de programação, contando apenas com seis pessoas, enquanto que o TCA tem já uma equipa completa.

O Teatro do Campo Alegre era gerido pela agora extinta Fundação Ciência e Desenvolvimento, da Câmara Municipal, e promete servir não só o público como também os artistas.

 

Rivoli hoje e amanhã

A preocupação do público acerca do futuro do Rivoli fez-se ouvir ao longo dos anos e, no início de 2014, começava a circular a petição online “Teatro Municipal: Que Serviço Público?”, assinada, até à data, por 238 pessoas.

O título dado à parelha Rivoli-TCA não será ao acaso: o Teatro Municipal servirá agora o município e os seus munícipes, como há muito não acontecia. A própria junção dos dois teatros serve esse mesmo objetivo – dar um propósito específico a cada um deles permite chegar a mais pessoas, adotando programações diferentes e abrangentes.

O futuro deste “novo” Rivoli é incerto, mas a cidade anseia por um novo ciclo, uma nova página na história do Teatro. Numa altura em que os eventos culturais se multiplicam pela Invicta, há já uma geração de jovens que não tem memória dos anos em que o Rivoli trazia alegria à cidade. Esta nova fase poderá porventura mudar isso e mostrar que o Rivoli está livre para voltar a dançar com toda a gente e oferecer muito a todos. Circo, marionetas, teatro, cinema, dança. Faça-se a festa.

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