Cultura
RUA MIGUEL BOMBARDA: O EPICENTRO DA ARTE NO PORTO
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Rua Miguel Bombarda. Fotografias por Bruna Neto.
A rua Miguel Bombarda é um oásis artístico em plena Invicta. Apelidada também de Porto Art District, a extensão de 650 metros alberga mais de doze galerias artísticas, que coexistem com espaços também muito carismáticos, tais como salões de chá, lojas de especiarias, hostels, restaurantes inovadores, mercearias e muito mais. Todos estes aspetos conferem a esta rua uma singularidade incomparável e um papel de destaque na rota turística portuense.
Ao longo dos anos, a rua tornou-se um ponto de referência para os colecionadores e amantes de arte, que a procuram não só para completar as suas coleções, como também pelo bel-prazer de admirar uma obra de arte. Anteriormente chamada de rua do Príncipe, passando em 1910 para o seu nome atual, a rua Miguel Bombarda é conhecida por rua das galerias há mais de 30 anos, dada a extrema naturalidade com que artistas abriram ali as suas galerias, gerando uma dinâmica cultural e artística reconhecida a nível mundial. Os estilos são muitos, mas todos no ramo da arte Contemporânea, mais ou menos vanguardistas. Cada uma é única e funciona de forma muito diferente.
Quadrado Azul
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Galeria Quadrado Azul. Fotografias por Bruna Neto.
Aberta há mais de 30 anos, a galeria Quadrado Azul tem já dois espaços, um em Lisboa e outro no Porto, sendo este último o principal. Foi uma das primeiras galerias em Miguel Bombarda e “foi um acaso as primeiras virem e as outras virem atrás”, conta Gustavo Carneiro, um dos dois diretores da galeria.
A Quadrado Azul é uma galeria de arte contemporânea que conta com um conjunto de artistas que representa, não só no seu espaço, mas também em feiras, exposições e outros eventos, em Portugal e no estrangeiro. O espaço em Lisboa sucedeu o do Porto e serviu, maioritariamente, para atingir mais público. Todavia, nesta decisão pesaram também os muitos clientes e artistas desta zona com quem trabalham.
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Fotografias por Bruna Neto.
O público é muito diversificado – “toda a faixa etária, todos os estratos sociais e quer nacionais como internacionais”. Estas são as palavras do diretor, que reforça ainda o papel de grande importância da arte na educação, aproveitando a deixa para justificar as frequentes visitas de escolas e alunos universitários à galeria.
Questionado sobre a subsistência da galeria, Gustavo Carneiro metaforizou a arte como “espelho da economia”, uma vez que não é um bem prioritário: “vai funcionar em função das crises: em primeiro está a alimentação, a roupa. A arte é a primeira a ser posta de parte”.
Com a nova vaga de turismo no Porto, a Quadrado Azul prevê um futuro risonho no que toca aos visitantes e compradores, pois apesar da diminuição de compras de instituições e do estado, há cada vez mais turistas que compram e visitam a galeria. Não obstante, os portugueses, principalmente de classe média alta, “continuam e ir comprando e são esses clientes que compram com alguma regularidade que nós ajudamos a não serem só clientes, a serem colecionadores”, diz o diretor, que afirma a galeria como uma via promissora para completar coleções.
Papa Livros
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Galeria Papa Livros. Fotografias por Bruna Neto.
Adélia Carvalho é o rosto de Papa Livros, uma galeria dedicada à ilustração. Neste espaço, as tarefas são muitas e Adélia realiza tudo com visível paixão: “Informo os clientes, quer em relação aos livros, quer em relação à ilustração, conto histórias, escrevo (quando tenho tempo), planifico alguns livros, porque também sou editora e recebo os amigos”, diz, entre risos.
A verdade é que a familiaridade deste espaço é inquestionável. A galeria está dividida em duas partes: uma parede com livros e outra, paralela, com molduras de ilustrações, “são, na verdade duas galerias”, afirma a dona, uma vez que o próprio livro acaba por ser uma galeria independente.
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Fotografias por Bruna Neto.
A história de Papa Livros é “uma história relacionada com as histórias”, uma vez que a intenção principal é mostrar ao público que os ”livros ilustrados, para crianças, para jovens são verdadeiras formas de arte”, explica Adélia.
Quando questionada sobre a escolha da localização da galeria, para Adélia a resposta é simples: “Porto porque é onde vivo e onde sou feliz”. A galeria realiza muitas atividades, desde conversas sobre escrita e ilustração, apresentação de livros e ilustradores, horas do conto e inaugurações de exposições, sendo o público mais frequente os estudantes de ilustração, pais, educadores, professores e crianças.
Para a Papa Livros o futuro passa por uma palavra: inovar – reinventar, realizar novos eventos e aumentar o catálogo de edições e ilustradores. No fundo, “estar sempre a lembrar que existimos!”, conclui Adélia, que se mostra orgulhosa deste espaço tão criativo e singular.
Usar o Tempo
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Galeria Usar O Tempo. Fotografias por Bruna Neto.
A porta 561 da Rua Miguel Bombarda alberga a galeria Usar o Tempo há já 7 anos. “O estilo da galeria é muito diversificado (…) é uma coletiva”, declara a dona, Adélia, e a verdade é que diversidade é sem dúvida a palavra que caracteriza este espaço.
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Fotografias por Bruna Neto.
As paredes estão pintadas com quadros de nomes nacionais e internacionais, recebendo novidades semanalmente. Esculturas de autores de todo o mundo povoam mostradores e mesas, antiguidades e instalações artísticas conferem a este espaço uma singularidade única, em que a aparente desarrumação imana criatividade. Para além da arte, vêm, de todo o mundo, colecionadores e admiradores que fazem deste local um pequeno museu.
O primeiro espaço surgiu em Leiria, mas a vontade de abrir uma galeria no Porto existiu sempre. E é na vontade de sediar uma galeria no Porto que surge a principal dificuldade: alçar com os elevados custos de possuir um espaço em plena baixa portuense.
Usar o Tempo encarrega o tempo de lhe mostrar os próximos caminhos, “E planos para o futuro? Não sei…o tempo é que vai dizer!” afirma a dona entre risos.
Autoria
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Galeria Autoria. Fotografias por Bruna Neto.
Abrigada pelas paredes do CCBombarda, encontramos “Autoria”, uma galeria e oficina de joalharia contemporânea, criada por Cristina Roque e Inês Sobreira, duas amigas e ex-membros da direção da PIN – a Associação Portuguesa de Joalharia Contemporânea. Foi Cristina quem abriu a porta e nos contou sobre as raízes da galeria, que nasceu da vontade de Inês Sobreira de abrir um espaço de atelier onde pudessem estar – “lançou um repto assim de repente e eu aceitei” – seguiu-se uma pequena pausa e um grande sorriso – “e agora estamos muito contentes”.
Tendo uma amizade como base e uma paixão pela arte joelheira, a “Autoria” mostra-se uma galeria multidisciplinar, expondo não só peças das duas donas, mas também de outros artistas nacionais e internacionais. “Cá na galeria existem novos artistas a cada inauguração, tendo pontualmente escultura ou fotografia”, explica.
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Fotografias por Bruna Neto.
Priorizando o plástico e outros materiais menos nobres – não colocando esses totalmente de parte – a joelharia contemporânea mostra-se diferente daquilo a que o público foi habituado e era esse o medo da artista – “eu era um pouco cética, eu achava que as pessoas não iam manter um espaço destes aberto (…), mas isto excedeu as minhas espectativas. Tem estado a funcionar muito bem. Tem tudo corrido muito bem”, conta-nos Cristina.
A cada inauguração simultânea das galerias da Miguel Bombarda, esta abre com novas exposições, novos artistas e intercâmbios com outras galerias. Cristina partilha um cheirinho do futuro: um trabalho em tempo real com uma galeria em Barcelona – as mesmas em espaços diferentes com públicos diferentes e uma ligação em streaming que permite as artistas acompanharem a interação do público. O conceito diferente adequa-se ao quadro futurista onde esta galeria se insere.
Ó! Galeria
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Ó! Galeria. Fotografias por Bruna Neto.
A Ó! Galeria é dedicada à ilustração e soma oito anos de existência. Tendo o seu berço no CCBombarda, nasceu e foi crescendo à medida que se descobriam novos ilustradores e clientes, até que deixou as paredes do centro comercial e se mudou para o número 61 da Miguel Bombarda, onde permanece.
Com centenas de trabalhos de mais de 70 autores nacionais e internacionais, esta galeria enche as paredes de ilustrações, formando um conceito único na cidade do Porto, onde a ilustração “funciona como arte pendurada na parede, (…) como uma obra de arte independente.”
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Fotografias por Bruna Neto.
No ano passado abriu uma nova galeria em Lisboa, os mesmos artistas e o mesmo conceito, mas as diferenças entre as suas cidades refletem-se na afluência. Tina, ilustradora e auxiliar na gestão da galeria, conta que o negócio corre com mais facilidade no Porto e, referindo-se à capital, diz que “a cidade é gigante e há muita coisa a acontecer ao mesmo tempo e o público às vezes não consegue chegar aos eventos ou nem sabe”.
É a singularidade do projeto que faz a galeria desenvolver, que, mesmo tendo duas galerias no país, continua a trabalhar e procurar por mais. “A patroa está sempre a procurar novos artistas” e a fazê-los representar: mensalmente há uma exposição de um artista e duas vezes ao ano existem exposições coletivas – uma no Natal e outra no Verão – onde todos os ilustradores são convidados a participar mediante o tema previamente definido pela direção da galeria.
O JUP conheceu algumas das galerias que ocupam esta rua, mas muitos outros espaços singulares ficam por descobrir. Este paraíso cultural está à vista de todos e é inquestionável o seu papel no âmbito cultural da Invicta. Diversidade, carisma e criatividade: estas são as palavras que ecoam na rua Miguel Bombarda.
Este artigo é da autoria de Bruna Neto e Marta Tuna.
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