Educação
Estudantes da U. Porto protestam pagamento de 550 euros para defesa online de tese de doutoramento
A realização de um doutoramento na Universidade do Porto implica vários pagamentos à instituição. De acordo com a tabela de Emolumentos da Universidade do Porto, em vigor desde 13 de maio de 2010 (com diversas alterações desde então), um estudante de doutoramento está sujeito ao pagamento de:
- Uma taxa de 55 euros quando se candidata a um programa doutoral;
- Uma taxa de matrícula de 100 euros após aceitação no programa doutoral;
- Uma taxa 550 euros de admissão a provas académicas de doutoramento no momento de entrega da tese na secretaria;
- Uma taxa 15 euros pela certidão de registo de grau após aprovação.
Isto para além dos montantes anuais a pagar de propinas, que variam entre 2750 e 3000 euros (para estudantes em tempo integral e sem estatuto de estudante internacional), e de seguro escolar de 2 euros por ano. Tudo somado, um doutoramento em quatro anos (maioria dos casos) fica entre 11728 e 12728 euros, com 728 euros desse valor a corresponderem a taxas e ao seguro escolar.
O descontentamento perante o pagamento da taxa de admissão para as provas de defesa de doutoramento não é novidade, uma vez que a taxa equivalente noutras instituições nacionais é consideravelmente inferior. A Universidade de Coimbra cobra 50 euros, por exemplo. No entanto, a atual situação de pandemia de COVID-19 veio ainda mais aumentar o descontentamento dos estudantes da Universidade do Porto perante esta desigualdade. Isto porque continuam obrigados a pagar o mesmo valor de taxa por provas que têm sido, na maioria dos casos, inteiramente por videoconferência.
Atualmente, as provas online não têm qualquer custo associado para a reserva de sala própria para o efeito ou de ajuda em deslocação para os membros do júri: duas das justificações que foram apresentadas no passado para justificar o elevado montante. Outros custos que poderiam existir no período pré-pandemia, tais como custos administrativos e de envio de teses impressas ao júri, deverão ser igualmente inferiores ao habitual, uma vez que todos estes procedimentos têm sido realizados totalmente em formato digital.
Foram estes alguns dos motivos apresentados por um dos estudantes, que preferiu manter-se anónimo, quando apresentou um requerimento para exposição ao Reitor da Universidade do Porto, no final de 2020, pedindo isenção do pagamento da taxa de admissão a provas académicas de doutoramento. No documento, ao qual o JUP teve acesso, são invocados todos os “graves condicionalismos impostos pela pandemia” à realização do doutoramento, assim como as “dificuldades económicas da crise” provocada pela mesma.
O estudante expõe que, segundo apurou junto dos serviços académicos, “a justificação para a cobrança desta taxa está associada ao processo burocrático de marcação de provas, e às expensas com viagens para o júri”. Assim, justifica o pedido de isenção pelo facto de “todo este processo (incluindo a submissão, processamento e arguição) estar a ser feito exclusivamente online, não requerendo qualquer despesa relativa à constituição e deslocações dos membros constituintes do júri das provas”.
A resposta da Reitoria, à qual o JUP teve acesso, foi negativa, indicando “a inexistência de enquadramento regulamentar para tal”, não estando previsto qualquer causa para isenção. No ofício é ainda explicado que “embora a modalidade de prestações de prova possa não implicar a deslocação dos membros do respetivo júri, a mesma comporta, invariavelmente, os demais custos inerentes ao processo administrativo que lhe está subjacente, bem como o trabalho de avaliação da tese inerentes às respetivas provas”.
Segundo aquilo que o JUP conseguiu apurar, junto de vários elementos da comunidade académica (estudantes, investigadores e professores) e de diferentes unidades orgânicas da Universidade do Porto, o trabalho de avaliação da tese não é atualmente remunerado, sendo que normalmente também não são requeridas (embora possam existir) ajudas de custo para os elementos do júri externos à universidade. No entanto, uma vez que não se encontra discriminado em nenhum documento oficial da Universidade do Porto os custos associados às provas de defesa de doutoramento, não fica claro para que é usado o valor da taxa para além dos pressupostos custos do “processo administrativo”. Sem mais informações não é possível avaliar se o valor é adequado e se pode ser justificada a diferença de preços praticados por diferentes instituições de Ensino Superior.
Este é um caso que tem sido acompanhado de perto por inúmeros estudantes de doutoramento e bolseiros de investigação, que se juntaram a discutir este assunto em grupos de bolseiros nas redes sociais. A opinião consensual dos estudantes que se pronunciaram sobre o tema é que o montante da taxa não está a ser bem justificado pela Universidade do Porto e de que os montantes pagos através das propinas deveriam cobrir estes custos de defesa, uma vez que a obtenção do título de doutor só é possível com a defesa pública da tese.
Entretanto, ocorreu uma nova alteração à Tabela de Emolumentos da Universidade do Porto, com data de 22 de dezembro de 2020, que atualiza o montante da taxa de admissão a provas académicas para 500 euros (redução em 50 euros), mas que não satisfaz os estudantes, que prometem continuar a lutar por baixar o montante da taxa ou mesmo extinguir a mesma.
Estudantes e PCP exigem prorrogação gratuita do prazo para a entrega e apresentação da tese de doutoramento
O acentuar do descontentamento dos estudantes de doutoramento da Universidade do Porto para com a taxa de admissão de provas de doutoramento ocorreu em paralelo com outra reivindicação dos mesmos, para a prorrogação gratuita do prazo de entrega e/ou apresentação da tese de doutoramento.
Para aqueles que são bolseiros da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT), a entidade que financia as suas bolsas de doutoramento e paga as propinas prorrogou as bolsas em dois meses, devido ao encerramento das universidades e centros de investigação entre meados de março e maio de 2020. Com esta extensão em dois meses do financiamento das bolsas de doutoramento, pretende-se que os estudantes possam cumprir os respetivos planos de trabalhos, não saindo prejudicados pelo período de confinamento.
No entanto, a Universidade do Porto não realizou a mesma prorrogação. Inicialmente, invocou que os estudantes já podiam usufruir de um período de 90 dias úteis extra após a data prevista para entrega da tese na secretaria sem terem de pagar outra prestação de propinas. Mais tarde, a 13 de maio de 2020, em despacho (n.º GR.28/05/2020), o Reitor da Universidade do Porto determinou a extensão do prazo de entrega de teses de doutoramento de 90 dias úteis para 150 dias consecutivos, sem ser devida propina do próximo ano letivo.
Esta foi uma medida que levou vários grupos de estudantes a escrever novamente à Reitoria, uma vez que um período de 90 dias úteis e um de 150 dias consecutivos correspondem praticamente ao mesmo período de extensão, com apenas mais cerca de 14 dias úteis (ou 3 semanas de dias consecutivos) para compensar dois meses e uma semana sem acesso às instalações da Universidade. Vários grupos de estudantes invocaram que o período de 90 dias úteis já era usado pela maioria dos estudantes para compensar os períodos em que estiveram doentes durante o doutoramento e também para compensar os períodos em que não puderam trabalhar por avaria de equipamentos ou outros constrangimentos.
Não sendo este um problema exclusivo à Universidade do Porto, o debate chegou à Assembleia da República, com uma proposta do PCP, aprovada no Orçamento de Estado para 2021, para “a prorrogação até ao final do presente ano letivo, do prazo de entrega e/ou apresentação de teses ou dissertações” (abrange estudantes de mestrado e doutoramento), “sem o pagamento adicional de propinas, taxas ou emolumentos”. Mais recentemente, a 14 de janeiro de 2021, o grupo parlamentar do PCP, através de Ana Mesquita e Alma Rivera, questionaram o Presidente da Assembleia da República acerca da “não aplicação do que já se encontra em vigor no Orçamento”, tendo recebido “múltiplas denúncias de estudantes do Ensino Superior” de que continuam a ser cobradas propinas, taxas ou emolumentos adicionais pelas instituições.
Enquanto os estudantes aguardam novas deliberações, vários têm sido obrigados a entregar e defender as respetivas teses de doutoramento sob a pressão de compensar o tempo e os meios que perderam devido à pandemia de COVID-19 e, no caso da Universidade do Porto, sendo ainda obrigados ao pagamento de 550 euros ou, mais recentemente 500 euros, no momento de entrega da mesma, um esforço financeiro que muitos dizem ser particularmente difícil de cumprir na atual conjuntura económica nacional.