Educação
Novos modelos de avaliação e de acesso ao Ensino Superior trazidos ao debate das legislativas
Segundo dados do INE, “Inquérito ao Emprego”, Portugal tem hoje a população mais qualificada da sua história. Em 2020, 39,6% dos adultos entre os 30 e os 34 anos tinham completado com sucesso, pelo menos, um nível de escolaridade superior.
No sentido de continuar a estimular o crescimento da qualificação, acompanhado de um ensino de qualidade, tem sido comum a referência à Educação no nosso país como uma forte prioridade, seja ela, por exemplo, decisiva “para uma economia mais próspera e internacionalizada” como defende o primeiro-ministro, António Costa, seja um “pilar de igualdade” como refere o Bloco de Esquerda. Na diversidade que o espetro político em Portugal tem para oferecer, são várias – e por vezes divergentes – as abordagens à Educação para o próximo mandato e para o futuro das novas gerações.
PS: A Educação como “a primeira prioridade”
Começando pelas visões do partido dirigido por António Costa, num tema que foi, em outubro de 2021, referido pelo próprio como “a primeira prioridade” para o futuro do país, o PS tem a Educação como essencial para o combate às desigualdades e para o sucesso individual de cada cidadão, sendo necessário um grande incentivo à entrada no ensino superior.
Tendo como objetivo a estimulação do ingresso e o combate ao abandono no ensino superior, o partido socialista pretende aumentar os apoios sociais aos estudantes, principalmente com as bolsas de estudo, as residências universitárias, o reforço do financiamento do Plano Nacional de Alojamento para o Ensino Superior e o programa Erasmus. Os incentivos e apoios para a frequência do ensino superior, em regiões do país com menor procura e menor pressão demográfica, são, para o partido, fundamentais para estudantes economicamente carenciados.
Outros compromissos para a Educação, presentes no programa eleitoral consistem na modernização do Ensino Profissional, através da criação dos Centros Tecnológicos Especializados e da adequação da oferta às necessidades; no reforço das políticas de Ação Social Escolar; na alteração do modelo de ensino do Português Língua Não Materna, devido ao número de migrantes; e na continuação de incentivos de apoio aos grupos de maior vulnerabilidade, promovendo também os programas e as medidas para a inclusão efetiva.
PSD: A Educação para o crescimento económico e bem-estar da população
De uma outra perspetiva, Rui Rio tem-se mostrado como opositor às políticas de Educação implementadas pelo governo atual. No discurso de encerramento do 39º congresso nacional do PSD, a 19 de dezembro, o líder do partido fez questão de atribuir defeitos às medidas que têm vindo a ser implementadas pelo governo socialista. “Acabaram com as provas finais de ciclo, aligeiraram o currículo, definiram um perfil do aluno em que o conhecimento e a disciplina passaram a letra morta, desautorizaram os professores, desistiram na escola pública, desprezaram ensino profissional, ignoraram a Educação de infância”, afirma Rio.
Assim, o Partido Social-Democrata apresenta as suas alternativas à melhoria do sistema educacional. No que toca ao ensino superior, este é visto como ferramenta para o crescimento económico e para o bem-estar da sociedade. Assim, considera necessário alargar e diversificar a captação de candidatos de modo a abranger toda a extensão territorial, incluindo os diversos percursos de conclusão do ensino secundário e os diversos grupos sociais.
Os sociais-democratas ainda defendem a promoção do sucesso escolar e a qualidade de vida do estudante através da ampliação da cobertura de residências estudantis, responsabilização das instituições pelo sucesso dos seus estudantes e pelo recrutamento de grupos sub-representados, financiando mais ou menos as instituições em função do número de estudantes de grupos sub-representados, por exemplo. Incentivam a cooperação entre instituições do ensino superior, empresas, instituições sociais e autarquias no sentido de criar um ambiente propício à inovação. O PSD tem o objetivo de que em 2030, 5% do PIB de investimento em Portugal esteja nas áreas do Ensino Superior, Ciência e Inovação.
Para além do anteriormente mencionado, o PSD defende uma grande autonomia das escolas, propondo a instituição de 3 academias para a formação de futuros diretores de estabelecimentos escolares, a qualificação do ensino profissional, com a criação de um currículo específico para uma boa inserção no mercado de trabalho, a “criação de uma rede nacional de creches e jardins de infância tendencialmente gratuitos” e a dignificação da profissão docente.
Bloco de Esquerda (BE): Quer mudanças nas políticas públicas de Educação
Já o Bloco de Esquerda, no seu programa eleitoral, dá conta das irregularidades do sistema educacional que ficaram visíveis devido à pandemia e conclui que os fatores sócio-económicos influenciam largamente o sucesso escolar dos alunos. Baseando-se no “Relatório Panorâmico sobre Demografia e Educação”, do Tribunal de Contas, constatam que a percentagem do PIB que é investida na Educação se situa nos 3,9% em Portugal, em contraste com os 6% recomendados pela UNESCO e pela OCDE. O BE propõe, por isso, o aumento do investimento na Educação, acompanhado da mudança nas políticas públicas de Educação.
No que toca ao ensino superior, o partido liderado por Catarina Martins considera que o investimento é muito limitado, não atingindo o patamar dos 1,5% do PIB. É defendido o fim das propinas nas licenciaturas e a redução das mesmas nos mestrados e doutoramentos. A entrada no ensino superior é vista como “competição desenfreada pelos melhores lugares nos rankings, medidos apenas pelo desempenho nos exames nacionais”. Apesar de não apresentarem um plano concreto, propõem o estudo de um novo modelo de acesso que inclua o fim dos exames nacionais e novos instrumentos de aferição de conhecimentos e competências.
Outras propostas são a inclusão das creches no sistema educativo e a contabilização do tempo de serviço dos Educadores de Infância afetos às creches para todos os efeitos do Estatuto da Carreira Docente. Propõe também a gratuitidade de equipamentos informáticos e de acesso a rede de internet e a criação, na escola pública, de cursos pós-laborais dirigidos aos adultos que pretendam melhorar a sua escolaridade.
CDU: Ensino público, gratuito e inclusivo
Numa abordagem próxima, a CDU – que junta o PCP ao partido “Os Verdes” -, valoriza a necessidade de um ensino público, gratuito e inclusivo, considerando o Ensino Superior como um direito de todos.
A histórica coligação, liderada por Jerónimo de Sousa defende, então, um ensino superior sem pagamento de propinas e com reforço da ação social, pois só assim é possível “garantir o acesso e frequência de todos aos mais elevados graus de ensino” e pede a concretização de um “amplo debate nacional sobre a distribuição geográfica das instituições de Ensino Superior público”.
A CDU defende ainda o fim dos exames de 9º, 11º e 12º anos, implementando um novo modelo de avaliação, à base da avaliação contínua, o aumento do investimento nas escolas e a criação de “respostas públicas de ensino artístico especializado”, reforçando a interligação entre a Educação e a cultura.
O cheque-ensino do CDS e da IL
Do lado direito do espetro político, surge uma visão da Educação que contraria o sistema atual, visão caracterizada pela implementação do modelo “cheque-ensino”, concretizada pela Iniciativa Liberal (IL) e pelo CDS-PP.
A reforma que João Cotrim de Figueiredo propõe consiste na alteração do financiamento do Estado para o financiamento do aluno, sendo os gastos do aluno totalmente comparticipados, quer este frequente o ensino público, quer o ensino privado. A implementação deste sistema permitiria uma maior liberdade por parte do aluno para escolher a instituição de ensino que pretende frequentar, atendendo aos critérios que considerar relevantes para si próprio. Um argumento em que a Iniciativa Liberal se baseia para esta reforma é a estatística por parte do ministério da Educação de que o Estado gasta cerca de 6.200 euros por aluno por ano, valor que raramente é ultrapassado com propinas pelas escolas privadas.
A par desta reformulação do método de financiamento, a IL sugere também a autonomia administrativa, financeira e pedagógica das autarquias, assim como das escolas públicas, naquilo que diz respeito à estratégia de Educação, à coordenação e ajuste da oferta educativa e à certificação da oferta de transportes.
No que diz respeito ao ensino superior e ao seu acesso, a Iniciativa Liberal apresenta no seu programa eleitoral um modelo concreto para “eliminar a dependência das avaliações do Ensino Secundário para a entrada no Ensino Superior”. Este modelo consiste na atribuição de autonomia às Instituições de ensino para desenvolverem os seus métodos de seleção de estudantes, sejam eles, a escolha das provas que aceitam para ingresso, a criação de provas de ingresso do tipo exame de admissão ao mestrado, aprovados pelo Instituto de Avaliação Educativa, ou a criação de testes vocacionais para o ingresso em cursos como Medicina, Enfermagem, cursos de Professores, entre outros.
Numa linha semelhante, o CDS-PP de Francisco Rodrigues dos Santos reconhece que “a liberdade na escolha da Educação é um direito fundamental e um dos instrumentos mais poderosos para poder ascender socialmente”. Neste seguimento, para o sistema educacional em Portugal, querem a reintrodução da responsabilidade na Educação através da premiação da excelência por parte de alunos e professores, a valorização do desporto pela sua “importância no desenvolvimento pessoal e na saúde pública” e o fortalecimento do ensino profissional, principalmente nas áreas tecnológicas.
PAN: A Educação como modelo de transformação
O PAN afirma o papel fundamental que a Educação tem nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) das Nações Unidas, acreditando que “só através da Educação será possível uma verdadeira transformação da sociedade”.
O partido representado por Inês de Sousa Real pretende que as escolas sejam autónomas, capazes de ajustar o currículo, os programas escolares e os métodos de avaliação. Também é pretendida a diminuição do número de estudantes por turma para um máximo de 15 alunos e a adaptação da carga letiva horária. Algumas medidas presentes no seu programa eleitoral pretendem combater a discriminação, por exemplo, ao fornecer capacitação ao pessoal docente e não docente sobre Educação inclusiva; “promover a aprendizagem básica da Língua Gestual Portuguesa (LGP) nas comunidades educativas” e “criar uma linha de apoio para a denúncia de comportamentos discriminatórios na comunidade escolar”.
O PAN ainda considera pertinente “dotar as escolas de psicólogos/as especializados em número adequado às necessidades permanentes, nomeadamente para o desenvolvimento dos processos de orientação escolar e profissional que devem ser estruturados ao longo do percurso escolar” e “instituir o conceito de Gap Year/Ano Sabático de forma a que jovens e famílias sintam confiança no processo de reflexão e validação vocacional”.
Relativamente ao Ensino Secundário, revêm o modelo de ensino, “implementando um modelo mais autónomo e flexível que privilegie a liberdade de escolha das componentes curriculares em função de interesses, capacidades, expectativas e projetos de vida dos/das estudantes” e “retirando a obrigatoriedade da realização de exames nacionais para alunos que não pretendam prosseguir os seus estudos”. Enquanto ao Ensino Superior, o seu acesso deve considerar “interesses, aptidões, projetos desenvolvidos, experiências dos/das estudantes”. Neste sentido, para diminuir o abandono escolar e o insucesso deve-se “alterar o Regulamento de Atribuição de Bolsas de Estudo a Estudantes do Ensino Superior” e “alargar o Ensino Especial ao Ensino Superior”.
Chega: Contra a burocracia no ensino
Por outro lado o Chega aborda a Educação pela rejeição da ideia de que o ensino de qualidade é sinónimo de ensino privado. Apresenta, assim, 6 princípios que constituem a sua “reforma do ensino básico e secundário”. O partido liderado por André Ventura considera que a indisciplina “alimenta fenómenos crescentes de violência escolar e social“. Também combate a burocracia, pois esta é tida em conta como grave prejuízo para o rigor e a qualidade do ensino. Enquanto aos resultados escolares, defende que “estão em profundo descrédito institucional e social, a ponto de se terem perdido referentes claros e justos sobre quem deve transitar/passar e quem deve ficar retido”.
Segundo o Chega, os exames são “pilares insubstituíveis do contrato social entre a escola e a sociedade” e a sua legitimidade está “minada pela esquerda e extrema-esquerda”. O programa eleitoral do partido ainda refere que os currículos e programas estão dominados “pela doutrinação ideológica e desperdício de recursos pagos por contribuintes sobrecarregados de impostos“. Assim, pretende “assegurar a autorresponsabilidade das escolas”.
Livre: A Educação enquanto elevador social
As visões políticas do Livre idealizam a escola como o “elevador social que originará uma sociedade mais igual”. No seu programa eleitoral para 2022, tece críticas ao atual sistema educacional em Portugal, referindo que este “estratifica, discrimina, promove a competição, quando deveria ser inclusivo e focado em cada aluno e nos valores humanistas”.
O partido presidido por Rui Tavares defende uma escola centrada em cada aluno, em que este participe nas tomadas de decisão, aprendendo assim a viver em Democracia. A urgente e importante revalorização da profissão docente e a rejeição das provas escritas como instrumentos objetivos e infalíveis na avaliação de um aluno são também convicções do partido.
Desta forma, propõe a garantia da gratuitidade da escola pública (algo essencial ao desenvolvimento, coesão social e justiça) e a eliminação da disciplina de Educação Moral e Religiosa do currículo das escolas públicas, deixando ao critério das famílias a formação religiosa dos seus educandos, atendendo ao princípio da laicidade da escola pública. Também sugere a melhoria da capacidade de resposta do ensino profissional, com o objetivo de aumentar a ligação entre as instituições de ensino profissional e o tecido empresarial da região para promover a empregabilidade imediata dos estudantes no fim do curso.
Em geral, são várias e diversificadas as propostas trazidas às eleições legislativas de 2022 no que à Educação diz respeito. No próximo Domingo, 30 de janeiro, serão votados os deputados que constituirão o parlamento nos próximos anos e que terão oportunidade de guiar a Educação no nosso país.
Artigo escrito por: Rodrigo Braga e Roselimar Azevedo
Editado por: João Múrias e Tiago Oliveira