Cultura
Luísa Alegre: “Há quem diga que não há muita visibilidade do cinema português, mas ao mesmo tempo somos os gatekeepers do cinema”
A 31ª edição do Festival “Curtas Vila do Conde” decorreu no passado mês de julho e levou a concurso 268 filmes. Com as categorias de competição “Nacional”, “Internacional”, “Take One!”, “Experimental”, “Music Videos” e ainda “Curtinhas”, foram treze os prémios atribuídos.
A competição de filmes de escola, Take One!, é uma aposta do Festival em trazer jovens cineastas a mostrarem o seu trabalho. É uma categoria onde vão a concurso filmes com uma duração de até 30 minutos produzidos por estudantes portugueses, tanto de instituições nacionais como internacionais. Este ano, foram atribuídos três prémios: Melhor Filme, Melhor Realização e Menção Honrosa.
A grande vencedora do prémio de Melhor Filme, na categoria Take One!, foi Luísa Alegre que venceu com o filme experimental “1/2=1”. Em entrevista ao JUP, a estudante da Escola de Artes da Universidade Católica Portuguesa do Porto falou da sua experiência e do processo para chegar até ao resultado final.
Para Luísa Alegre, o Curtas Vila do Conde surgiu desde logo como uma oportunidade para expor o seu trabalho. “É um festival com a sua preponderância no circuito de festivais em Portugal, portanto era um bom ponto para ter visibilidade para mostrar o meu filme”, afirma. Além disso, a estudante destacou o impacto que a participação num concurso destes pode ter para os jovens artistas, descrevendo a oportunidade como um “abrir de portas para as nossas carreiras”.
A categoria Take One!, onde esteve a concurso a curta vencedora, reúne vários jovens que partilham a mesma paixão pelo cinema e que experienciam o Festival de uma forma não só educativa, como também enriquecedora. “Acaba por ser ali um ambiente engraçado, porque acabamos por conhecer pessoas de outras universidades e acho que é sempre um ponto de atração para toda a gente que participa (…)”, sublinha Luísa. Segundo a vencedora, esta tem sido uma aposta que tem ganho muita adesão e que é muito acarinhada e apoiada pelo próprio Festival.
Quando questionada acerca da visibilidade dos jovens artistas em Portugal, a vencedora do Curtas Vila do Conde assume ser um assunto delicado: “há quem diga que não há muita visibilidade do cinema português, mas ao mesmo tempo (…) somos os gatekeepers do cinema”. Apesar da perceção de que a comunidade de cineastas portugueses é uma “espécie de círculo fechado”, a artista considera que “temos sempre bastantes iniciativas em Portugal e vários festivais que tentam fazer essa ponte entre os nossos projetos e o público”.
“Há quem diga que não há muita visibilidade do cinema português, mas ao mesmo tempo (…) somos os gatekeepers do cinema.”
O filme experimental de Luísa Alegre, “1/2=1″, destacou-se desde logo pela aposta numa técnica dos primórdios da fotografia chamada cianotipia. Este é um processo de impressão que utiliza dois químicos férreos, citrato de ferro amoniacal e ferricianeto de potássio, e cujo efeito final se baseia na exposição à luz ultravioleta e solar. “Tivemos cerca de 4.800 frames (…) e foi assim um processo complicado, porque nós tínhamos folhas A3 emulsionadas com 20 frames. Ou seja, foram assim por volta de 240 folhas que imprimimos”, explica Luísa.
“Tivemos cerca de 4.800 frames (…) e foi assim um processo complicado, porque nós tínhamos folhas A3 emulsionadas com 20 frames. Ou seja, foram assim por volta de 240 folhas que imprimimos.”
Apesar de trabalhoso, a escolha desta técnica resultou da “vontade de trabalhar o cinema experimental como quem inicialmente o começou”, não só por parte da cineasta, como de Joana Carreira, João Mendes Pinto e Mariana Machado, equipa com a qual desenvolveu este projeto no âmbito da sua licenciatura.
As tonalidades de azul, resultantes da emulsão de cianotipia e que acompanham o filme, acabaram por ser um acréscimo importante ao projeto. “A cianotipia surgiu não só pelo fascínio técnico que eu tinha em trabalhá-la, mas também como reforço ao conceito do filme”, revela a jovem artista.
A produção explora uma ideia de sonho e pesadelo e, nas palavras de Luísa Alegre, é “um filme sobre disforia, sobre um eu em cisão que se divide, que se multiplica e reflete sobre si”. O argumento, aliado a esta técnica, acabou por reforçar as intenções da vencedora do Curtas Vila do Conde que afirma que a cianotipia foi a “técnica ideal” para concretizar o filme “1/2=1”.
“A cianotipia surgiu não só pelo fascínio técnico que eu tinha em trabalhá-la, mas também como reforço ao conceito do filme.”
Enquanto realizadora, mas também autora do filme premiado, Luísa assume que o desenvolvimento do argumento se revelou um desafio. Apesar de inicialmente terem tentado construí-lo em equipa, o argumento, na sua versão final, ficou à responsabilidade da estudante, que se confessou a pessoa com “mais urgência de fazer este filme” e que, por isso, tomou a iniciativa de o escrever.
Também a realização do projeto acabou por ser “muito desgastante emocionalmente”, confessa a vencedora. Uma vez que se tratou de um trabalho curricular, houve alguns fatores, como a existência de datas limite, que condicionaram e desafiaram muito os quatro jovens.
Quanto ao futuro depois desta vitória, a cineasta ambiciona novos trabalhos e novas colaborações e procura “continuar a fazer filmes tão bem recebidos como este foi”. Assume ter projetos em mente e ideias que espera desenvolver não só de forma individual, como com o grupo que fez parte do filme vencedor no Festival Curtas Vila do Conde.
“Continuar a fazer filmes tão bem recebidos como este foi” é a ambição da cineasta.
A entrevista completa a Luísa Alegre encontra-se disponível no canal do youtube do JUP. Nela, poderá visitar também os espaços onde “1/2=1” foi produzido e acompanhar o processo de realização do mesmo.
Para dar a conhecer os trabalhos premiados, o Curtas Vila do Conde leva uma seleção dos melhores filmes da 31ª edição a várias localidades portuguesas. Até novembro, poderá assistir de norte a sul do país. Consulte todas as novidades aqui.
Para saber mais sobre o festival e as suas próximas edições, visite o site oficial e as redes sociais (Facebook e Instagram) do Curtas.
Artigo escrito por: Maria Rego
Editado por: Inês Miranda e Luísa Garcia
Fotografia e vídeo por: Joana Vale