Educação
Nota 20: o olhar crítico de Beatriz Neves
Beatriz Neves, uma das novas estudantes da Faculdade de Direito da Universidade do Porto (FDUP), é responsável por um dos “quatro vintes” da UP. Interessada pelo debate e pela análise crítica, a estudante escolheu Direito, de forma a “conseguir ser capaz de ver tudo como realmente é, e não como as circunstâncias o pintam.” O JUP conversou com Beatriz, que nos revelou o seu segredo para o sucesso académico e o que a cativa do curso.
1. Entre tantas universidades, o que te levou a colocar a Universidade do Porto na tua primeira opção?
A verdade é que a proximidade geográfica à minha área de residência foi um fator determinante, dado não ter fulgor económico para realizar a licenciatura noutra cidade. Além disso, atrai-me a vida e tradição académicas no Porto, que espero tornarem o quotidiano interessante.
“Nada me assusta mais do que me sentir cega pelo meu contexto.”
2. Com todos os cursos que a UP oferece à tua disposição, o que te fez optar por Direito? De que forma é que este curso se alinha contigo?
O Direito é algo que para mim faz sentido. Gosto de debater, de analisar minuciosamente as coisas da vida, de ter atenção ao detalhe. Penso que Direito me poderá ajudar a ser melhor nisso. Nada me assusta mais do que me sentir cega pelo meu contexto.
Anseio ser crítica e perspicaz, conseguir ser capaz de ver tudo como realmente é, e não como as minhas circunstâncias o pintam. Sei que é uma tarefa inglória, extremamente impossível, mas acredito que uma Licenciatura em Direito me permitirá ver um mundo com mais cores.
3. Ingressar no ensino superior foi sempre um objetivo para ti? Sentiste alguma pressão para tal ou foi uma decisão pessoal?
Ingressar no ensino superior nunca foi uma questão, sempre foi a principal possibilidade. Obviamente que há sempre pressão externa, quer de uma sociedade que só parece abrir portas a jovens altamente qualificados, quer da sorte de ter dois pais licenciados, que procuraram incutir em mim o respeito pelo estudo. Todavia, em última instância, não há qualquer dúvida para mim que a faculdade é o lugar onde deveria estar.
4. Quais achas que terão sido os ingredientes para o teu sucesso académico no ensino básico e secundário?
Antes de mais, tenho de referenciar os professores. Foram eles, sem dúvida, os maiores determinantes do meu sucesso académico, pela sua competência, disponibilidade e entrega a uma profissão muito exigente. A partir do secundário, tudo se tornou mais sério. Foi necessário estabelecer rotinas que se traduzissem em resultados. Para mim, estudar de manhã permitia-me absorver os conteúdos de modo mais eficaz e ir ao ginásio à tarde dava o descanso necessário à mente. Naturalmente, foram três anos de estudo intenso, mas que com uma rotina que eu amava e com inesquecíveis momentos de recreação se tornaram bastante agradáveis. Tenho muito boas memórias deste tempo.
5. Sempre te foi fácil conciliar os tempos livres com a vida académica? Tiveste de abdicar de algo ou fazer algum sacrifício?
A gestão do tempo sempre foi a minha grande batalha. Sou um ser procrastinador e com muito FOMO (“fear of missing out”). Deste modo, passei o secundário todo a tentar balançar o sucesso académico com uma vida social ativa, bem como a participação em projetos diversos e a atividade física. Além do mais, perdia bastante tempo em transportes públicos, pelo que havia momentos críticos em que sentia tudo num equilíbrio muito ténue. O que me ajudou foi estabelecer tarefas não negociáveis nos meus dias, ou seja, coisas que não podia não fazer, independentemente do tempo que perdesse a procrastinar. Ao longo do tempo, isto trouxe-me uma maior perceção de tudo aquilo que podia encaixar no meu quotidiano (não estritamente académico) e motivou-me a perder menos tempo. Para alcançar bons resultados há sempre momentos de sacrifício, não nego. É impossível fazer tudo o que queremos, a todos os momentos. Mas, posso mesmo chamar de sacrifício algo que fiz para alcançar um objetivo que me propus a mim mesma? Estes ‘sacrifícios’ são, se calhar, a melhor forma de nos respeitarmos a nós mesmos e trilhar um caminho com dignidade.
6. Quais são os teus objetivos neste novo percurso? Quais são os maiores receios?
Quero manter uma mente aberta, acima de tudo e aproveitar a experiência e a novidade. Receio não ser capaz de estar à altura deste novo desafio, de não conseguir conciliar tudo aquilo que a vida académica traz.
7. O que consideras que deve ser melhorado no ensino em Portugal?
O ensino em Portugal é salvaguardado por professores que todos os dias reformulam vidas, sendo assim, é dos professores que devemos tratar. São os professores que devemos ouvir. Desburocratizar o ensino, por exemplo, é uma tarefa de extrema importância. Ultimamente, parece que um professor tem de fazer todo o tipo de tarefas menos a de ser professor, isso desgasta incríveis profissionais, desgasta o que de melhor têm as nossas escolas.
“Não há nada mais digno do que o trabalho para algo que é importante para nós.”
8. Que conselhos darias aos estudantes do ensino secundário para que a média de entrada não seja um impedimento para continuarem os seus estudos no curso que mais desejam?
O secundário é uma época de extrema turbulência a nível emocional, social e até espiritual. Crescer não é fácil e reconhecer que este é um momento exigente a nível transversal (não apenas a nível académico) é o primeiro passo para tentarmos tornar esta janela de tempo da nossa existência um momento mais aprazível. Mais concretamente, aconselharia toda a gente a construir uma rotina diária que realmente goste e lhe traga alento. O estudo propriamente dito deve ser feito em momentos chave do dia, em que sabemos que a nossa atenção vai estar no seu ápice. Respeitar o valor do trabalho e ganhar brio é também relevante. Não há nada mais digno do que o trabalho para algo que é importante para nós. Se esse algo é entrar na faculdade, então há que ser primoroso, atencioso para com esse objetivo. Assim podemos realmente dar algum rumo aos nossos dias, honrar o tempo e as oportunidades que surgem no caminho. Acima de tudo, há que procurar o gosto e a vontade. Nos momentos difíceis, há que ser irreverente e dar luta.
Artigo e entrevista por: Roselimar Azevedo
Editado por: Ana Pinto e Joana Monteiro