Educação

Professor da Universidade de Coimbra acusado de violência e assédio sexual

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Imagem: Pixabay

O sociólogo e fundador do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra,  Boaventura Sousa Santos, assim como o seu assistente Bruno Sena, foi acusado de assédio sexual por parte de ex-alunas. As acusações foram feitas num capítulo de tese que se tornou livro, e onde se denunciaram comportamentos inapropriados não só do professor Boaventura, como também de outros docentes da mesma universidade.

 

Um ano após ser acusado de assédio sexual, o professor Boaventura de Sousa Santos iniciou, no dia 25 de outubro de 2024, uma ação cível para a tutela da personalidade prevista no artigo 878.º do Código de Processo Civil, com foco na proteção do seu bom nome e honra, no Tribunal de Coimbra. O docente acredita que a ação é necessária para o proteger das acusações feitas por ex-alunas no ano anterior.

O livro  “Má Conduta Sexual na Academia – Para uma Ética de Cuidado na Universidade”, publicado a 31 de março de 2023, expôs o relato de três investigadoras que vivenciaram episódios de assédio sexual envolvendo o professor e sociólogo Boaventura Sousa Santos e o antropólogo Bruno Sena Martins.

No livro, as autoras dedicaram um capítulo à explicação de como integraram o grupo de pesquisa do professor Boaventura e como as situações de violência e assédio sexual se iniciaram. Durante todos os relatos, identificaram-se através dos termos: ex-doutoranda nacional, ex-investigadora de pós-doutoramento e ex-estudante de doutoramento internacional.

De acordo com o portal Notícias de Coimbra, as autoras do livro decidiram não identificar a instituição e os envolvidos nos relatos, usando inclusive, para o professor Boaventura Sousa Santos, o pseudónimo “The Star Professor” (O Professor Estrela) e para o seu assistente “The Apprentice” (O Aprendiz).

Entretanto, os acusados foram facilmente identificados por serem as únicas pessoas comuns ao percurso académico das autoras das denúncias. Ademais, num pronunciamento para o Diário de Notícias, os próprios se reconheceram nas denominações utilizadas no relato, negando, contudo, todas as acusações de violência e assédio sexual.

Boaventura de Sousa Santos nasceu em Coimbra, em 1940. O docente possui um doutoramento em Sociologia do Direito pela Universidade de Yale (1973) e é Professor Catedrático Jubilado da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra e da Distinguished Legal Scholar da Universidade de Wisconsin-Madison. O maior destaque da sua carreira foi a fundação do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra (CES), onde também é sociólogo em exercício de funções.

O assistente do professor, Bruno Sena Martins, é também investigador do CES. Possui uma licenciatura em antropologia e doutoramento em Sociologia pela Universidade de Coimbra.

De acordo com o Diário de Notícias, este foi o primeiro caso de violência e assédio sexual exposto numa universidade portuguesa. O relato das antigas alunas acabou por motivar outras pessoas a se pronunciarem, anonimamente, sobre situações que vivenciaram com o mesmo professor e que se assemelham às relatadas no livro.

As autoras do livro são: Lieselotte Viaene, professora na Universidade Carlos III, em Madrid, Catarina Laranjeiro, investigadora no Instituto de História Contemporânea da Universidade Nova, e Myie Nadya Tom, professora na University of Nebraska Omaha, nos EUA. Nenhuma das envolvidas quis comentar até ao momento sobre o conteúdo do livro e as suas repercussões.

 

Investigação do CES

Face aos relatos das ex-estudantes e às situações expostas por outras mulheres, o CES decidiu suspender Boaventura e Bruno Martins até o apuramento das situações denunciadas.

Posteriormente, foi criada uma comissão independente para investigar situações de assédio no CES, que produziu um relatório final publicado em fevereiro de 2024. Além da investigação, o relatório também esclarece os conceitos de assédio moral, assédio sexual e abuso de poder.

Segundo o relatório final, os delatores referem que o maior problema existente no CES é que as decisões importantes são tomadas por aqueles que praticam abuso de poder, e que a ausência de limites nas relações entre professores e estudantes, e também entre trabalho e vida privada, têm impactos mentais e emocionais.

A maior parte das pessoas denunciadas negou as acusações, e referiu razões políticas, ideológicas, pessoais e académicas para justificar certos atos. Acrescentaram ainda que sabiam distinguir entre as esferas profissional e privada e que algumas das relações íntimas entre membros do CES e pessoas hierarquicamente inferiores eram da esfera pessoal.

O relatório final concluiu que havia uma assimetria de poder potencializada entre estudantes e dirigentes do CES e que a falta de separação entre a vida profissional e a vida privada era uma situação recorrente na instituição.

 

Contexto atual

Após o relatório da comissão independente, o CES pediu desculpa às vítimas. Além disso, foi criada uma campanha intitulada Academia Sem Assédio – Fundo de Apoio Jurídico para Vítimas no CES com o objetivo de financiar as despesas legais que as denunciantes terão com os processos no âmbito jurídico.

Em outubro deste ano, o Jornal de Notícias expôs que Boaventura Santos voltou a trabalhar com pós-doutorados no CES. A respeito do antropólogo Bruno Martins, não há informações públicas que permitam concluir se o assistente permanece ou não em funções ao lado do sociólogo.

Sobre o julgamento para defesa do bom nome iniciado por Boaventura, o Diário de Notícias  revelou que o julgamento foi suspenso para que a parte contrária, que neste caso é o grupo de quatro mulheres que acusam o professor de assédio sexual, tenha tempo para responder às alegações feitas em respeito ao princípio do contraditório. No Direito, o princípio do contraditório significa que o tribunal, antes de proferir as suas decisões, deve ouvir a acusação e a defesa e que estas devem ter a possibilidade de se pronunciarem sobre as atuações ou condutas processuais realizadas pela contraparte.

Antes do início do julgamento, a Plataforma Portuguesa para os Direitos das Mulheres, composta por 31 organizações, emitiu um comunicado apoiando as investigadoras que denunciaram o professor e apontou que “as organizações feministas reagem em apoio às sobreviventes”.

Anteriormente à manifestação desse apoio, o sociólogo Boaventura foi acusado de “lawfare” (ou guerra jurídica). Esse conceito é usado para situações em que os acusados decidem iniciar um processo por difamação pelas alegações apresentadas pelas vítimas.

 

Para conhecer mais sobre o trabalho das associações que compõem a Plataforma Portuguesa para os Direitos das Mulheres, acesse aqui.

 

Artigo por: Maria Silva

Editado por: Ana Pinto e Joana Monteiro

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