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Artigo de Opinião

VIOLÊNCIA DOMÉSTICA EM PORTUGAL

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Todos os dias, as televisões parecem reportar novas denúncias e novos casos. No entanto, será que há realmente motivo para considerar que a violência nas nossas casas está realmente a aumentar, ou este alarme disparado sobre o tema não passa de mais uma dramatização da realidade por parte dos media para captar audiências? Neste assunto, como em tantos outros, a verdade nem é “branca” nem “preta”, é o habitual “cinzento” que tantas vezes ignoramos aceitando apenas a existência dos extremos.

Efetivamente, podemos não saber se no fim deste ano haverá mais homicídios e denúncias de violência doméstica que em anos anteriores, porém, mesmo que fossem as mesmas 14 mortes até ao final do ano, estas seriam 14 a mais e, por isso, motivo de atenção por parte da sociedade portuguesa. Por outro lado, os media discutem os casos apenas analisando toda uma personalidade do agressor, dão todos os detalhes do crime horroroso e fazem todas as perguntas e mais algumas a todos os vizinhos das famílias envolvidas, passando ao lado do verdadeiro problema que nunca é realmente apresentado, pelo que dar enfâse a estas formas de cobrir os casos apenas afasta a população do centro de toda a questão.

A verdade é que a violência doméstica é apenas parte de um problema muito maior, o desrespeito e falta de ética que ainda assola o nosso país. Para este problema em específico, os homens são os maiores culpados. Em 2018, 79% das vítimas eram mulheres e 82% dos denunciados eram homens. Todos os abusos, desde o piropo ofensivo, o apalpão impróprio, violação ou violência para com o parceiro/a, são crimes de ignorância, cobardia e abuso de poder. Pessoas sem educação civil e sem noção de igualdade de direitos para todos, homens e mulheres que não sabem ouvir um não são os grandes responsáveis pela permanência deste problema.

Como se os crimes em si não fossem motivo de frustração suficiente, somos confrontados nas notícias com revelações impensáveis da justiça portuguesa. Juízes que usam referências bíblicas ou o adultério da mulher para defender o agressor, ou afirmam que a agressão com uma moca de pregos não é  grave, ou dão pena suspensa a homens que violam uma mulher desmaiada, fazem com que a mancha de vergonha no país envolvendo este género de crimes seja ainda maior. O maior exemplo é o juiz Neto de Moura, que em diversos casos utilizou expressões como: “Mulheres virtuosas são mulheres obedientes. Os homens podem bater-lhes, mas, desde que obedeçam, não procurarão mais motivos de querela”; “O adultério da mulher é uma conduta que a sociedade sempre condenou e condena fortemente (e são as mulheres honestas as primeiras a estigmatizar as adúlteras) e por isso vê-se com alguma compreensão a violência exercida pelo homem traído”. Além desta impunidade dada a alguns agressores, a justiça e o governo revelam imensas falhas na proteção das vítimas. Desta forma, como esperam que o problema seja algum ano resolvido, quando aqueles que mais sofrem, depois de enfrentarem o medo e denunciarem o agressor, vêem-no sair impune e voltar para o seu lado? Será então motivo para desesperar e achar que este é um problema que nunca irá ter solução?

Claro que não, desta vez a resposta é de extremos e com convicção. Uma das minhas expressões favoritas é de que para termos noção do nosso verdadeiro poder devemos sempre olhar para o nosso passado e ver a nossa evolução. Neste caso, eu gosto de comparar as expectativas de vida que uma jovem de 20 anos pode ter e que uma senhora que viveu nos anos 60 teve. A mulher dos dias de hoje espera ter estudos, tirar um curso superior que sempre desejou, ter e expressar a sua opinião nos diversos temas, votar sempre para todas as eleições, receber tanto quanto qualquer homem colega de profissão, namorar com quem quiser e ser independente durante toda a sua vida. Já a senhora dos anos 60 pouco estudou, nem sempre teve direito ao voto, não pôde usar as roupas que quis, dependeu sempre do seu companheiro e tinha a obrigação de tratar da casa. Todas estas mudanças não foram conseguidas de um dia para o outro, sem que grandes esforços e lutas tenham sido batalhadas. Nos tempos atuais, em que o mundo está em constante mudança, que o ativismo social é maior do que nunca, que a educação é maior do que alguma vez foi, pensar que criar uma sociedade igual e respeitadora é impossível é sinal de uma mente muito fechada e completa falta de esperança.

Então qual é a melhor maneira de acelerarmos e contribuirmos para esta evolução da sociedade? Através da educação dos mais novos e maior exigência de quem nos representa no governo. As escolas têm de ser vistas como mais do que um estabelecimento de ensino, mas de educação das crianças também, assegurando que os valores que consideramos essenciais como sociedade chegam a todas as crianças, seja qual for a educação mais ou menos correta que lhes seja dada em casa. Para o presente, devemos ser muito, mas muito mais exigentes com o nosso governo. Nas nossas vidas somos ensinados a perdoar e a dar segundas oportunidades, até terceiras, mas o que se tem visto de todos os partidos e governos em Portugal são erros graves que apenas numa sociedade conformista passam sem punição, um governo que não tem capacidade de ajudar as vítimas, quer protegendo-as ou dando-lhes condições para retomarem uma vida normal e independente, um governo que não pressiona a justiça e permite que esta continua pobre, incapaz e corrupta. Por fim, gostaria de deixar um destaque para o trabalho realizado pelo Diogo Faro, que participou na realização de um vídeo, “O machismo não é grave, porque é normal”, que demonstra sucintamente o que envolve a violência doméstica e como este problema está enraizado na sociedade e temos de pensar a longo prazo para a resolução do mesmo.

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