Crítica

“AS TRÊS IRMÃS” DE ANTON TCHÉKHOV

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Muitas coisas me chateiam nesta peça… detalhes, pormenores que inevitavelmente nos fazem tropeçar e ficar pelos planos de um caminho que não sai do papel.

Nas primeiras páginas desta obra deparamo-nos com um drama familiar, um microcosmos que representa a sociedade inteira. É sem dúvida uma linhagem que vive no interior de uma “campânula”, transcrevo esta palavra que Andrei refere em mais uma das suas autorrealizações. De facto, visualizamos um aglomerado de gente que vai trocando sentimentos entre atos para, depois, serem invejosos ao ponto de quererem essas sensações de volta. Uma melancolia pelo que conseguiram dar e pelo que jamais poderão reavivar.

Fragmentam-se.

Nenhum daqueles corpos está realmente ali, alguns deles de tanto obcecarem por Moscovo esqueceram a logística, e por isto quero dizer de forma leve, a coragem, o esforço e o trabalho necessário para abandonar um sítio, receando poder não encontrar o outro.

O sonho anda de mãos dadas com as nossas protagonistas no primeiro ato, persegueas no segundo, assombra-as no terceiro e finalmente no quarto fica saciado, não por ver que seguranças se perderam, que lideranças se alteraram (falo claramente da sombra atenta que é Natacha, a mulher que fala ao público, que a sua espera associada ao rancor provoca estragos), mas por sentir-se verdadeiramente querido na pele de alguém.

Subitamente e contrariando o recente óbito Tuzenbakh, essas fantasias passageiras deixam de ser uma trovoada que ferozmente, pelo poder do tempo, partem os nossos guarda-chuvas e nos levam à mão de obra necessária, para passar antes a ser o destino exótico, recheado de guarda sóis que refletem o nosso envelhecimento, porém onde arranjamos diariamente sinónimos de mudança, para que todos os dias o seu efeito seja alto em despertar, de quem se apazigua perante ela de cara tapada ou de cara à vista.

Deste modo, observo um desenlace esperançoso, que após uma viagem em torno de experiências pessoais aponta o dedo a quem as leu e pede-lhe para descomplicar perguntas futuras: O que farei a seguir? / Terei sucesso se desejar tudo antecipadamente?

Por isso este texto irritou-me, sendo que tive que repensar a agilidade do ser que se diz satisfeito. Talvez em vez de estar estanque neste ciclo rítmico, esse humano tenha antes completa noção das birras das meias palavras, prefere antes dizer tudo, tornar tudo real para apalpar continuamente o sonho. Cria e desfaz a seu belo prazer.

Tchékhov está definitivamente nesse grupo, uma vez que abana as quatro paredes das mais variadas personagens deste drama, traz-lhes o choro, para no fim dizer: Está tudo bem, sentem-se aí nesse canto, resignem-se até se cansarem, eu vou tocar piano até vocês partirem.

Não são histórias moralizantes. O leitor tem permissão para tirar as suas próprias conclusões, descemos da alta arte para enfrentar problemas diários de humor afiado.

Fora das minhas divagações, tenho a plena certeza que algum tempo depois o autor pede um copo e diz: “Há muito tempo que não bebia champanhe.” Depois fecha os olhos e morre. É assim que se torna um artista livre, poucos ficam de olhos abertos quando ficam frios, julgo que virá-los para o interior não seja mais do que potenciar a importância das inconsciências que nos fazem seres maravilhosamente imperfeitos. Quiçá daí venha a música alegre que Olga usa como alento, possivelmente aí recordemos “uma boa palavra”, definitivamente é aí que vivemos, assim, no exterior, o viver da consciência, saber que a mediocridade reside nessa paralisia da alma chamada indiferença.

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