Crónica

OS ÍNDICES DE SEGURANÇA E A TRADUÇÃO DOS INSTINTOS HUMANOS

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Coloquei-me a refletir sobre o quão paradoxal é a segurança, independente dos números, nenhum dado é capaz de superar as sensações humanas. Todos os dias conheço imigrantes que se sentem mais seguros em Portugal assim como conheço outros que são capazes de voltar para suas casas a nado.

Não estou aqui para contradizer os índices, fatos são fatos. Portugal é o quarto país mais seguro do mundo, o Brasil é o centésimo sexto. Ainda assim, sinto-me profundamente insegura em Portugal, algo que não senti de forma tão acentuada no Brasil. Trata-se de uma ilusão, gerada através da construção utópica que separa os países desenvolvidos dos subdesenvolvidos. Ao ler os jornais e assistir ao noticiário de ambos os países, vejo puro sensacionalismo, mascarando uma Europa não tão perfeita, e um Brasil não tão violento.

Ao mudar-me para o Porto, houve um processo de forte desconstrução da Europa idealizada, vi moradores de rua e usuários de drogas, absolutamente a vala da sociedade. Percebi rapidamente que o transporte público não era tão eficiente e que o trânsito era caótico. Assimilações que eu jamais imaginei precisar fazer estando em território desenvolvido.

Estudo num campus deslumbrante, e me assombra que em sua lateral esquerda vivam famílias debaixo da ponte, e a lateral direita haja um terreno vazio e pouco iluminado que sempre me traz insegurança ao sair tarde da noite. Converso com colegas e percebo que é difícil compreender as dimensões e complexidade de um país com base em teorias e recortes de jornal. O empirismo nesse caso é imprescindível.

Quando se trata de ser imigrante, de forma absolutamente desordenada, tudo está a nosso favor e ao mesmo tempo, tudo parece conspirar para que voltemos ao nosso país de origem com o rabo entre as pernas – eu sei por que sou um deles, e sinto sempre insegurança e medo. Sentir faz-me pensar: será que o morador de rua português não sente insegurança? Ou os usuários de drogas? Ou os moradores do subúrbio? Apesar dos índices, compreender a segurança ou a insegurança é um exercício de compaixão, que precisa todos os dias ser praticado.

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