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Crónica

Ventos de abril: Não há liberdade se não voarmos todos juntos

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Liberdade de sair sem restrições, de passear e ser passeado, de conviver com quem mais gostamos, de trabalhar para receber o salário que nos permitirá (ou não) consumir, ir para os centros comerciais, alienarmo-nos, comprar, deitar fora, comprar, deitar fora, comprar novamente…  Será esta liberdade que queremos? A rotina miserável de nos alhearmos da realidade, refugiarmo-nos nos pequenos prazeres efémeros. Fingirmos que está tudo bem, que tudo está garantido, que não há causas pelas quais lutar.

Seremos todos e todas assim tão livres quanto pensamos?

Poderá ser perigoso dizer que sim, sobretudo quando não respiramos os mesmos ventos de privilégio ou sentimos que muitas vezes quebram as frágeis asas de quem quer voar.

Num mundo composto por desigualdades e injustiças, poderemos sentirmo-nos livres quando pessoas como nós – independentemente da origem, raça, do género, das crenças, escolhas –, estão aprisionadas nas gaiolas da pobreza, discriminação, violência, opressão?

Se não vemos os invisibilizados é porque cegamos; se não ouvimos os silenciados é porque ensurdecemos. É momento de sentir e pensar mais e melhor. O que temos vindo a fazer ao nosso mundo? À nossa humanidade?

Se o contexto que estamos a viver parece estar a aprofundar mais o buraco de quem já vive na escuridão, é necessário repensarmos a forma como vivemos a nossa liberdade. É importante pensarmos uns nos outros e agirmos por todos e todas, por aquilo que nos é comum. Somos capazes de construir coletivamente, de criar e recriar, de dar as mãos, aproximar corações. Então porque não o fazemos mais vezes?

Ailton Krenak refere-se a uma espécie de construção coletiva de “ideias para adiar o fim do mundo”. A importância de pensarmos que tudo o que fazemos tem um impacto na realidade e no nosso mundo, está ligada à urgência de sermos mais humanos. Mais humanos no sentido de amarmos mais e odiarmos menos; alimentarmos mais os nossos laços comunitários; valorizarmos a nossa diversidade; colaborarmos; reconciliarmo-nos com a natureza.

Em momentos de ausências, ventos menos favoráveis sopram lá fora e há muitas liberdades ainda por conquistar. Por isso, é tempo de estender e libertar asas, unir forças e permitirmo-nos sonhar desenfreadamente. E não deixar ninguém para trás. Já dizia Simone de Beauvoir: “querer ser livre é também querer livres os outros”.

Apesar da constelação de atropelos, das dificuldade e adversidades, o que estamos a viver poderá ser uma oportunidade de mudança. É uma oportunidade de olharmos para fora e para dentro e nos reencontrarmos no meio de pedaços de nós, que temos vindo a dilacerar para termos a vida que temos, mas que, muitas vezes, não queremos…

Respiro de esperança! Campo fértil para as sonhadoras, idealistas, apaixonadas tristonhas. O anúncio de uma possível mudança sussurra-nos aos ouvidos, mas ainda é impercetível. É altura de pensarmos intimamente e vigiarmos os nossos sonhos mais preciosos. É altura em que os nossos corpos enclausurados pela distância deverão permitir que os nossos corações sintam mais, tecendo pensamentos e sonhos que voarão num suspiro de liberdade.

A beleza de existir e ser livre reside também neste desafio de nos permitirmos sonhar e transgredir. E na Primavera sonha-se melhor. Sonha-se com a liberdade de tornar a utopia realidade.

 

Ana Garcia

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