Crónica

Muda de Vida

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Do rude golpe que foi termos perdido Variações tão cedo, fomos salvos pelas mãos em que recaiu a sua herança. Falo dos Humanos e da sua louvável demanda. A de resgatar um pedaço de alma abandonado, perdido em cassetes e bobinas guardadas anos a fio numa caixa de sapatos. Uma voz capaz de transcender gerações. Variações libertou-se da sua prisão de cartão pela voz de Camané, David Fonseca e Manuela Azevedo, brilhando tanto como brilhou em vida.

Tudo na sua poesia é tremendamente simples. Chocantemente humano. Uma almofada de esperança para as incertezas que desgastam o mais comum dos mortais. “Muda de vida, se tu não vives satisfeito”. Um par ação-reação tão óbvio, mas para o qual parece sempre faltar a coragem. Queremos ter o pássaro na mão, a todo o custo. Os outros continuam a voar, indiferentes ao provérbio. Não vale a pena viver contrafeito, reféns de um castigo que impomos a nós próprios. O de esperarmos por algo que nunca vai chegar. Esperar que aquilo que não gostamos se torne apenas ruído branco que toleramos. Que aprendemos a não odiar.

E das fraquezas nem sempre fazemos forças por insistência em algo que nos prejudica. Grande parte das vezes, o que não mata não engorda. Enfraquece. Desgasta-nos. Retira-nos o instinto primordial de procurar a felicidade naquilo que mais gostamos de fazer. Tornamo-nos reféns dos sonhos perdidos. Com os sonhos corremos o risco de os esquecermos. Não se escondem num qualquer recanto da memória. Não são fáceis de trazer de volta, pelo menos sem desgosto. Os sonhos parecem ter o seu momento para serem realizados, antes de amargurarem para a eternidade. Ou até os vendermos a outros como redenção. Mas ainda há esperança.

“Estás sempre a tempo de mudar”. Muda. Sai de casa. Aprende a cozinhar. Começa a correr. Canta. Escreve. Salta. Ri-te. Conhece pessoas. Vive histórias que possas contar para não teres de viver fascinado pelas dos outros. Foge à repetição. “Quero é viver”. Não sabemos se o amanhã chegará. Mas, se chegar, terá de ser um prazer. Variações ressuscita o carpe diem. A urgência de tudo o que está para vir é aquilo que nos afasta de um dos nossos maiores erros. Romantizar o passado. Vivermos presos ao que não sabemos largar.

José Mário Branco descreveu bem esta inquietação. A contas com um passado de desentendimentos, mesmo que o rancor tenha sobrevivido ao fim dos tiros de canhão, as ruínas do campo de batalha já foram tomadas pelas flores. O resto do mundo já ignorou a relevância, se é que algum dia existiu, das disputas vividas. No seu íntimo, já não há lugar para essa sombra. Apenas para a inquietação. O nervosismo de não saber o que vai acontecer. Mas querer fazer parte disso. Fazer algo novo. E há sempre qualquer coisa para fazer. Qualquer coisa para resolver.

No futuro. Não sabemos bem o quê, ainda temos de construir a estrada. Ansiosos, mas sem pressa. Tudo para a vermos. Porque essa coisa é que é linda.

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