Artigo de Opinião

(Anti)filosofias da cosmética

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“Anti-envelhecimento”, “anti-idade”, “anti-rugas”… No sentido literal, falar em “anti-envelhecimento” é falar em “anti-vida”. De uma forma muito natural e quase inconsciente, imensas marcas de cosmética impregnaram este tipo de expressões no seu marketing. É claro que a intenção comunicacional nunca foi a de denegrir o fenómeno que é a vida, antes pelo contrário. O objetivo é proporcionar ao público produtos que atrasem os sinais notórios do processo natural do envelhecimento. O uso destes termos, muito criticado pelo seu caráter extremo e contranatura, tem vindo a diminuir ao longo dos anos. Não se verifica uma abolição completa, mas uma reformulação que se instala subtilmente no packaging dos produtos e que vem disfarçada para agradar as novas gerações: “slow age”, “age protect”, “pro age”… ou os famosos 3R’s: “rejuvenescimento”, “renovação” e “regeneração”. São apenas eufemismos que designam a mesma filosofia. Uma filosofia que se prende ao desejo da eterna juventude – o antigo e eterno sonho do ser humano. O uso das expressões justifica-se porque é aquilo que as pessoas procuram ao comprar produtos de beleza. A culpa não é do marketeer que se lembrou de colocar pela primeira vez a expressão “anti-envelhecimento” na embalagem de um creme de rosto. A culpa é de uma sociedade que está presa a ideais irrealistas, sendo incapaz de reformular conceitos de beleza erróneos à procura de um ideal utópico. O problema é muito maior do que uma simples reformulação de estratégias comunicacionais por parte das empresas de cosmética. O problema encontra-se na reformulação do pensamento comum (e (re)moldar mentalidades em assuntos que já estão demasiado infiltrados será, provavelmente, uma das lutas mais difíceis de vencer).

É triste pensar que evoluímos a alimentar esta ideia de que a velhice é algo que devemos amenizar ou combater. Num mundo que se rege pelas aparências, precisamos de estabelecer prioridades enquanto sociedade e perceber que a skincare nunca deve ser feita por uma busca desenfreada pela juventude, mas sim pela saúde da nossa pele. Não existe qualquer preconceito em cuidarmos da pele, tentando dar-lhe um aspeto mais saudável e que, acima de tudo, nos deixe confortáveis e confiantes. Por outro lado, se compramos um creme meramente com o intuito de não envelhecer, estamos a cair numa mentira que pode tornar todo o processo de envelhecimento muito mais doloroso e insuportável.

A um nível mais profundo, esta procura de produtos que atenuem os efeitos do envelhecimento está, possivelmente de forma inconsciente e involuntária, ligada ao medo de aproximação a uma última fase da vida. Mas a velhice encontra-se na mente, antes de qualquer ruga, mancha ou cabelo branco. As marcas do tempo vão aparecer incontestavelmente na nossa pele. Não há como fugir a isso e nunca deve ser algo ao qual queiramos fugir. São as nossas marcas. As que gritam sabedoria, crescimento e evolução. Não queiramos ser para sempre uma referência do passado. Vivemo-lo, e fará sempre parte de nós, mas as mudanças que vão surgindo só nos dão mais relevância. São a forja que nos refina o caráter e depura a índole, revelando seres de mil almas, abundantes e livres. Poder transmitir isso ao mundo terá sempre o seu inigualável valor.

 

Artigo da autoria de Inês Lopes

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