Artigo de Opinião
Citando os ingleses: obrigada pelo peixe
O britânico Douglas Adams tem uma célebre frase que se manteve na minha mente nas últimas semanas; “I love deadlines”, dizia o autor, “I love the whoosing sound they make as they go by”.
Não consigo concordar com o autor. Odeio tal barulho e a forma violenta com que ele rasga os meus ouvidos sem, ao menos, pedir passagem. Sou capricorniana, gosto das coisas organizadas, de planilhas, de antecedência. Ou, ao menos, é o que minha avó diz. Minha mãe fala que é minha tendência a desenvolver Transtorno Obsessivo Compulsivo. Meu psicólogo diz que é escapismo para lidar com a minha ansiedade. Meu psiquiatra só prescreve.
And here I am, my Darling, listening to this whoosing sound every single day.
Sempre gostei do britânico Adams. Seus livros marcaram a minha infância e moldaram o meu humor junto a Monty Python e Fernando Veríssimo. Sempre quis escrever como ele, jamais consegui. Deve faltar imperialismo no meu sangue, é isto. Ou, quem sabe, um berço de ouro.
Lembro que, ao ganhar meu primeiro volume de Guia dos Mochileiros da Galáxia, tive preconceito com a finura do livro. Rola, acreditava à época que a qualidade dos livros era medida pelo seu tamanho e idade. Um livro fino e recente não valia a minha atenção. Até ao momento em que eu já tinha acabado todos os livros possíveis de casa e tive que recorrer àquele volumezinho singelo.
Não sei porque estou falando tudo isso.
O ponto deste texto, o ponto, o ponto por assim dizer é que, bem…
Acabou.
Já não me encontro em Portugal, minha matrícula da Universidade do Porto está inativa e já tomei o avião para o Brasil. Razões pessoais, é claro. Saúde, família e dinheiro.
Já não ando mais nas ruas do Porto, já não pego o metro para São Bento. Já não passo pela Lello e questiono o tamanho daquela fila na porta de entrada, para quê isso? Já não posso mais comer pastéis de nata com tanta facilidade, tampouco arroz de pato. Não tenho mais tasquinhas perto de casa e não há mais Continente e Mini-Preço. Não pego mais comboio, nem tenho número de telemóvel. Minha conta universitária do banco continua lá, mas é só. Larguei toda a vida que eu construí nos últimos anos em um único voo com escala em Amsterdam, que foi cancelado e remarcado devido ao mal tempo.
E, além disso, não tenho conseguido escrever adequadamente. Whoosh. Whoosh. Minha cabeça não está mais sendo capaz de acompanhar as metas. Whoosh. Whoosh. Acho que foi por isso que eu voltei.
Assim, não sendo mais universitária do Porto.
E sem conseguir acompanhar o ritmo adequado ao jornal, não faz sentido eu continuar ocupando um espaço no Jornal Universitário do Porto.
Gostaria de poder continuar. E até poderia. Mas não devo. Não posso mais ocupar um lugar que não é meu. Não posso mais escrever com palavras que não são minhas.
Assim, faço das palavras dos golfinhos de Douglas Adams as minhas.
So long, and Thanks for All the Fish!
E, ao JUP, muito obrigada pela oportunidade, assim como cada momento que pude passar aqui.
Artigo da autoria de Débora Magalhães Binatti