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Opinião

A escola como espelho da inação do Governo português

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O nosso governo falhou, e tem falhado sem dó, à escola pública. Um local onde as novas gerações, o futuro do nosso mundo, depositam as suas esperanças e fado. Não é alcançada uma estabilidade para os docentes que há muitos anos lutam pela mudança, e não é estabelecida equidade nem equilíbrio aos alunos que se encontram num processo de formação e crescimento vital para o futuro. Será que podemos mudar o panorama, ou vamos andar sempre na rua a lutar pelo que deveria ser um dado adquirido na nossa atualidade?

Aliada às recentes manifestações dos professores pelas melhores condições da escola pública, a escola Secundária António Gedeão, localizada em Almada, fez-se ouvir, não só sobre a precariedade que ronda a profissão de docente, mas também sobre a falta de condições das estruturas escolares. Há mais de 38 anos que a escola Secundária António Gedeão confia o seu dia a dia em estruturas classificadas pelo governo como “provisórias”, onde o frio e o calor não encontram barreiras, a segurança dos alunos e profissionais se encontra em causa e espelha-se, evidentemente, a falta de interesse pela resolução do problema por parte do ministério da educação e do governo português. Se esta escola fosse uma exceção à regra, e um caso único, poderíamos eventualmente agradecer ao ministério pelo excelente trabalho que tem feito, mas não é esse o quadro apresentado. Olhamos no panorama nacional das últimas três décadas e vemos a verdadeira filosofia portuguesa do “deixar andar”, onde conhecemos diversos casos de escolas em estabelecimentos, cujo ditos, provisórios e precários, que transmitem a imagem degradante de uma sociedade que falha na mais básica das tarefas, e falha sobretudo às novas gerações, que são o núcleo da sociedade do futuro. A 14 de fevereiro de 2023, a Escola Secundária de Amares, distrito de Braga, apresentou uma situação semelhante à de Almada, onde “Desde a construção da escola em 1985, que o edifício não teve mais obras.”, como avança a SIC Noticias no seu website. O estabelecimento é afetado pelas condições climatéricas, nomeadamente como relatam os estudantes, à SIC, o ginásio fica inundado impossibilitando a realização das aulas a esse espaço destinadas. Ainda no distrito de Braga encontramos dezenas de escolas com o mesmo problema, situação avançada pelo Partido Socialista de Braga ao jornal RUM, onde vários estabelecimentos são mencionados com falta de condições, e onde há pedido em alguns casos, para serem inseridos no Plano de Recuperação e Resiliência (PRR). O mesmo se passa nos mais diversos locais do nosso território Nacional, como ainda na Secundária de Coruche (Santarém) e na escola Básica da Liberdade (Setúbal). Estes são reduzidos exemplos de um vasto universo que seria capaz de estender estas linhas por mais tempo.

Agora, o que resta são questões. Como é que estes estabelecimentos públicos chegam a estas condições? O que é que o governo faz perante estas situações? Serve o PRR algum benefício para estas escolas extremamente precárias e em situações de degredo? Vai o PRR ser aplicado de forma efetiva e ponderada, ou vai ser como o dinheiro mal distribuído para a recuperação das cheias?

Algumas destas questões quase já conseguimos responder. Em primeiro lugar, estes estabelecimentos só chegam a este ponto por pura negligência, que envolve tanto as autarquias locais como o ministério da educação e o governo. Essa negligência de certa forma é inexplicável, reduzindo-se a possíveis desentendimentos e falta de interesse por parte das entidades responsáveis. Em segundo lugar, teremos de esperar uma ação concreta por parte do governo, esse (ou esses melhor dito) que nos últimos 30/40 anos pouco ou nada fizeram sobre os assuntos que mereceriam mais atenção, mas talvez agora com a movimentação estudantil e dos professores seja finalmente ouvido este problema. Sobre a questão do PRR será já um pouco complexo. O PRR na teoria, é um excelente instrumento, que destinou uma verba de 217 milhões de euros para as escolas em 2023, mas a sua aplicação é duvidosa. Se bem relembro, no final do ano passado, 2022, havia 200 mil computadores, adquiridos com dinheiro do PRR, que não foram entregues a alunos por motivos diversos, como alguns estudantes que não necessitavam. Ora, mas não se pensam nas coisas? Como é que um governo pode investir tanto dinheiro sem pensar nas logísticas por detrás do mesmo… para não falar obviamente, que as preocupações de investimento monetário parecem passar sempre ao lado das verdadeiras necessidades. Talvez não fossem necessários 600 mil computadores (total adquirido pelo governo), mas sim eram precisas meia dúzia de obras de requalificação de escolas. Pelos vistos para o nosso governo a prioridade não é o bem-estar e segurança dos jovens cidadãos, mas sim a sua formação tecnológica (que evidentemente também será uma necessidade, mesmo que não uma prioridade).

A verdade é que os PRR chegam, o dinheiro circula, compram-se novos equipamentos para escolas, e evidentemente muitas coisas boas são postas em cima da mesa. Mas parece que se esquecem sempre dos verdadeiros problemas, e tentam encobrir com estas ações, no mínimo medíocres, o cerne da questão. Há que requalificar as escolas, construir e reconstruir, mas não colocar os alunos em contentores provisórios durante 30 anos (repito-me, não é construir estruturas provisórias). Há que investir no interior do país, nas zonas fora deste centralismo (Grande Lisboa e Porto) subjacente à nossa realidade atual. Há que conceder às escolas as ferramentas necessárias à formação digna dos alunos, sejam essas ferramentas instalações dignas, docentes bem capazes, psicólogos, funcionários… entre muitos outros. Mas, temos de estabelecer bem as prioridades, e essas são as mais básicas de todas, como o saneamento e estruturas capazes de proteger os alunos do clima, isto sim, é o mais básico, mas, ao mesmo tempo, parece ser o mais difícil de estabelecer. E assim o é, porque, como diversas coisas no nosso País, ninguém parece realmente pensar nas questões a fundo.

Como é que vai o governo assegurar o futuro destes alunos, se nem consegue assegurar a sua segurança e conforto enquanto estudantes? Resta aos alunos a reivindicação diária, e a pressão sobre os intitulados responsáveis, para a resolução destes problemas. A escola pública tem de mudar e o governo tem de fazer com que isso acontece, caso contrário falhou, e continuará a falhar ao futuro do país e aos que zelam pelo mesmo (professores e funcionários escolares).

De forma a não se falhar às novas gerações, o governo deve prestar cuidado na utilização das verbas, deve escutar as necessidades específicas dos diferentes locais nacionais, ouvir as escolas, os seus docentes, alunos e as autarquias, de forma a não generalizar as necessidades do país. Porque não é essa a realidade nacional, não existe equidade, nem irá existir caso não se pense individualmente nos problemas subjacentes à escola pública. De forma a não se manter o quadro precário e vergonhoso das últimas décadas, os nossos eleitos governantes devem aprender a escutar os seus cidadãos e devem conseguir tomar ações que transcendam uma tentativa de modernização rápida e “embelezamento” da imagem de um país, que no seu interior é inativo e despreocupado.

Artigo da autoria de Daniel Correia Madeira

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