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Opinião

Heartstopper: Um doce despertar para o autoconhecimento

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No mundo do streaming, a Netflix ficou reconhecida pelos seus catálogos ricos em diversidade cultural e integração artística, com séries e filmes para todos os gostos e estados de espírito. Essa integração expande-se até à comunidade LGBTQI+, com a qual a Netflix tem sido uma ativa aliada.

Heartstopper, a banda desenhada arco-íris premiada com o Goodreads Choice Awards de 2020, é uma doce, inocente e fiel adaptação às telas do streaming, da escritora e ilustradora britânica Alice Oseman. Nesta nova série da Netflix, ficamos a par do despertar e autoconhecimento da identidade sexual de jovens adultos, de uma forma saudável, real e muito doce.

Na trama, Charlie Spring e Nick Nelson alunos da Truham Grammar School for Boys, no 10º e 11º ano, apesar de nunca se terem conhecido vêm-se obrigados a integrar um grupo de trabalho para a realização de um projeto escolar. Com o decorrer dos dias a amizade entre ambos cresce, criando-se assim fortes alicerces do que viria a tornar-se algo para além de uma mera amizade. Tudo por uma casualidade do destino.

Nesta doce adaptação extremamente fidedigna aos livros, principalmente ao primeiro e segundo volume no que toca a diálogos e linha condutora, encontramos uma enorme sensibilidade na abordagem aos temas da sexualidade, do mundo queer e do autoconhecimento sexual jovem.

Foi notória a exclusão de algumas personagens da trama, como os pais de alguns personagens ou o Aled, que tem uma enorme representação nos livros, mas que, na verdade, não se encaixava na dinâmica do streaming.

A estética  convidativa e quase de anime com que a série nos presenteou não deixa de ser uma réplica adorável de se assistir ao que fora ilustrado nos livros de Oseman. O uso de elementos como a divisão da tela em formato banda desenhada, ou a passagem de flores, corações e faíscas quando surgem pensamentos ou sentimentos dos intervenientes da trama naquele momento, conseguem cativar o espectador da mesma forma como os livros o conseguiram fazer.

Fotografia: Netflix

Fotografia: Netflix

Euros Lyn, diretor de Heartstopper, teve também um cuidado muito especial na produção da série.

No making of da série relatou que quando se propôs a realizar a trama teve sempre em mente que esta teria de ser algo especial e diferente do que já tinha sido inventado sobre séries teen. Para tal, e para fazer justiça aos livros de Oseman, contratou uma equipa, desde atores até consultores e ativistas, todos da comunidade LGBTQI+. Só assim era possível realizar uma série que não fosse apenas mais um estereótipo do que era ser teen e LGBTQI+.

A atriz Yasmin Finney que faz de Elle, uma adolescente transsexual na série, é-o também na na vida real. Com isto, não está em causa as capacidade de atuação de Finney, mas sim dar papéis a quem tem um passado marcado pelo florescimento e que, aliado às excelentes capacidade de atuação, tornam a personagem mais autêntica e, por consequente, a série mais real e próxima de todas e todos os que se sintam representados.

Outro fator de entrega e autenticidade foi o facto de terem escolhido adolescentes e jovens adultos para atuar, e não adultos de 30 anos a fazerem-se passar por adolescentes de 18. O facto de trazer corpos normais e comuns com defeitos torna a série autêntica ao real da vida. O que ajuda, em prática, os jovens adultos a não se sentirem mal com a sua própria aparência e corpos idealizados que não representam a sua verdadeira idade.

Por sua vez, o papel dos adultos nesta série é algo inexistente. Apesar de termos a mãe do Nick, o pai do Charlie e o professor de arte, o Sr. Ajayi, ou a professora de ginástica, o papel dos adultos nesta série é para serem guias de suporte emocional. Em troca de respostas objetivas, as personagens recebem dos coadjuvantes sugestões de orientação e de ajuda para pensarem criticamente nos problemas, para encontrarem soluções plausíveis, racionais e com maturidade.

No fundo, Heartstopper não é uma série teen comum, mas sim uma série saudável que aborda temas do dia a dia, desde a homossexualidade, bissexualidade e transexualidade, até ao preconceito do amor entre duas adolescentes que se amam abertamente e até ao assédio sexual. A série consegue sair do velho estereótipo das típicas estórias de romance gay como Elite, Sex Education, Love Victor, Love Simon ou mesmo Euphoria, retirando assim, o triste e degradante fator da super sexualização que a maioria das séries teen pretendem passar ao retratar os adolescentes ou adolescentes queer e deixando cair a ideia primitiva de que viver uma vida queer é degradante, desprezível ou até mesmo depressiva.

Um outro facto muito interessante para com a produção desta série foi o pedido do diretor e da autora lyn e Oseman, para que todos os atores lessem os quatro volumes antes de entrarem nas personagem. Com esta pequena dica, possibilitou que a representação e entrega dos atores fosse maior e, por consequente, conseguissem transmitir a mesma energia que as personagens dos livros transmitem aos leitores.

No final das contas, o que realmente importa é o amor, seja ele de que forma for. Ele – o amor – funciona de maneiras surpreendentes e, por vezes, as coisas boas estão mesmo ao nosso lado. O otimismo queer, o acolhimento e a aceitação são necessários e urgentes, não só só nas plataformas de entretenimento, mas também na vida real.

O ódio nunca vencerá em prol do amor. E como já dizia Galileo Galilei, “de todos os ódios, nenhum supera o da ignorância contra o conhecimento”. Quem odeia o amor, apenas se odeia a si próprio e a felicidade dos outros. Heartstopper é assim uma série de esperança, de inocência, florescimento e bem estar interior.

Amor é amor, e o amor vencerá sempre!

Artigo da autoria de Diogo de Sousa