Crónica

CONTA-ME COMO É… SER REFUGIADO

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Inúmeros conflitos armados devastam o mundo. Nove guerras civis ocorrem em simultâneo em países islâmicos, onde os crimes mais hediondos tomam lugar. São diferentes etnias e grupos religiosos que lutam entre si, fações terroristas que espalham o terror. Armas químicas, torturas, execuções em massa estão entre os mecanismos utilizados pelos grupos militares para se infligirem contra a vida e contra os direitos humanos. Milhões de pessoas são forçadas a abandonar os seus lares para fugir da morte e destruição. No Verão de 2015, refugiados foi a palavra que se salientou em todos os cantos do planeta, uma palavra sinónima de insegurança, instabilidade, precariedade e incerteza.

Como explica Cláudia Pedrosa, jurista no Conselho Português para os Refugiados, “um refugiado não escolhe sair do seu país. Um refugiado sai porque não tem hipótese de ficar. Chega ao país de acolhimento, enfrenta a dificuldade de uma nova sociedade, nova língua, nova cultura. Não é fácil, porque para conseguir ser auto-sustentável tem de aprender a língua e, inicialmente, está sem a documentação necessária. Portanto, um refugiado durante a primeira fase do processo de asilo não pode trabalhar.”

Inúmeros refugiados residem agora nos países limítrofes dos Estados em guerra, sujeitos a precárias condições de vida. Alguns tentam sobreviver em campos lotados, vulneráveis à fome e às doenças, enquanto outros tentam a sua sorte na Europa. “A mim tocou-me pessoalmente o caso de uma paquistanesa que tinha quatro filhos e teve de escolher qual deles trazia. Trouxe dois e deixou dois que ficaram com o pai no Paquistão. Também uma mulher da Eritreia com seis filhos tem quatro na Eritreia e dois num campo de refugiados na Etiópia. Ela chegou sozinha, não conseguiu trazer nenhum”, conta Cláudia Pedrosa.

Em Portugal, o Conselho Português para os Refugiados assume um papel importante no acolhimento e acompanhamento destas pessoas que procuram segurança e estabilidade. “Da parte do departamento jurídico, ajudamos na fase de integração com ajuda de pedidos de reagrupamento familiar e, mais tarde, de pedidos de nacionalidade. Da parte do departamento social, temos os centros de acolhimento para as pessoas que não têm onde ficar. Durante a primeira fase que é a da possibilidade de asilo, têm direito a um apoio monetário nosso. Depois, já na fase de instrução, este apoio passa para a segurança social ou para a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa”, esclarece Cláudia. No sentido de os ajudar a ingressar no mercado de trabalho, “temos o ensino da língua portuguesa e o departamento de emprego que já na fase de instrução, quando têm autorização de residência provisória, os pode ajudar a encontrar trabalho.”

Perante este enorme flagelo, surgem opiniões contrárias relativamente ao auxílio que o país deve prestar a estas pessoas, algumas das quais se fundamentam na falta de apoio a grupos sociais que padecem de problemas económicos severos. Uma das questões recorrentes recaiu nos sem-abrigo. “Porquê acolher os refugiados se os nossos sem abrigo estão na rua? Algumas pessoas dizem que os nossos sem abrigo estão a viver às custas da segurança social. Eles é que deviam ir trabalhar. Portanto, há sempre algo a dizer contra e as pessoas nunca estão do mesmo lado”, assevera Cláudia Pedrosa, acrescentando que “nós não podemos diminuir um problema por causa do outro. Não podemos misturar os assuntos. Cada um tem as suas preocupações e cada um tem que ser enfrentado dadas as suas condições. Não é por ajudar uns que não vamos ajudar outros e estas pessoas precisam efetivamente de ajuda. Não saíram das suas casas por escolha própria.”

A jurista acredita que “a solução passa por um trabalho conjunto com as autarquias para acolher tanta gente, porque se não me engano nos números, mesmo que sejam todos estes refugiados, dá 1.2 por freguesia portuguesa. Não é nada. Portanto este acolhimento vai ter que passar pelas autarquias e esperemos que passe”, conclui.

 Fotografia: Will Wintercross/The Telegraph

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